Pandemia processual

Resolução do CNJ sobre prazos cria mais dúvidas do que soluções, diz advocacia

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7 de maio de 2020, 18h07

A Ordem dos Advogados do Brasil vai precisar entrar com embargos de declaração contra a Resolução 318 publicada nesta quinta-feira (7/5) pelo Conselho Nacional de Justiça. Ao tentar regular a questão dos prazos processuais entre processos físicos e virtuais e diante da possibilidade de lockdown, a norma mais confunde do que resolve.

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Resolução do CNJ criou dúvidas quanto aos prazos, segundo advocacia
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É o que o conselheiro federal da OAB, Ary Raghiant, definiu como "pandemia processual" durante seminário virtual realizado nesta quinta-feira pela TV ConJur. "Quando isso se afunilar e processos chegarem, a contagem de prazo vai ser problema clássico e vamos ter que ir no superior e fazer juntadas de certidões ou de informações particularizadas", apontou.

Em suma, a resolução confirma que os prazos processuais para processos virtuais foram retomados na segunda (4/5), mas os físicos continuam suspensos. Em estados com decretos de lockdown, todos os prazos podem ser suspensos. Isso também pode ocorrer em locais em que a situação esteja tão complicada que impossibilite trabalho forense regular. Neste caso, o Tribunal de Justiça deve fundamentar o pedido ao CNJ.

Ary Raghiant cita como exemplo o estado do Pará, onde dez cidades estão sob lockdown. "Nas dez está suspenso prazo e nas demais não?", indaga. Questiona, também, como fica a situação em relação à Justiça Federal. Se em São Paulo a situação evoluir para um lockdown e os prazos forem suspensos, como fica a situação do Mato Grosso, estado também abrangido pelo TRF-3?

"Veja que temos mais dúvidas do que soluções. A Resolução 318, de certa forma, não deixa claro inclusive o que é unidade da federação. Temos decretos feitos por municípios. Precisamos ver se ela contempla também. As pessoas vivem nas cidades, não no estado ou União. Vamos ter que fazer embargos de declaração e ver como resolver esses problemas", afirmou.

Controvérsia
Quase ao mesmo tempo em que a Resolução 318 era divulgada, o Centro de Estudos das Sociedades de Advogados (Cesa) protocolava um ofício pedindo ao CNJ a suspensão dos prazos processuais em todo o país até o dia 31 de maio, com posterior reavaliação sobre a possibilidade de estender ainda mais a medida.

O Cesa pedia que o CNJ levasse em consideração o fato de que, em sua maioria, os advogados dependem do contato direto com pessoas que "obrigatoriamente têm que atender o distanciamento social" e de informações ou documentos que estão em poder de terceiros (empresas ou órgãos públicos) que estão, muitos deles, com as atividades suspensas, o que torna impossível o cumprimento dos prazos.

São queixas parecidas com as que já tinham sido levantadas pela ConJur em relação à retomada dos prazos na segunda-feira (4/5). O presidente da seccional de São Paulo da OAB, Caio Augusto Silva dos Santos, por exemplo, destacou que poderia haver dificuldade de cumprir os prazos quando fosse necessário cumprir diligências que não poderão ser feitas devido ao isolamento social. Por exemplo, quando uma empresa precisar ter acesso a documentos que estão em sua sede para se defender devidamente.

Já o presidente da Associação dos Advogados de São Paulo, Renato José Cury, declarou que a retomada dos prazos funciona para escritórios com estrutura, mas não para advogados que dependem de entidades para exercer a profissão.

A queixa foi ecoada no ofício do Cesa, que também pedia que o CNJ levasse em consideração o fato de que "parte da advocacia depende do acesso a computadores ou a rede de internet de terceiros (salas dos advogados nos fóruns, sedes das OABs etc), o que representaria uma circulação maior de pessoas nesse momento em que se recomenda o isolamento social".

Continuidade
Por sua vez, o conselheiro e presidente do gabinete de crise do CNJ Henrique Ávila explicou, em artigo publicado pela ConJur, que as resoluções do CNJ foram sendo editadas conforme as necessidades impostas pelo combate à epidemia.

Se a suspensão dos prazos processuais era inevitável num primeiro momento, a sua continuidade acabaria levando a um crescente represamento de ações e recursos nos tribunais. O CNJ também levou em conta que advogados, juízes e servidores também já estavam melhor adaptados ao trabalho remoto e às limitações impostas pela epidemia da Covid-19.

Assim como na suspensão dos prazos e sua posterior retomada, as resoluções do CNJ levam em consideração as alterações no cenário nacional e as especificidades das demandas judiciais, escreve Ávila.

"Essa é a hora de, mais do que nunca, todos os atores processuais atuarem na mais estrita cooperação e compreensão mútua, com empatia e solidariedade, entre juízes, advogados, membros do MP, defensores públicos, e todos os integrantes do sistema de Justiça, para que possamos superar juntos esse período de impensável anormalidade em que vivemos."

Clique aqui para ler a resolução do CNJ

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