Opinião

Por que a Lei de Fauna aprovada no Espírito Santo é tão importante

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11 de maio de 2020, 14h01

O presente debate traz a reflexão do ponto de vista ambiental sobre o perigo do ingresso de espécimes invasoras de animais silvestres no estado do Espírito Santo, que pode vir a ser exemplo para os demais entes federativos.

No âmbito nacional, a Lei nº 5.197/67, em seu artigo 4º, cuidou da proibição de espécimes introduzidas no país sem o devido parecer técnico oficial favorável, além da necessária licença expedida na forma da lei pelas autoridades competentes. Significa dizer que um cidadão ao ingressar no país portando um animal diverso dos aqui já conhecidos, mesmo que o ser vivo possa aparentar certa inofensividade, terá de submeter o animal ao crivo das autoridades portuárias ou aeroportuárias responsáveis pela análise de risco do ingresso daquele ser vivo no país.

Embora seja louvável o intuito do legislador nacional, restavam lacunas normativas a serem preenchidas, demandando do poder público explicações e orientações mais precisas sobre as espécies invasoras.

Depois tramitar por alguns anos no Instituto Estadual do Meio Ambiente e Recursos Hídricos (Iema), autarquia ambiental capixaba, e na Secretaria Estadual do Meio Ambiente (Seama), sendo submetido de igual modo à apreciação de outros órgãos envolvidos na contribuição da construção da norma, saiu do forno um projeto de lei complementar que instituiu a Política Estadual de Proteção à Fauna Silvestre no Estado do Espírito Santo. Logo, a Lei Complementar nº 936, publicada em dezembro de 2019, em minúcias, aborda o tema com merecido zelo e controle na tratativa do ingresso de espécimes que não são nativas do estado e tampouco do país. Em outras palavras, a norma capixaba visa a estancar a entrada de seres contaminados, portadores de doenças desconhecidas e, sobretudo, invasores disseminadores de doenças capazes de contaminar outros seres vivos que habitam no estado, provocando danos sanitários e econômicos.

A lei capixaba trouxe expressividade no tema entorno da saúde pública, particularmente no que trata do constante risco do ingresso de espécimes invasoras no Estado. Como informado, a norma em apreço serve de exemplo para os demais entes federativos, mormente àqueles que possuem portos e aeroportos destinados a importação e exportação, cujo ingresso de animais se torna mais propício e facilitador.

Pois entre outros tópicos relevantes ao meio ambiente, em tempos de Covid-19, destaco um que chama atenção, que é o dispositivo previsto no artigo 2º, inciso V, da Lei Complementar nº 936/2019, cuja redação esclarece o que é fauna exótica invasora: "Espécie introduzida a um ecossistema do qual não faz parte originalmente, mas onde se adapta e passa a exercer dominância, prejudicando processos naturais e espécies nativas, podendo causar prejuízos de ordem econômica e social".

Numa rápida leitura, percebemos que o portador de animal silvestre, mesmo sem saber a origem da espécie, acreditando ser um animal doméstico e comum em outros países, é obrigado a submeter o ser vivo ao filtro das autoridades ambientais competentes, sob pena de incorrer em pena de elevada multa (artigo 20 da LC nº 963/2019). Observe que a mera omissão do portador do animal é suficiente para aplicação da penalidade pelas autoridades públicas.

O cuidado para barrar o ingresso de animais exóticos é uma preocupação cada vez mais latente nos dias hoje, principalmente quando fontes extraídas da Organização Nacional da Saúde (OMS) imputam o surgimento da Covid-19 ao consumo humano de animais portadores de doenças desconhecidas.

À guisa de exemplo, importa recordar o ingresso do peixe bagre-africano (Clarias Gariepinus[1] no Brasil. Em meados da década de 80, o peixe foi inicialmente introduzido na aquacultura, com objetivos econômicos. Mas, quando os especialistas perceberam o completo descontrole da espécie predadora natural e, o que é pior, de elevada resistência em ambientes diversos e inóspitos, já era tarde. Descobriu-se um animal de poucos predadores naturais e com possibilidade de adaptação em diversos biomas. O bagre-africano é capaz de sobreviver em condições precárias, águas sujas, alimentando-se de outros peixes, pequenos pássaros, anfíbios, répteis, caranguejos e plantas, sendo um ser resistente que, com suas fortes nadadeiras, é capaz de atravessar sítios e córregos de um canto para outro, procurando alimentos e melhores condições de reprodução. Vale dizer, é um animal devastador, causador de dano, e ninguém imaginava, na década de 80, o tamanho do estrago que o peixe poderia fazer.

Nesse cenário, a norma estadual capixaba inova ao trazer um mecanismo de segurança ao estado, permitindo que as autoridades ambientais competentes controlem o ingresso de espécimes invasoras, prevenindo dessa forma, a disseminação e possível transmissão de doenças até então desconhecidas, como era a Covid-19.

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