Saída de emergência

Crise é oportunidade para equacionar tributação e federalismo no Brasil

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8 de maio de 2020, 17h55

Se o mundo vai sair diferente da pandemia do coronavírus, então a crise é uma excelente oportunidade para equacionar o sistema tributário e sua relação com o federalismo no Brasil, baseando-se no Direito Financeiro. É a opinião dos especialistas que participaram, nesta sexta-feira (8/5), de debate promovido pela TV ConJur.

ConJur
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O seminário virtual Saída de Emergência teve como tema Tributação e federalismo em tempos de crise e foi mediado por Otavio Rodrigues, do CNMP (Conselho Nacional do Ministério Público) e da USP.

Ministro do Superior Tribunal de Justiça, Reynaldo Soares da Fonseca analisou como compatibilizar os limites do Estado na tributação sofre a esfera dos cidadãos no momento de crise, e sugeriu a adoção da perspectiva de tributação a serviço da humanidade. Ou seja, a necessidade de olhar ético por parte dos formuladores da política fiscal e das normas jurídicas. Principalmente diante da necessária reforma tributária.

"Não vamos resolver esse problema apenas com a reforma tributária. Ela vai ser uma gota no oceano. Estamos falando de gastos, de transferência de crédito, de devolução, de contas. Isso faz com que a gente reflita efetivamente que a contribuição do Direito Financeiro vai ser extraordinária na saída da crise. Precisamos de controles", opinou o ministro.

Esse viés foi também ressaltado pelo professor Heleno Taveira Torres, da USP, que vê na crise uma oportunidade para uma reforma tributária "saudável e eficaz". Ele clama construir proposta que leve a simplificação e segurança jurídica, especialmente quanto à trava de créditos de tributos, além de acabar com a figura do insumo, discutido juridicamente em precedentes judiciais e, depois, na interpretação desses próprios precedentes.

"As medidas tributárias no mundo são todas as mesmas: prorrogação de prazo e esses burocracias de emergência. Não estamos a ver as leis tributárias para recuperação da crise. Essas ainda virão, mas temos que começar a fazer esse exercício", disse. Ele foi outro a destacar a importância do Direito Financeiro: "é aquele que tem a visão do conjunto e que realiza a Constituição". "Os direitos são todos gastos públicos."

"A reforma tributária dentro da crise é uma forma de continuidade para a recuperação das empresas e das gerações futuras", destacou Luciana Mattar Vilela Nemer, conselheira fiscal da OAB. "A gente deve instituir mecanismos voltados para a operabilidade do sistema. E tem que ser feito agora, porque o momento chama mais a atenção para a visão técnica para benefício comum da sociedade, com foco na segurança jurídica", opinou.

Federalismo
Recuperado da Covid-19, o tributarista Ives Gandra Martins destacou que essa discussão passa também pelo redimensionamento do federalismo brasileiro e na existência do que classifica como "falsas entidades federativas que não são sustentadas pela própria população, mas pela transferência de percentuais não razoáveis, mas excessivos". 

O resultado ele vem afirmando desde 1991, no alvorecer da recente democracia brasileira: a federação não cabe no PIB. O custo do poder público se tornou, por falta de simplificação, excessivamente pesado. Por isso, defende que haja um sacrifício da sociedade brasileira para pensar em reforma tributária, mas que ela parta da necessidade de corte de gastos e passe por uma necessária simplificação. 

"Se não conseguirmos reduzir o custo da federação brasileira fazendo com que, ante à pandemia, não se toquem em todos os privilégios que existem em todas as entidades federativas; e se acharmos que o custo vai ser suportado por uma sociedade exaurida, transformando os detentores do poder em senhores feudais e os que sofrem com isso como escravos do século 21, evidentemente não sairemos de crise. Estamos no mundo inteiro na busca de outras soluções", disse.

Segundo o advogado Luiz Gustavo Bichara, conselheiro federal da OAB, a longo prazo não há como escapar da reforma tributária, então é melhor encará-la de frente. Inclusive diante de um sistema federativo que, aponta, não se sustenta, já que a maior parte dos municípios vive de repasse de verbas.

"Sei que boa parte da doutrina é contrária à proposta hoje apresentada [de reforma tributária] por alegada violação ao federalismo. Confesso que não vejo essa violação porque federalismo é evitar que prefeitos e governadores fiquem com pires no bolso. Se o IBS [Imposto sobre Bens e Serviços] vai trazer o benefício de garantir arrecadação, então federalismo é dinheiro no bolso, com governadores e prefeitos fazendo política pública e garantindo arrecadação. Se reforma garante arrecadação, é uma boa ideia e deve prosseguir", explicou.

Assista abaixo ao seminário:

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