Reportagem sobre crime

Direito ao esquecimento não pode embasar censura prévia, diz STJ

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4 de maio de 2020, 14h49

Embora cabível segundo a jurisprudência brasileira e apto a reparar violações, o direito ao esquecimento não pode embasar proibição de futura publicação, sob pena de censura prévia. Com esse entendimento, a 3ª Turma do Superior Tribunal de Justiça negou o pedido de grupo de pessoas que visavam proibir editora de publicar reportagens sobre crime nacionalmente conhecido.

José Alberto/STJ
Ministro Villas Bôas Cueva manteve valor da condenação por danos morais 
José Alberto/STJ

A decisão foi unânime, em julgamento encerrado na terça-feira (28/4), com voto vista durante sessão realizada por videoconferência. Trata-se de reportagem da revista IstoÉ publicada em outubro de 2012 sobre como viviam pessoas condenadas por crimes nacionalmente conhecidos. 

A reportagem informou dados da rotina de uma das autoras da ação, que foi condenada e cumpriu pena por um dos crimes, além de informações sobre outros envolvidos. Segundo os autos, o texto dificulta a reintegração da mulher, por provocar sensações de pretensa impunidade e por explorar o sentimento de vingança coletiva e comoção midiática.

Na análise do relator, ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, a postura fere o princípio da proibição de penas perpétuas, o direito à reabilitação e o direito de retorno ao convívio social por egressos do sistema penal, o que gera o dever de indenizar. Mas não é suficiente para aplicar o direito ao esquecimento e proibir o veículo de voltar a publicar informações sobre o caso.

“A análise concreta da historicidade de crimes famosos deve perpassar a aferição do genuíno interesse público presente em cada hipótese fática. Tal dimensão apenas pode ser constatada nas situações em que os fatos recordados marcaram a memória coletiva e, por isso, sobrevivem à passagem do tempo, transcendendo interesses individuais e momentâneos”, explicou. 

Assim, a abstenção de publicar novas reportagens informativas a respeito do crime em questão não merece acolhimento. O entendimento foi seguido pela ministra Nancy Andrigui, que proferiu voto-vista na sessão por vídeo-conferência, para quem o pedido da autora pode configurar censura prévia.

“Não há qualquer ilegalidade na veiculação de matéria jornalística acerca do crime multicitado neste julgamento e a invocação ao direito ao esquecimento não é elemento suficiente para reverter esse entendimento”, concluiu.

Indenização por danos morais
A 3ª Turma do STJ manteve a condenação por danos morais no valor de R$ 30 mil para a primeira autora e R$ 20 mil para as demais. No recurso especial, as partes contestavam o valor, atestando que representaria apenas 3,28% do faturamento obtido pela publicação com a manchete e a imagem exposta na capa da revista. Essa tese foi considerada equivocada.

“Trata-se de critério válido para, talvez, mensurar danos patrimoniais decorrentes de uso ilícito da imagem; tal parâmetro, porém, não é adequado para dispor quanto à proporcionalidade entre o enriquecimento ilícito e a dimensão punitivo-pedagógica utilizada como pilar para o arbitramento de indenização em casos de violação à esfera moral do indivíduo”, concluiu o relator.

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REsp 1.736.803

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