Reflexões trabalhistas

Garantia constitucional da coisa julgada

Autor

  • Raimundo Simão de Melo

    é consultor Jurídico advogado procurador regional do Trabalho aposentado doutor em Direito das Relações Sociais pela PUC/SP professor titular do Centro Universitário do Distrito Federal-UDF/mestrado em Direito das Relações Sociais e Trabalhistas membro da Academia Brasileira de Direito do Trabalho e autor de livros jurídicos.

19 de junho de 2020, 9h41

Spacca
No sistema jurídico brasileiro a coisa julgada decorre do princípio norteador do estado democrático de direito e constitui cláusula pétrea garantidora dos direitos e garantias individuais dos cidadãos, cláusula esta que não pode ser modificada nem por emenda constitucional, como assegura nossa Constituição Federal no inciso IV do parágrafo 4º do seu artigo 60. Essa cláusula pétrea está consagrada no inciso XXXVI do artigo 5º da Constituição Federal, o qual dispõe:

A lei não prejudicará o direito adquirido, o ato jurídico perfeito e a coisa julgada.

Trata-se a coisa julgada de um direito fundamental e uma garantia constitucional, não podendo ser alterada pelo Estado-lei nem pelo Estado-Juiz.

O fundamento maior da coisa julgada é proibir que se volte a decidir acerca de questões já decididas pelo Poder Judiciário, com a finalidade de conferir segurança às relações jurídicas, paz na convivência social e evitar a perpetuação e eternização dos conflitos sociais, porquanto, ao mesmo tempo em que o Estado assegura ao jurisdicionado o livre acesso ao Poder Judiciário, depois que este resolver o conflito, sua decisão tem que ser respeitada por todos, inclusive por ele próprio.

Por isso que a função jurisdicional se diferencia das outras funções do Estado, exatamente por conta da sua definitividade e imutabilidade na resolução dos conflitos (depois de transitada em julgado), enquanto que a natureza das atividades legislativas e administrativas é de mutabilidade de seus atos.

Não houvesse a autoridade da definitividade da função jurisdicional não se alcançaria a pacificação social e a segurança jurídica, uma vez que os descontentes retornariam a litigar indefinidamente perante o Judiciário, tornando instáveis as relações jurídicas.

O instituto da coisa julgada foi concebido para conferir imutabilidade às decisões judiciais, princípio este que vem desde o Direito romano, anterior mesmo à lei das 12 Tábuas. Por isso, como lecionou Couture, “a coisa julgada revela o mais importante atributo da jurisdição”.

Por isso, a decisão de mérito, transitada em julgado, somente pode ser rescindida em situações excepcionais, ou seja, quando demonstrada de forma cabal a existência de algum vício previsto nas hipóteses restritivas de seu cabimento, expressas no artigo 966 do CPC.

Em razão do respeito e garantia da coisa julgada, a excepcional ação rescisória, que não é recurso, não pode ser usada como espécie “sanatória” de quaisquer vícios do processo, os quais são resolvidos nos autos através dos remédios processuais colocados à disposição das partes. No sistema jurídico brasileiro existem inúmeros recursos que permitem levar a discussão, no caso trabalhista, até o TST e, ainda, conforme o caso, ao STF.

Portanto, vícios comuns relacionados à regularidade da atuação jurisdicional são resolvidos na ação ordinária, ancorada por uma plêiade de recursos à disposição das partes contendoras.

Por isso, a esmagadora maioria das ações rescisórias que chegam aos tribunais são indeferidas ou julgados improcedentes os pedidos rescisórios, uma vez que, não raro, leva-se o processo originário até o TST, no caso trabalhista, e, inconformada com a decisão final que não acolheu sua pretensão, a parte se vale indevidamente da excepcional ação rescisória em clara situação de substituição recursal, o que não é admitido.

Autores

  • Brave

    é doutor e mestre em Direito das Relações Sociais pela PUC-SP. Professor Titular do Centro Universitário — UDF, no mestrado em Direito das Relações Sociais e Trabalhistas e na Faculdade de Direito de São Bernardo do Campo (SP), na Pós-Graduação em Direito e Relações do Trabalho. Consultor Jurídico e Advogado. Procurador Regional do Trabalho aposentado. Membro da Academia Brasileira de Direito do Trabalho.

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