Balcão único

STF analisa inidoneidade de empresas declarada após acordo de leniência

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26 de maio de 2020, 20h16

A 2ª Turma do Supremo Tribunal Federal começou a julgar, nesta terça-feira (26/5), quatro mandados de segurança que discutem a possibilidade de o Tribunal de Contas da União declarar a inidoneidade de empresas que já tenham firmado acordos de leniência com outras instituições. Os processos tratam das construtoras que participaram de licitação para as obras da usina nuclear Angra 3. 

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ReproduçãoQuatros construtoras que participaram das obras da usina de Angra 3 impetraram mandados de segurança

A Andrade Gutierrez e a UTC alegam que a sanção de inidoneidade pelo TCU impede o cumprimento dos acordos de leniência, que previam a não punição pelo tribunal. Elas firmaram acordos com a Advocacia-Geral da União, Controladoria-Geral da União e Ministério Público Federal. 

No caso da Queiroz Galvão, a empresa fechou acordo com o Cade e sustenta que começou a colaborar com o próprio TCU, mas o tribunal reviu a medida e aplicou sanção definitiva. Já a Artec argumenta que a decisão do TCU que a condenou teve base única em interceptação telefônica, que já foi declarada ilícita pelo próprio Supremo.

Na sessão desta terça, apresentaram seus votos o relator, ministro Gilmar Mendes, e Luiz Edson Fachin. A votação foi suspensa e deve ser retomada na próxima semana.

Gilmar Mendes concedeu a segurança em todos os casos para suspender a declaração de inidoneidade das empresas. O ministro afirmou que "a atuação do TCU deve prestigiar acordos do MPF", em respeito à unidade estatal. A interferência do tribunal de contas, disse, pode inviabilizar a celebração de outros acordos no futuro.

Em extenso voto, o ministro apresentou estudos recentes sobre a coexistência de regimes de leniência e abordou os problemas de assimetria na definição dos requisitos para firmar esse tipo de acordo em cada uma das esferas administrativas. 

De acordo com Gilmar Mendes, é necessário fazer uma interpretação conjunta de modo a zelar pelo alinhamento institucional nos acordos e garantir aos colaboradores a previsibilidade das sanções e benefícios premiais. 

"A concretização desses objetivos, alinhamento institucional e preservação da segurança jurídica, demanda contínuo esforço de diálogo entre os órgãos e entidades imbuídos do combate a atos de macrocriminalidade econômica", afirmou.

Além disso, segundo o ministro, a declaração de que uma empresa é inidônea representa uma "verdadeira pena de morte", já que as empresas ficam impossibilitadas de reparar o dano ao erário.

Divergência parcial
Fachin, por sua vez, acompanhou o relator apenas na concessão da segurança para a Andrade Gutierrez. Nos outros três mandados, o ministro não verificou boa-fé das construtoras ou confiança legítima na celebração dos acordos.

"O TCU não pode obstar o cumprimento do pacto das partes, que levaram em consideração a efetividade das informações prestadas para deflagração de investigações criminais e cíveis, bem como em atenção à tutela da confiança legítima daquele que agiu de boa-fé ao confessar a participação de ilícitos", afirmou sobre o caso da Gutierrez.

No caso da UTC, o ministro considerou que o ajuste da empresa com a CGU aconteceu depois da decretação da inidoneidade pelo TCU. Para Fachin, tal fato "é relevante para manutenção da sanção".

De acordo com o ministro, fica "inviável a aferição da boa-fé e da confiança legítima daquela que aguardou o final dos procedimentos investigatórios pela Corte de Contas para, só então, pretender enquadrar-se na condição de colaboradora, para os fins da Lei 12.846/2013". 

No voto seguinte, no mandado da Queiroz Galvão, Fachin também entendeu pela inviabilidade da empresa "socorrer-se da via judicial para compelir o Tribunal de Contas da União a firmar um acordo de leniência com a empresa interessada".

Por fim, o ministro discordou da alegação da Artec de que apenas as provas declaradas nulas é que ampararam as conclusões do TCU no processo que culminou com a declaração de inidoneidade.

Previsão dos acordos
Tais questões estiveram em pauta em evento organizado pela ConJur em 2019, no qual especialistas defenderam a regulamentação do acordo de leniência e a preservação de empresas. A principal matéria em voga é a criação de um balcão único de negociação para evitar justamente a dupla sanção e ainda garantir previsibilidade aos acordos.

Havia a expectativa de que no primeiro semestre deste ano fosse lançada uma cartilha que unificasse os procedimentos referentes aos acordos de leniência. A competência para a homologação de tais acordos ficaria a cargo do Superior Tribunal de Justiça.

A iniciativa partiu do presidente do STF, ministro Dias Toffoli, que reuniu o então AGU, André Mendonça, e membros da CGU, TCU, STJ, MPF e Ministério da Infraestrutura. 

Clique aqui para ler o voto do ministro Gilmar Mendes
MS 35.435, 36.173, 36.496 e 36.526

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