Opinião

Mineradores devem estar devidamente preparados para evitar conflitos

Autores

  • Leandro Rennó

    é sócio e head da área de Arbitragem e Mediação do escritório Sion Advogados doutor em Direito pela Université de Versailles (França) mestre em Direito pela PUC-Minas e professor da PUC-Minas.

  • Luiza Guerra

    é advogada no escritório Sion Advogados com ênfase em Direito Minerário e Ambiental professora de Direito Minerário Direito Ambiental Urbanístico e Direito do Trabalho na Funcesi (Itabira-MG) mestranda em Direito Ambiental na Dom Helder Câmara e pós-graduada em Gestão Jurídica e Contencioso pelo IBMEC-BH.

31 de maio de 2020, 18h22

Faz parte da vida de qualquer empresário a gestão de conflitos. Isso não muda se o momento é de crise, de início do negócio, de grande sucesso ou enormes perdas. Saber lidar com sabedoria e tranquilidade com as inevitáveis e incontáveis disputas que surgem a todo momento em seu negócio é vital para qualquer setor da economia.

O setor minerário, por sua vez, tem enfrentado diversos desafios nos últimos anos. Em tempos de pandemia, a situação não melhorou. Com a paralisação total ou parcial das atividades, a gestão das relações internas e externas da empresa também passou a ser um fator de preocupação. Porém, apesar dessas situações excepcionais e impactantes, o dia a dia da atividade minerária envolve uma série de outros cenários, bem mais positivos e que precisam de gerenciamento cotidiano e ininterrupto.

As relações que se estabelecem no âmbito desse segmento da economia são inúmeras. De início, importante destacar que, por serem as jazidas e os recursos minerais de propriedade da União, qualquer pesquisa e exploração depende de prévia autorização da Agência Nacional de Mineração (ANM), recentemente instituída pela Lei nº 13.575/2017, em substituição ao Departamento Nacional de Produção Mineral (DNPM).

Indo além, cabe ressaltar que a atividade minerária é considerada de interesse nacional, tratando-se de um setor estratégico para a economia brasileira. Nesse sentido, a opção do legislador foi garantir o desenvolvimento da pesquisa e exploração mineral em terras nas quais se verifique o potencial minerário. Com isso, uma vez obtido o título minerário perante o órgão competente, o minerador possui não só o direito, mas também o dever de providenciar o início das atividades, estando, inclusive, sujeito a sanções caso não as inicie no prazo previsto no Código de Minas (Decreto-Lei nº 227/67).

Nessa etapa, já percebemos a possibilidade de surgimento de potenciais conflitos envolvendo o minerador e o poder ´público. Essa relação, que se inicia no momento em que é realizado o requerimento da autorização perante a ANM, perdurará durante todo o processo administrativo e, principalmente, ao longo da execução da atividade minerária. Portanto, pensar em mecanismos que preservem essa relação é fundamental. Saber negociar estrategicamente e, eventualmente, incluir a participação de um mediador, pode garantir a agilidade e a eficácia das soluções que precisarão ser encontradas, respeitando os princípios aos quais a Administração Pública está vinculada.

Porém, essa não a única relação que precisa ser bem cuidada. Como se sabe, nem sempre o titular do direito minerário é também proprietário da terra que abriga a poligonal do título. Não é demais lembrar que o direito de propriedade é assegurado pela Constituição Federal de 1988 (CF/88) pelo artigo 5º, XXII. Logo, ainda que possua o título minerário, o minerador não pode simplesmente adentrar terreno de terceiro sem que haja um acordo para tal. Por outro lado, com base nos aspectos já ressaltados anteriormente, por constituir atividade de interesse nacional, não poderá o proprietário da terra simplesmente impedir a realização da pesquisa e extração mineral. Percebe-se, mais uma vez, a importância da manutenção de um diálogo franco e aberto entre todos os envolvidos. Nesse caso, além das relações que o minerador irá estabelecer com o poder público, via ANM, essencialmente, caberá a ele também buscar manter uma boa comunicação com o proprietário da terra. Saber expor de forma clara seus interesses e, mais do que isso, compreender quais são os receios e os interesses da outra parte são elementos que devem fazer parte das negociações que serão realizadas nesse momento. Caso o minerador não obtenha a parceria do proprietário da terra e, principalmente, não saiba preservar de forma positiva essa relação, sua atividade poderá estar comprometida e o número de conflitos irá aumentar significativamente.

Aliás, a ausência de diálogo ou uma comunicação negativa feita na abordagem do minerador ao proprietário da terra dificultaria de imediato a execução das atividades. Afinal de contas, a previsão contida no Código de Minas é de que o titular do direito minerário deverá apresentar à ANM o acordo realizado com o proprietário da terra. Embora não possa impedir a realização da atividade minerária, o proprietário faz jus ao recebimento de renda e indenização pela ocupação de seu terreno, sem prejuízo da participação no resultado da lavra, essa última garantida pela CF/88. E mais. Se o proprietário não estiver alinhado com o minerador e, por essa razão, não concordar com a exploração minerária do seu terreno, os transtornos que o minerador irá enfrentar para dar início à sua atividade aumentarão.

De início, há que se considerar que nas hipóteses em que não for possível chegar a um consenso sobre o valor da renda e indenização, caberá a instauração do procedimento judicial previsto no artigo 27 do Decreto-Lei nº 227/67. Esse é um processo que demanda a realização de perícia e infindáveis discussões das partes envolvidas e que, portanto, representa um grande empecilho para que o titular possa, efetivamente, exercer seu direito minerário. Algo que pode ser evitado se houver uma negociação eficaz e, se necessário, utilizar a mediação como forma de estabelecer uma comunicação adequada entre o minerador e o proprietário da terra, garantindo que os interesses e as necessidades de cada um sejam de fato atendidos.

Superados esses procedimentos iniciais, a vida do minerador seguirá acompanhada de inúmeros conflitos potenciais. Além das relações como poder público e com o proprietário da terra, a atividade minerária impacta a vida de diversas outras pessoas e setores. A execução desse tipo de atividade afeta as comunidades e habitantes da região, gera impactos ambientais, políticos e econômicos. Desperta sentimentos controversos, medos, expectativas e uma série de outros elementos que ajudam a efervescer o caldeirão das disputas no ambiente minerário. Portanto, é fundamental que os mineradores estejam devidamente preparados para prevenir, antecipar, evitar e gerenciar esses conflitos desde o momento em que se identifica um novo terreno a ser explorado. E esse cuidado deverá ser mantido ao longo de toda a execução da atividade minerária e até mesmo após a sua conclusão. Saber dialogar com os diversos atores que irão ou poderão se envolver ao longo de todo esse longo processo é fundamental.

 

Referências bibliográficas

ATAÍDE, Pedro. Direito minerário. Salvador. Editora JusPodivm. 2017.

BRASIL. Código de Minas. Decreto – Lei nº 227 de 1967. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Decreto-Lei/Del0227.htm. Acesso em: 9 de setembro de 2019.

BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Disponível em http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicaocompilado.htm. Acesso em 22 de agosto de 2019.

HERMANN, Hidelbrando; POVEDA, Eliane Pereira Rodrigues; SILVA, Marcus Vinicius Lopes da. Código de Mineração de A a Z. Campinas, SP. Millenium, 2009.

SERRA, Silvia Helena; ESTEVES, Cristina Campos. Mineração: doutrina, jurisprudência, legislação e regulação setorial. São Paulo. Ed. Saraiva. 2012.

TEPENDINO, Gustavo. SCHREIBER, Anderson. A garantia da propriedade no direito brasileiro. Revista da Faculdade de Direito de Campos. Ano VI. Nº 6. Junho de 2005. Disponível em: http://fdc.br/Arquivos/Mestrado/Revistas/Revista06/Docente/04.pdf. Acesso em: 10 de setembro de 2019.

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    é sócio e head da área de Arbitragem e Mediação do escritório Sion Advogados, doutor em Direito pela Université de Versailles (França), mestre em Direito pela PUC-Minas e professor da PUC-Minas.

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    é advogada no escritório Sion Advogados com ênfase em Direito Minerário e Ambiental, professora de Direito Minerário, Direito Ambiental, Urbanístico e Direito do Trabalho na Funcesi (Itabira-MG), mestranda em Direito Ambiental na Dom Helder Câmara e pós-graduada em Gestão Jurídica e Contencioso pelo IBMEC-BH.

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