Voz da Experiência

Sem diálogo, Brasil tem despedaçamento da engenharia constitucional, diz FHC

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4 de maio de 2020, 16h56

Ao adotar uma postura agressiva em momento de crise, Jair Bolsonaro abre espaço para que outros Poderes da República assumam o protagonismo e embala um despedaçamento da engenharia constitucional. A análise é do sociólogo e ex-presidente do Brasil Fernando Henrique Cardoso.

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Fernando Henrique Cardoso criticou postura do governo Bolsonaro na crise 
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Ele participou, nesta segunda-feira (5/4), do seminário virtual Voz da Experiência. O evento é organizado pela TV ConJur e foi apresentado pelo ex-presidente do STF e ex-ministro da Justiça, Nelson Jobim. Contou, ainda, com outros dois presidentes da República: Fernando Collor e Michel Temer.

“O momento é muito delicado e, como está existindo um esfacelamento de poder, cada Poder da República quer ocupar espaço. É preciso contenção. O presidente da República é um pouco como um poder moderador. Ele é Executivo, mas como chefe da nação tem que ouvir a todos e fazer a composição. O presidente atual, como vai para a agressão e não a coesão, abre espaço para que outros poderes queiram cumprir funções que são próprias do Executivo”, afirmou Fernando Henrique Cardoso.

Isso permite a ampliação do conflito do Executivo com o Legislativo e, principalmente, o Judiciário. Nesse aspecto, o ex-presidente criticou decisões judiciais do Supremo Tribunal Federal que considerou invasivas, como a que impediu Bolsonaro de nomear Alexandre Ramagem para a Polícia Federal e a que suspendeu a expulsão de corpo diplomático venezuelano. Para ele, houve exagero.

“Você não pode dar ao presidente a desculpa de dizer ao país que não governa porque está sendo bloqueado. É uma briga”, opinou. Esse conflito foi observado em variados momentos desde a promulgação da Constituição de 1988, mas não de maneira tão explícita porque, segundo FHC, houve diálogo e coesão para assentar as diferenças institucionais.

“Está havendo um despedaçamento da engenharia constitucional. Não vou dizer que a Constituinte tinha absoluta clareza do que tinha que se fazer, mas o Brasil foi se ajeitando”, disse o ex-presidente, que foi membro da Assembleia Nacional Constituinte, responsável pela Carta Magna de 1988.

Ruptura institucional
Fernando Henrique Cardoso ainda criticou o estilo adotado por Jair Bolsonaro na presidência da República, de isolamento e conflito permanente, estimulado publicamente por diversas manifestações e entrevistas. Em sua análise, presidentes que não têm maioria no Legislativo e se chocam com o Congresso têm dificuldade de se manter.

“Nessas horas, se você tem a visão de que vai governar sem fazer associações, você enlouquece. Você quer ser ditador. Eu não creio que ele tenha noção que isso pode correr. Mas do jeito que vai, pode acontecer. Não que ele queira isso, mas pode ocorrer. Ele só pensa em termos de ‘eu sou o Estado’. Ninguém é o estado. Na sociedade contemporânea, você tem que levar em consideração a opinião das pessoas”, criticou.

O evento foi promovido pelo Instituto para Reforma das Relações entre Estado e Empresa no (Iree) e pela Aliança de Advocacia Empresarial.

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