Decisão controversa

Fundo de Investimento Imobiliário Península perde causa de R$ 70 milhões no Carf

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27 de maio de 2020, 21h19

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Decisão do Carf foi criticada por tributaristas ouvidos pela ConJur
Reprodução / CARF

Se o quotista com mais de 25% das quotas de um Fundo de Investimento Imobiliário e o sócio do empreendimento imobiliário em que o fundo investe são empresas sob controle comum, ainda que indireto, por meio da interposição de outras pessoas jurídicas, tem-se por configurada a cumulação destas posições jurídicas, incidindo a regra prevista no art. 2º da Lei 9.779/99, o que sujeita o fundo à tributação própria das pessoas jurídicas.

Com base nesse entendimento, o Conselho Administrativo de Recursos Fiscais negou recurso do Fundo de Investimento Imobiliário Península e decidiu que o empreendimento está sujeito à tributação geral ordinária das pessoas jurídicas, o que resultou em uma dívida de mais de R$ 70 milhões.

A maioria  do colegiado acatou o voto do relator, conselheiro Carlos Pantarolli, que considerou correta uma autuação ao entender que a operação estava sob o controle do Grupo Diniz por meio da interposição das empresas RECO Participações, de propriedade de Abílio Diniz, e da CBD, com participação relevante do empresário.

O conselheiro Leonardo Branco abriu divergência e foi acompanhado por outros dois conselheiros, por entender ser necessário haver a condição de incorporador, construtor ou sócio no empreendimento imobiliário para a aplicação da regra.

Em seu voto, Branco aponta que não haveria sequer a condição de quotista detentor de mais de 25% das quotas do fundo, uma vez que a única quotista no período analisado teria sido a empresa RECO Participações, tendo Abílio Diniz perdido seu controle societário em acordo de acionistas fechado em 2005, o que o impedia de votar sobre qualquer assunto relacionado aos imóveis.

Contra o argumento de que as empresas CBD e RECO integrariam o mesmo grupo econômico, o conselheiro apontou que a empresa RECO, controladora do Fundo, faz parte do Grupo Diniz, enquanto a CBD faz parte do Grupo Pão de Açúcar, que foi vendida ao Grupo Casino em 2005.

O caso — cujo acórdão foi publicado no último dia 18 de maio — é tratado como atípico na opinião de especialistas consultados pela ConJur. Para o tributarista Bruno Aguiar, esse tipo de decisão prejudica o mercado. "Os fundos imobiliários são estruturas que visam fomentar o mercado imobiliário. Não se ignora que grandes players participam desse setor. Só que uma vez que a Receita Federal extrapola uma interpretação da legislação para chegar a raciocínios sem base legal, acaba afastando investimentos do setor", explica.

Aguiar aponta que o caso torna a questão fiscal extremamente sensível e traz insegurança. "O investidor que se atentar à questão e vir uma decisão em que a estrutura tributária que a própria lei autoriza é glosada pela Receita irá pensar duas vezes. Sabemos que existem excessos, mas não é o caso concreto julgado pelo Carf. Estamos vivendo um período de caça às bruxas no Ministério da Economia e no Carf.  A advocacia tem que estar atenta", comenta.

Quem também discorda da sentença é o especialista em Direito Tributário Breno Dias de Paula. “O Código Tributário Nacional não confere ampla elasticidade ao artigo 124 do Código Tributário Nacional para ampliar os casos de solidariedade. No caso, é visível a inexistência de sujeição passiva solidária, pois a mesma só pode ocorrer entre contribuintes que possuem o ‘interesse comum’ do artigo 124, inciso I do CTN; e no caso não existe norma legal que estabeleça a responsabilidade solidária do administrador do fundo, pois o art. 4° da Lei n° 9.779/99 designa o administrador apenas como responsável por cumprir as obrigações tributárias do fundo no que toca aos atos e providências materiais em razão do mesmo não possuir personalidade jurídica, afastando-se igualmente o art. 124, inciso II do CTN. Vale lembrar que o CTN é lei complementar que regulamenta o artigo 146 da Constituição Federal e não pode ser suprimido por lei ordinária”,  comenta.

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