TERMÔMETRO COVID-19

Saque do FGTS em demissão por força maior prescinde de trânsito em julgado

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4 de maio de 2020, 13h07

A Caixa Econômica Federal publicou na última quarta-feira (29/4) a nova versão do Manual FGTS. Agora, empregados que que foram demitidos por força maior não precisarão apresentar decisão transitada em julgado para conseguir sacar a multa de 20% do FGTS. 

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No entanto, para que os valores depositados sejam acessados, continua sendo necessário apresentar ação para que a Justiça do Trabalho reconheça a rescisão. 

Segundo levantamento feito pela ConJur, em parceria com a instituição de educação Finted e a startup Datalawyer Insights, grande parte dos 10 mil processos trabalhistas que estão se amontoando no Judiciário por conta da epidemia do novo coronavírus são referentes a ações sobre aviso prévio e multa de 40% do FGTS, temas inerentes às demissões. Os dados fazem parte da plataforma Termômetro Covid-19 na Justiça do Trabalho, lançada na última sexta-feira (1º/5). 

Mesmo com a mudança de entendimento da Caixa, não é possível dizer que o número de casos que irão desembocar no Judiciário tende a diminuir. Como não há necessidade de que a decisão transite em julgado, no entanto, o tempo decorrido até que o trabalhador consiga sacar o FGTS será mais curto.

Força maior
A força maior é prevista no artigo 501 da CLT (Decreto-Lei 5.452/43), segundo o qual “entende-se como força maior todo acontecimento inevitável, em relação à vontade do empregador, e para a realização do qual este não concorreu direta ou indiretamente”. 

Nesses casos, segundo o artigo 18, parágrafo 2 da Lei 8.036/90, o trabalhador que tiver contrato rescindido tem direito a apenas 20% da multa do FGTS. 

A força maior, tal como prevista na CLT, além de ser um acontecimento inevitável à vontade do empregador, deve afetar sua situação econômica e financeira a ponto de acarretar a extinção da empresa ou de um dos estabelecimentos. 

Isso mudou desde que o Governo Federal editou, em 22 de março, a Medida Provisória 927, que reconhece, no artigo 1º, parágrafo único, que a calamidade pública constitui, para fins trabalhistas, hipótese de força maior, não sendo necessário que a Justiça do Trabalho reconheça esse fato para que a rescisão ocorra. 

Problemas práticos
Para Ricardo Calcini, professor de pós-graduação da FMU, mestre em Direito do Trabalho pela PUC-SP e organizador do e-book Coronavírus e os Impactos Trabalhistas, a mudança de entendimento da Caixa e a MP deixam uma série de questões em aberto. 

Entre elas, de quem será a competência para analisar essas questões, se da Justiça do Trabalho ou Federal. Além disso, não se sabe quem irá figurar no polo passivo da ação, se a empresa, a Caixa ou ambas. 

"O atual problema que já está sendo enfrentado hoje no Judiciário é que nem toda rescisão contratual pode ser reputada, na forma do artigo 501 da CLT, como força maior. E a origem de toda essa discussão se deu após a MP 927, que reconhece a hipótese de força maior. Logo, a partir de uma interpretação literal da medida provisória, não seria necessário que a Justiça do Trabalho reconheça esse fato para que ocorram as rescisões contratuais com redução da multa do FGTS para 20%", explica. 

Assim, Calcini vislumbra dois cenários. No primeiro, as rescisões contratuais, por força maior, ocorridas na vigência da MP 927, não necessitarão de chancela judicial e, assim, a Caixa deverá proceder com as mudanças de suas diretrizes internas para permitir o levantamento do FGTS.

No segundo, milhares de ações serão ajuizadas perante o Judiciário trabalhista para que a situação de força maior seja efetivamente reconhecida em cada caso, evitando-se, assim, fraudes com a redução da multa para 20%, uma vez que, na prática, nem todas as empresas foram extintas. 

"Sem dúvida, a recente mudança de diretriz interna da Caixa para que não mais se exija o trânsito em julgado da decisão judicial representou um grande avanço, por abreviar anos e anos de debates judicias, permitindo que a parte mais interessada em toda essa discussão — o trabalhador — possa, em curto espaço de tempo, levantar seu FGTS acrescido de multa de 20%. Contudo, exigir o ajuizamento de ações trabalhistas é incongruente com os atuais estágios de urgência e necessidade pelos quais estão atravessando os trabalhadores", diz Calcini.

Ainda segundo ele, as fraudes que se pretende evitar devem ser combatidas caso a caso, a depender do interesse do reclamante em vir ou não discutir tal questão na Justiça.

"Isso, porém, deve ser exceção, e não a regra, pois, tal como a problemática está posta hoje, todos os trabalhadores, independentemente da existência ou não de fraudes nas rescisões contratuais por força maior, têm que ingressar em juízo para terem direito a liberação do FGTS com a multa reduzida em 20%."

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