Opinião

Flexibilização da coisa julgada fere a relação com a segurança jurídica

Autor

  • Marilene Talarico Martins Rodrigues

    é advogada sócia da Advocacia Gandra Martins especialista em Direito Tributário pelo Centro de Extensão Universitária CEU Law School membro do Conselho Superior de Direito da Fecomercio-SP membro do Iasp membro da Academia Paulista de Letras Jurídicas e membro da União de Juristas Católicos de São Paulo.

10 de junho de 2020, 16h29

Defender a coisa julgada é defender o Direito, e uma vez reconhecido esse direito, em nosso sistema jurídico em matéria tributária, não se pode falar em flexibilização da coisa julgada, por sua íntima relação com a segurança jurídica.

Spacca

A segurança Jurídica e o Estado Democrático de Direito
A segurança jurídica encontra-se positivada como um direito individual na Constituição de 1988, ao lado do direito à vida, à liberdade, à igualdade e à propriedade, na dicção expressa do caput do art. 5º, em que se lê:

"Art. 5º – Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade (…)."

À evidência que a segurança a que faz menção o caput da norma acima transcrita é a segurança jurídica, que repousa na igualdade de tratamento a todos os cidadãos e aos contribuintes em especial, na aplicação da lei e atuação administrativa e nas relações processuais, principalmente as decisões de mérito e demais garantias constitucionais, que resultam na confiança dos cidadãos e na eficiência na prestação dos serviços públicos.

A "segurança jurídica" representa um conjunto abrangente de ideias e conteúdos, que incluem as garantias do contribuinte.

Quanto à delimitação conceitual em relação a espécie normativa, a segurança jurídica deve possuir dimensão normativa preponderante na medida em que estabelece o dever de buscar um ideal de estabilidade, confiabilidade e previsibilidade na atuação do Poder Público, no sentido de proteger os cidadãos contra as incertezas provocadas pelo Poder Público. Por essa razão, não são toleradas ações tomadas de surpresa contra os contribuintes, que haverão de reclamar a garantia de previsibilidade e estabilidade na atuação estatal.

Isto ocorre em decorrência do Estado Democrático de Direito, adotado pelo nosso país, na forma do art. 1º da Constituição de 1988, em que os direitos e garantias constitucionais são assegurados, bem como os direitos sociais.

Entre os direitos e garantais constitucionais, arrolados pelo art. 5º da CF/88, consta o direito à jurisdição, nos seguintes termos:

"XXXV – a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito",

esse direito constitucional é também uma garantia do contribuinte de ter a sua ação apreciada pelo Poder Judiciário.

A coisa julgada e as relações jurídicas continuativas
No caso concreto, à título exemplificativo, cuida-se de exigência de ISS (Imposto Sobre Serviços de Qualquer Natureza), na exportação de serviços.

Trata-se de Ação Ordinária Anulatória de Débito Fiscal e Declaratória de Inexistência de Relação Jurídica que obrigue o contribuinte a recolher o ISS em relação a EXPORTAÇÃO DE SERVIÇOS, em que foi pleiteado:

(a) a anulação de débito fiscal, relativo aos lançamentos originários dos autos de infração lavrados, constantes do Processo Administrativo;

(b) bem como declarada a inexistência de relação jurídica que autorize exigência do ISS, por se tratar de Exportação de Serviços, que são imunes de tributação, por força do art. 156, III, § 3º, II da CF.

O pedido inicial foi feito com depósito dos valores questionados na data do ajuizamento da ação, para efeitos do art. 38 da Lei nº 6.830/80, compreendendo o ISS dos exercícios referidos (objetos dos autos de infração) e dos exercícios posteriores, até o mês de setembro (que não foram objeto dos autos de infração).

Posteriormente, a empresa passou a depositar os valores questionados, a partir dos meses subsequentes, pretendendo fazer os depósitos mensalmente, até trânsito em julgado da decisão pleiteada.

Em primeira instância foi julgada improcedente a ação. Apresentado recurso, o V. Acórdão recorrido, houve por bem acolher em parte o Recurso de Apelação interposto, para reforma da sentença de 1º Grau, nos seguintes termos:

"O recurso merece provimento em parte para anular os autos de infração mencionados no item 2 do pedido formulado na inicial, bem como para declarar a inexistência de relação jurídico-tributária quanto a exportação de serviços prestados pela autora, ora apelante dos exercícios mencionados, mas rejeitado o pedido mínimo que abrange os exercícios futuros."

Reconheceu, portanto, o Egrégio Tribunal de Justiça de São Paulo, dando escorreita aplicação aos arts. 156, § 3º, II da CF/88 e art. 2º, I da LC 116/2003, que os serviços prestados pela Empresa, foram exportados para o exterior, onde produziram seu resultado, sendo, portanto, desonerados do ISS, por força dos referidos dispositivos constitucionais e legais, ao decidir:

"Assim, verifica-se que não incide ISS nas exportações de serviços, desde que os mesmos sejam desenvolvidos no Brasil e não produzam nenhum resultado no território brasileiro.

É o que se dá na espécie, pois como se percebe dos documentos juntados, as pesquisas de medicamentes são utilizadas pela tomadora que não bastasse isso, é uma das duas únicas sócias da autora, constituída para esse fim."

Diversa seria a hipótese em que a tomadora solicitasse da prestadora de serviços a utilização das pesquisas no Brasil, o que não se dá no caso concreto.”

O V. Acórdão recorrido, portanto, reconheceu que os autos de infração descritos no pedido formulado na petição inicial, deveriam ser anulados, além da declaração de inexistência de relação jurídico-tributária quanto a não incidência do ISS sobre a exportação desses mesmos serviços prestados a partir dos exercícios constantes do pedido, tendo sido acolhida a integridade da pretensão, nessa parte.

Contudo, deixou o V. Acórdão recorrido de acolher o outro pedido formulado na inicial: "para que fosse declarada a inexistência de relação jurídica que autorizasse a exigência do ISS, para operações continuativas de exportações de serviços, por se tratar de serviços imunes de tributação", ou seja, a realização dos mesmos serviços, igualmente desonerados pela CF, constantes do contrato de prestação de serviços, entre as mesmas partes.

A r. decisão, embora tenha reconhecido a desoneração dos serviços exportados e dado pela procedência do pedido constitutivo – anulação dos autos de infração lavrados -, não acolheu o pedido declaratório quanto às relações futuras, uma vez que frustrou um dos efeitos próprios da ação declaratória, que é evitar que, nas operações continuativas como as praticadas pela Empresa, continue a ser desrespeitada, pelo Município, a imunidade tributária, nos termos do que determinam os arts. 156, § 3º, II da CF/88 e art. 2º, I da LC 116/2003.

A Constituição, em seu artigo 156, III, § 3º, inciso II, preceitua:

“Art. 156 – Compete aos Municípios instituir impostos sobre:

III – Serviços de Qualquer Natureza não compreendidos no art. 155, I, “b”, definidos em lei complementar.

§ 3º – Em relação ao Imposto previsto no inciso III, cabe à lei complementar:

II – excluir de sua incidência exportação de serviços.”

A redação do inciso II, do § 3º do artigo 156, transcrito, foi introduzida no texto constitucional pela EC nº 3/93, concedendo imunidade tributária do ISS nas operações de exportação de serviços, condicionada à regulamentação por lei complementar a ser posteriormente aprovada e publicada pelas duas Casas Legislativas – Câmara e Congresso Nacional (art. 69, CF).

Por ter sua origem na Constituição, essa desoneração, qualificada como imunidade tributária, representa uma limitação ao poder de tributar, carecendo as pessoas políticas – no caso a Municipalidade – competência para instituir e exigir imposto sobre situações definidas como tal.

Nem mesmo a Lei Complementar, a pretexto de estabelecer normas gerais aplicáveis ao ISS, poderia levar à tributação de serviços ou atividades abrangidas pela imunidade tributária, concedida pelo Texto Constitucional, que, no caso, é bastante claro: "o imposto não incide sobre exportações de serviços para o exterior".

A Lei Complementar nº 116/2003 prevê a desoneração tributária em seu art. 2º, § único, assim redigido:

"Art. 2º – O imposto não incide sobre:

I – as exportações de serviços para o exterior do País.

Parágrafo único: Não se enquadram no disposto no inciso I os serviços desenvolvidos no Brasil, cujo resultado aqui se verifique, ainda que o pagamento seja feito por residente no exterior.” (grifamos)

O que é importante, para a caracterização da atividade de exportação é que o resultado do serviço e sua utilidade para o tomador do serviço ocorra fora do País. E os documentos juntados aos autos comprovaram a contratação dos serviços e o seu resultado no exterior, como reconheceu o V. Acórdão recorrido na parte em que acolheu o pedido da Empresa.

Esta mesma situação prevalece para operações continuativas de prestação de serviços, pois, as partes permanecem as mesmas, o contrato de prestação de serviços é o mesmo.

A aplicação da imunidade tributária do ISS para essas operações continuativas de exportação de serviços é de rigor, enquanto permanecerem a lei e os fatos e, portanto, as operações continuativas dos mesmos serviços exportados estão igualmente desonerados do ISS por disposição constitucional.

É que, de outra forma, se nega os efeitos típicos do pedido declaratório, que, a teor do art. 505, I do CPC atribui à sentença o alcance de abranger as operações continuativas, enquanto permanecerem os mesmos fatos e a lei (no caso, a desoneração da tributação das exportações de serviços), em nome da segurança jurídica.

Nas relações continuativas, como é o caso das discutidas no feito, o objeto do pedido declaratório é atribuir ao reconhecimento de uma situação jurídica — no caso, imunidade da exportação de serviços, nos termos do que a autora realiza —a segurança da coisa julgada, evitando que se tenha que ajuizar tantas ações quantas forem as operações praticadas, MENSALMENTE, atravancando o Poder Judiciário, com questões que já foram decididas, dando maior efetividade à decisão judicial.

As relações jurídicas continuativas e a equivocada aplicação da Súmula 239 do STF
A questão da aplicação da Súmula 239 do STF, que contém o seguinte verbete:

"Decisão que declara indevida a cobrança do imposto em determinado exercício não faz coisa julgada em relação aos posteriores",

tem sido feita de forma equivocada, por alguns Tribunais de 2ª instância. A sua aplicação, na verdade, deve ser feita para os tributos cujos lançamentos são feitos, anualmente, como é o caso, por exemplo, do IPTU. Não, porém, para os tributos com fatos geradores que ocorrem mensalmente, como é o caso do ISS, em que a relação jurídica é continuativa.

No caso, não se trata de direito eventual, futuro ou em cogitação. São relações continuativas, relativas a prestação de serviços, constantes de contrato entre as partes. É, portanto, induvidosa a atualidade dessa relação, ainda que se refira a fatos futuros, não são incertos, vale dizer, não são eventuais, porque integram a atividade do contribuinte.

É, aliás, nesse sentido a Jurisprudência dos Tribunais Superiores, em casos em que reconheceram a não aplicação da Súmula 239, considerando que em Ações Declaratórias postulando o reconhecimento da inexistência de relação jurídica em operações continuativas em que o fisco exija quantias indevidas a título de imposto — como no caso em comento, cujas atividades de exportação de serviços estão imunes de ISS, por disposições constitucionais — a coisa julgada projeta efeitos futuros, se e enquanto os fatos e a lei permanecerem os mesmos.

Por esta razão, o Supremo Tribunal Federal, no julgamento do ERE nº 83.225/SP, interpretou a Súmula 239, no sentido de que:

"A decisão judicial, que declara a inexigibilidade do tributo, projeta efeitos para o futuro, mas não possui o condão de cristalizar eternamente tal exoneração tributária, sobretudo quando ocorrer substancial alteração das normas judiciais que regem a relação jurídico-tributária, submetida à apreciação judicial. A decisão judicial é proferida segundo o estado de fato e de direito vigente à época de sua prolação e prevalece, por óbvio, enquanto tal estado permanecer inalterado.” (RTJ 92/707 – rel. min. Xavier Albuquerque)

O ministro Xavier de Albuquerque, nesse julgado, fez a seguinte advertência:

"Passando ao mérito, penso que a Súmula 239 admite interpretação e reclama certo temperamento. Não a tomo no sentido radical de que ela aparentemente exprime, e admito que, em certos casos, se possa e deva excluir a prescrição da coisa julgada em matéria fiscal.

Observo, aliás, que tal prescrição, tomada em sentido absoluto e valendo, para qualquer hipótese, não só não resulta de qualquer norma legal, como não se conforma ao direito positivo brasileiro e é, ao invés, contestada por preceito legal expresso." (RTJ 709/710)RE nº 93.048-5/SP

EMENTA: Taxa de Licença para localização e financiamento. Imposto Sobre Serviços. Lei Municipal nº 6.989/66-SP. Ilegitimidade da taxa de licença para localização e funcionamento em face do disposto nos arts. 77 e 78 do CTN. Precedentes do STF. Não incidência. Coisa julgada. Súmula 239 (interpretação restritiva). Inaplicabilidade da Súmula 239, à hipótese, dado que o reconhecimento da inexistência do débito tributário, ajuizado pelas mesmas partes e declarado inconstitucional, faz coisa julgada material. Recurso Extraordinário provido." (relator ministro RAFAEL MAYER – 1ª T. STF – DJ 14-08-81)

Também no RE nº 765.349/SP restou assentado que:

"APELAÇÃO. Ação Declaratória, de inexistência de relações jurídicas tributárias com pedido cumulativo de repetição do indébito. Imposto predial e territorial urbano. Imunidade. Reconhecimento. 'Res indicata'. Fato Gerador que se protrai no tempo. Projeção dos efeitos da sentença a exercícios futuros, enquanto inalteradas as situações de fato e de direito nas quais se formou a coisa julgada. Inteligência do artigo 150, VI, 'c', e § 4º da Magna Carta." (rel. ministro Dias Toffoli)

Em antiga decisão, no AI nº 121.047-8-AgRg/SP (RT 628/270), o Acórdão proferido pelo STF, foi bastante claro e direto ao confirmar acórdão do E. Tribunal de Justiça de São Paulo, sobre mandado de segurança deferido para impedir exigência de ICMS por restaurante, restando assentado que:

"Não se aplica à espécie a Súmula 239 do Pretório Excelso, já que não se cuida da indevida cobrança do imposto em determinado exercício, mas de sua cobrança enquanto persistam normas vigentes, que não autorizam, sistematicamente."

O voto do relator, ministro Sydney Sanches, nesse julgado, ressaltou que a decisão impugnada não afrontava a Súmula nº 239, pois:

"O que se coloca na impetração é o direito da impetrante, proprietária de restaurante, de não sofrer a cobrança do ICMS em sua atividade precípua de fornecimento de bebidas e alimentos aos seus fregueses, nos moldes estabelecidos na legislação tributária paulista.

Cuida-se, assim, de típica segurança preventiva, alicerçada em elementos concretos e diante de ameaça decorrente da orientação do fisco estadual, consubstanciada nas alegações de mérito da autoridade impetrada. Não se volta o pedido contra a lei em tese, e nem se há de taxar de normativa a segurança, mas preventiva contra tal orientação, que conduzirá, inevitavelmente caso intente, sem cobertura judicial, deixar de solver as parcelas do ICM, no regime em que está enquadrada, ou não lançar em seus livros os tributos relativos às operações de fornecimento efetuadas em seus estabelecimentos."

Essa Jurisprudência permanece atual, tanto que o saudoso ministro Teori Zavascki, quando integrava o E. Superior Tribunal de Justiça, sustentou o mesmo entendimento, como se vê da decisão proferida no RESP 893.863/CE, em seu voto, fazendo remissão a trabalho doutrinário de sua lavra (Eficácia das Sentenças na Jurisdição Constitucional, São Paulo: Revista dos Tribunais, 2001, pp. 81-100):

"… há certas relações jurídicas sucessivas que nascem de um suporte fático complexo, formado por um fato gerador instantâneo, inserido numa relação jurídica permanente. Ora, nesses casos, pode ocorrer que a controvérsia decidida pela sentença tenha por origem não o fato gerador instantâneo, mas a situação jurídica de caráter permanente na qual ele se encontra inserido, e que também compõe o suporte desencadeador do fenômeno de incidência. É sabido que tal situação, por seu caráter duradouro, está apta a perdurar no tempo, podendo persistir quando, no futuro, houver a repetição de outros fatos geradores instantâneos, semelhantes ao examinado na sentença. Nestes casos, admite-se a eficácia vinculante da sentença também em relação aos eventos recorrentes. Isso porque o juízo de certeza desenvolvido pela sentença sobre determinada relação jurídica concreta decorreu, na verdade, de juízo de certeza sobre a situação jurídica mais ampla, de caráter duradouro, componente, ainda que mediata, do fenômeno de incidência.

(…)

Estabelecido que a sentença, nos casos assinalados, irradia eficácia vinculante também para futuro, surge a questão de saber qual é o termo ad quem de tal eficácia. A solução é esta e vem de longe: a sentença tem eficácia enquanto se mantiverem inalterados o direito e o suporte fático sobre os quais estabeleceu o juízo de certeza. Se ela afirmou que uma relação jurídica existe ou que tem certo conteúdo, é porque supôs a existência de um determinado comando normativo (norma jurídica) e de determinada situação de fato (suporte fático de incidência); se afirmou que determinada relação jurídica não existe, supôs a inexistência, ou do comando normativo, ou da situação de fato afirmada pelo litigante interessado. A mudança de qualquer desses elementos compromete o silogismo original da sentença, porque estará alterado o silogismo do fenômeno de incidência por ela apreciado (…)."

No mesmo sentido, tem sido o entendimento do STJ, como se constata, do seguinte julgado, tendo como relator o ministro Herman Benjamin, entre outros:

RESP nº 1.335.231-RS (2012/0151566-4)

"3. A Ação Declaratória em matéria tributária é adequada para dirimir uma crise de certeza entre o Fisco e o sujeito passivo tributário, no que concerne à incidência da norma tributária sobre fatos específicos, fenômeno que faz surgir a relação jurídica na qual aqueles são ocupantes de polos opostos.

(…)

5. Ao contrário do que concluiu o Tribunal de Justiça, configurada a repercussão do provimento postulado sobre a situação jurídica do sujeito passivo tributário, não há óbice a que o provimento jurisdicional declaratório alcance fatos futuros, conforme já assentado pelo STJ (REsp 1.0410.79/RJ, Rel. Ministro Castro Meira, Segunda Turma, DJe 10.11.2008)."

Assim, à luz do entendimento dos Tribunais Superiores, em casos como o exemplo do Contribuinte, a decisão – ao contrário do que concluiu o V. Acórdão do Eg. Tribunal de Justiça de São Paulo —, irradia eficácia vinculante também para o futuro, enquanto se mantiverem inalterados o suporte fático e o direito sobre os quais se estabeleceu o Juízo de certeza da r. decisão.

Se assim não fosse, ocorreria negativa de vigência ao art. 505, I, do CPC, que preceitua:

"Art. 505 — Nenhum Juiz decidirá novamente as questões já decididas, relativas à mesma lide, salvo:

I – se, tratando-se de relação jurídica continuativa, sobreveio modificação no estado de fato ou de direito, caso em que poderá a parte pedir a revisão do que foi estatuído na sentença."

A lei processual não pode deixar de ser aplicada pelo julgador, quando estabelece condições, como é o caso da norma do art. 505, I do CPC, para a dimensão da coisa julgada, cujos efeitos deverão permanecer — pois, a lide solucionada diz respeito à relação jurídico-material continuativa — enquanto não houver alteração fático-normativa que embasou a decisão.

Seria, na verdade, inadmissível, que a declaração de desoneração tributária contida no V. Acórdão ora comentado, não se projetasse para o futuro, deixando aberta ao Fisco a oportunidade de continuar exigindo o tributo pela prática de atos idênticos àqueles examinados e reconhecidos pela decisão recorrida como desonerados pela lei e pela Constituição.

É, pois, de rigor, em casos como este, o reconhecimento da imunidade tributária do ISS em relação às operações futuras de exportação de serviços, enquanto permanecerem os mesmos fatos que ensejaram a prestação de serviços e a mesma lei desonerativa, à luz dos dispositivos constitucionais apontados, a saber, o artigo 156, § 3º, II e o art. 5º, incisos XXXV, LXXVIII, LV e LIV da CF, e da Jurisprudência dos Tribunais Superiores (STF, repetida pelo STJ).

É o que se espera do Superior Tribunal de Justiça — Tribunal da Cidadania, como de direito.

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    é advogada, sócia da Advocacia Gandra Martins, especialista em Direito Tributário pelo Centro de Extensão Universitária CEU Law School, membro do Conselho Superior de Direito da Fecomercio-SP, membro do Iasp, membro da Academia Paulista de Letras Jurídicas e membro da União de Juristas Católicos de São Paulo.

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