Excepcional mediante ameaças

Moraes e Barroso votam pela continuidade do inquérito das fake news

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17 de junho de 2020, 13h16

A instauração do chamado inquérito das fake news (Inq 4.871) não apresenta inconstitucionalidades, além de ter em seu escopo a investigação de ataques em massa, orquestrados e financiados com propósitos de intimidar os ministros do Supremo Tribunal Federal e seu familiares. 

O entendimento é compartilhado pelos ministros Alexandre de Moraes e Luís Roberto Barroso, que votaram nesta quarta-feira (17/6) pela manutenção do inquérito. O julgamento continua à tarde.

Nelson Jr./SCO/STF
Alexandre de Moraes foi designado para relatar o inquérito que apura ameaças contra os ministros do STF e seus familiares
Nelson Jr./SCO/STF

Aberto em março de 2019, por ordem do presidente do Supremo, Dias Toffoli, o inquérito apura ameaças contra ministros da corte. Ele é presidido pelo ministro Alexandre de Moraes e corre sob sigilo. Logo após anunciado, o partido Rede Sustentabilidade ajuizou uma ADPF para questionar a portaria que determinou a abertura do inquérito. 

Na última semana, apenas relator da ação, ministro Luiz Edson Fachin, tinha votado no julgamento. Para ele, o inquérito deve seguir, mas com delimitações. O ministro propôs dar interpretação conforme à Constituição para, dentre outros tópicos, definir que o inquérito deve ser acompanhado pelo Ministério Público.

Nesta sessão, o ministro Alexandre de Moraes acompanhou o relator sobre o cabimento da ação e constitucionalidade da portaria. No entanto, foi contra dar interpretação conforme, por entender que as medidas sugeridas por Fachin já estão sendo cumpridas. 

Relator do inquérito
Em seu voto, Alexandre explicou o que chamou de sistema acusatório híbrido, que permite inquéritos policiais e também autoriza hipóteses de investigações pré processuais. Mais de uma vez afirmou que a privatividade da ação penal pública concedida ao Ministério Público não deve ser confundida com as investigações penais. 

De acordo o ministro, a possibilidade que investigações criminais sejam executadas e conduzidas sem a provocação do MP não conflita com o sistema acusatório.

Não existe, disse, o monopólio da investigação por parte das policiais judiciárias e a determinação de instauração de inquérito por parte do Ministério Público. Para ele, todo tribunal pode abrir inquéritos e investigações criminais sem que haja pedido do MP.

Já acerca da instauração do inquérito em análise, Alexandre defendeu que é competência do presidente do Supremo a defesa institucional da corte e a garantia de independência de seus magistrados. “Coagir, atacar, constranger, ameaçar, atentar contra o STF e o Poder Judiciário, seus magistrados e familiares é atentar contra a Constituição Federal, a democracia, o Estado de Direito e a defesa intransigente dos direitos humanos fundamentais.” 

Além disso, disse ter garantido às defesas o acesso ao inquérito das fake news.

Alvo certo
Moraes apresentou trechos que estão na investigação, que envolvem ataques cibernéticos com e-mails institucionais, ameaças de morte e perseguição. Segundo ele, não se trata de meros xingamentos, mas sim tentativas de coação.

Um dos episódios citados foi o de uma advogada do Rio Grande do Sul que incitou o estupro. “Que estuprem e matem as filhas dos ordinários ministros do STF”, disse a advogada, segundo Moraes. “Em nenhum lugar do mundo isso é liberdade de expressão. Isso é bandidagem, criminalidade”, criticou o ministro.

Em outro caso, disse o ministro, foi registrado que um artefato explodiu em frente à casa de um dos ministros. Noutro momento, também foi rastreada na deep web que criminosos já tinham a planta do STF.

Segundo o ministro, outro trecho dizia: “Quanto custa atirar à queima roupa nas costas de cada filho da puta do STF que queira acabar com a prisão em segunda instância. Se acabar com a segunda instância, só nos basta jogar combustível e tocar fogo do plenário com os ministros dentro." Moraes questionou: "Onde está aqui a liberdade de expressão?"

Por fim, o ministro citou terceiro trecho: “Já temos em poder armas e munição de grosso calibre. Esconda seus filhos e parentes bem escondidos na Europa, porque aqui não vai ter onde se esconder. Faremos um tribunal em praça pública com direito ao fuzilamento de todos os parasitas e vagabundos estatais!”

Providência excepcional
O ministro Luís Roberto Barroso seguiu os votos proferidos até então e frisou que o inquérito deve ser interpretado de maneira restrita, sendo considerado uma “providência excepcional”. 

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Barroso entende que o inquérito impugnado deve ser interpretado de maneira restrita
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No início de seu voto, Barroso afirmou que a regra geral é de que “crime contra ministro não reclama inquérito específico”. Resgatando os valores do princípio republicano, ele disse que todos se sujeitam às mesmas normas e que, portanto, eventual crime contra honra de ministro do Supremo deve ser apurado nas instâncias próprias.

No entanto, fez uma ponderação: o caso analisado trata de legítima defesa, vez que são “ataques massivos, orquestrados e financiados com propósitos intimidatórios de seus ministros”. Nenhuma sociedade civilizada pode tolerar esse tipo de conduta, disse.

Além disso, Barroso afirmou que não se pode confundir liberdade de expressão com outras formas de movimentos. As instituições, disse, “não podem ficar amedrontadas diante de movimentos que visem destruí-las. Ao redor do mundo, é visto uma grave erosão democrática pela incapacidade das instituições muitas vezes reagirem”.

Para ele, a portaria que instaurou o inquérito é válida, mas o objeto é demarcação feita por Fachin é muito importante. O ministro concordou com as modulações do relator, mas inicialmente vota apenas pela improcedência do pedido. Ele preferiu aguardar o decorrer do julgamento para a corte balizar se fará ou não a interpretação conforme.

Bodas de madeira
No início da sessão desta quarta, o presidente Dias Toffoli prestou homenagem ao ministro Luiz Edson Fachin, que completou cinco anos na corte.

Toffoli afirmou que o ministro é detentor de firmeza, independência, vigilância e imparcialidade. Em especial na condução como relator da “lava jato”, Fachin é conhecido por manter a discrição, pronunciando-se apenas nos autos do processo.

“Costumo afirmar que processo não tem capa e que juiz não tem vontade. O Ministro Edson Fachin é um magistrado que sintetiza essa máxima. Ao vestir a toga de juiz do Supremo Tribunal Federal, despe-se das próprias convicções e ideologias e segue à risca a lição de Norberto Bobbio de que a democracia se faz com a observância das regras do jogo democrático”, afirmou. 

ADPF 572

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