Saída de emergência

Para especialistas, federalismo mostra que descentralização é melhor caminho na crise

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18 de maio de 2020, 17h33

Não há monopólio do combate à crise sanitária e econômica decorrente do coronavírus. Para especialistas ouvidos pela TV ConJur, o federalismo cooperativo colocado em prática pela Constituição Federal de 1988 e testado durante a epidemia traz uma indicação clara: a descentralização é o melhor caminho.

ConJur
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A discussão ocorreu no seminário virtual “Saída de Emergência”, realizado nesta segunda-feira (18/5), e que teve como tema “Federalismo cooperativo no combate à calamidade”. O programa foi mediado pelo conselheiro do CNMP e professor da USP Otavio Luiz Rodrigues Jr.

Ministro do Supremo Tribunal Federal, Alexandre de Moraes explicou que o federalismo cooperativo implica em limitação e divisão de poderes, e que a corte constitucional vem, nos últimos anos, promovendo um alargamento da competência concorrente conforme desejado pelo constituinte de 1988.

"Não há possibilidades de, com o tamanho do Brasil, [o país] sobreviver do ponto de vista administrativo, legislativo, social e econômico, com extrema centralização. A pandemia e a crise vivida demonstram isso. Ninguém tem o monopólio do combate à pandemia", afirmou o ministro.

Destacou, ainda, o princípio da predominância do interesse. O que é de interesse local, o município gere. Se for regional, o estado. O que transborda cria a necessidade de uma coordenação nacional, e aí entra a União. "Parece que o Brasil vem acordando já há algum tempo, mas essa pandemia fez com que houvesse um alerta maior, para a necessidade de descentralização", apontou.

Para o ministro do Supremo, isso não significa prejuízo às competências da União, que permanece como grande  liderança nacional. "Para a população, o exercício da liderança é esperança. Precisamos de liderança para juntar as questões diversas e marchar juntos para diminuir os efeitos da pandemia", explicou.

Dificuldades e crise política
Professor assistente da Universidade de Frankfurt, Ricardo Campos identificou que o aprimoramento desse federalismo cooperativo vem sendo feito pelo Brasil da mesma forma como ocorreu com a Alemanha no pós-guerra. Nesse contexto, refere-se ao papel do Supremo Tribunal Federal como o de dar "os primeiros empurrões na esfera pública e legislativa" para levar para frente esse modelo.

A crise, explica, é um ponto de inflexão para a questão federalista no mundo todo. Na União Europeia, principalmente, onde ela foi aguda. "A pandemia foi um teste importante e que vai ser decisivo sobre qual caminho a União Europeia vai trilhar, principalmente quanto ao fracasso da coordenação coletiva no plano europeu. Mais importante acabou sendo o estado nacional e o modelo federativo. Em alguns funcionou. Em outros, não", disse.

Reitora da da Instituição Toledo de Ensino, de Bauru (SP), Claudia Queda ressaltou que a ideia do federalismo cooperativo é de aumentar a eficiência e a superação de dificuldades em prol do bem comum. Essa coordenação deveria ser harmônica, mas há um fator que impede seu melhor aproveitamento: a crise política.

"Fato é que esse modelo, em si, traz uma cláusula forte, mas prática de devolução decisória em prol do interesse comum sofre fraturas muito contundentes e que comprometem o alcance da diminuição das dificuldades regionais. Não é um modelo clássico. É cooperativo, mas que vem padecendo de equilíbrio em razão das chamadas crises políticas", disse.

Questão da gestão
Para o procurador público de São Paulo e diretor da Faculdade de Direito do Mackenzie, Gianpaolo Smanio, um aspecto do federalismo cooperativo que merece ser destacado é a questão da gestão. 

Citou o exemplo da saúde e a experiência que teve, quando foi procurador-geral de Justiça de São Paulo, quando montou o programa Acessa SUS para congregar Ministério Público, Judiciário e defensorias, em gestão compartilhada — mas respeitadas as competências — da judicialização da matéria. O resultado foi queda resolução mais rápida e eficiente de conflitos, sem necessidade de levar para análise dos juízes.

"Se levarmos isso para o país, podemos criar os mesmos mecanismos de cooperação e participação e, portanto, resolver as questões que muitas vezes ficam insolúveis ou de extrema dificuldade de forma muito mais rápida e eficiente, evitando o excesso de judicialização. Fica muito mais fácil jogar nas costas do Judiciário a solução de todas as questões. E aí também é mais fácil criticar o Judiciário", opinou.

Assista abaixo ao seminário:

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