Saída de emergência

PL mantém debate sobre fake news e ataca redes de disseminação

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5 de junho de 2020, 17h20

Em tramitação no Senado, o Projeto de Lei 2.630, de autoria do senador Alessandro Vieira (Cidadania-SE), também apelidado de "lei das fake news", se abstém da difícil tarefa de determinar o que é notícia fraudulenta. Sem desestimular o debate, foca na questão da regulação feita por parte das ferramentas utilizadas na disseminação de conteúdo falso, como forma de diminuir o alcance dos atos criminosos praticados na internet.

ConJur
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Essa é ideia apresentada pelo próprio autor do projeto, no seminário virtual "Saída de Emergência", realizado pela TV ConJur na tarde desta sexta-feira. Com mediação de Otávio Rodrigues, conselheiro do CNMP e professor da USP, o evento teve como tema “A Lei das Fake News e os limites da internet” e contou com participação de estudiosos e parlamentares envolvidos na discussão.

"Como funciona hoje: a produção de fake news em escala industrial tem alguém que bola a estratégia, cria o conteúdo e usa contas falsas e rede automatizada para dar alcance rápido e intenso. Quando você tira da mão do criminoso a conta falsa e a rede de distribuição, faz com que o alcance seja drasticamente reduzido. Combate-se a prática sem entrar na seara da liberdade de expressão, que não poderia ser mitigada por força de lei", disse o senador.

O parlamentar também explicou que o projeto de lei tem três pilares. O primeiro é garantir ao usuário o direito de defesa perante a plataforma, que já realiza mediação de conteúdo. O segundo é obrigar essas plataformas a vender contas falsas — em nome de terceiro, para uso automático. E por fim acabar com as redes de disseminação.

"Quando focamos nas ferramentas usadas para o crime, compreendemos que tiramos o peso do Judiciário, porque o desestímulo ao criminoso será elevado. Se você identifica o usuário, o criminoso fica totalmente exposto. Por isso o foco de sanção está nas plataformas, essencialmente. Elas passam a ter a obrigação de evitar o uso de contas falsas, de redes de distribuição não declaradas", afirmou.

A partir do desrespeito a essas diretrizes, que seriam delimitadas pelo estado, mas aplicadas diretamente por essas plataformas, surgiriam possíveis sanções, desde advertência até a suspensão do serviço em solo brasileiro.

Privacidade
Deputado federal, Orlando Silva (PCdoB-SP) afirmou que espera uma atuação bastante temperada entre Senado e Câmara para que a discussão tenha o menor atrito possível. E na discussão, levantou algumas questões. Uma delas é referente à proposição de que o uso das plataformas pressuponha a apresentação de documento de identificação válido.

"Eu compreendo o objetivo, mas há quem critique que poderia representar uma violação da privacidade. Talvez fosse melhor prever a possibilidade em que a plataforma faz a notificação para que essa conta se identifique", afirmou o parlamentar.

Citou, também, a preocupação por parte dessas plataformas — de Whatsapp e Telegram a redes sociais como Facebook e Twitter — de que uma nova lei inviabilize sua atividade. "Há a perspectiva de que deveríamos estimular a autorregulação por parte das plataformas, mas com regras fixadas", afirmou. 

Autorregulação regulada
Juliano Maranhão, professor da USP e pesquisador do assunto, diz que essa autorregulação regulada citada pelo deputado é um caminho híbrido entre dois formatos já fixados no ordenamento jurídico. São eles: a regulação externa, em que o Legislativo define o ilícito, estabelece obrigações, imputa responsabilidade, e o Judiciário aplica; e a autorregulação, em que um órgão representativo cuida desse equilíbrio, como no caso do Conar para o mercado publicitário.

Na autorregulação regulada, o estado vai definir parâmetros que deverão ser seguidos por agentes do mercado, de forma a atender determinados requisitos. "É uma saída ponderada e inteligente", definiu, ressaltando que a jurisprudência formada pela instituição que fará essa atuação passará a definir a forma de ação no caso das fake news.

"O mais importante é que a responsabilização não é pelo conteúdo. O Estado exige que sejam adotados procedimentos para o monitoramento e controle de conteúdo. Mas a responsabilização é pela omissão em adotar esses procedimentos, que o Estado considera adequados para a situação", disse.

Ação do Judiciário
Ao impor parâmetros para coibir a disseminação de notícias fraudulentas sem entrar na discussão sobre liberdade de expressão, o projeto da lei das fake news indica que pode poupar o Judiciário de uma enxurrada de processos, com resolução dos litígios. Por outro, segundo a conselheira do CNJ Maria Tereza Uille, não pode coibir que as demandas cheguem para definição pela via judicial.

"Nem tudo que acontece precisa ser levado ao Judiciário. Nessa perspectiva de prevenção, é importante que haja espaço de regulação, mas desde que nenhuma lesão deixe de ser levada ao Judiciário se assim entender o cidadão", apontou. "No projeto de lei, o senador teve o cuidado de propor sanções. Os provedores ficariam sujeitos a penalidades, assegurado o devido processo legal. Acho que é um debate importante", acrescentou.

Na avaliação de Uille, embora a legislação penal preveja punição a casos de calúnia, injúria e difamação, ela está defasada para lidar com a questão das fake news. "Um tipo de sanção rápida e efetiva seria, também, a obrigatoriedade de publicação de nota de informação em respeito às pessoas que foram atingidas. Na medida em que a notícia falsa se alastra, o direito de imagem da pessoa atingida é de difícil reparação", propôs.

Clique aqui para ler o PL 2.30
Assista abaixo ao seminário virtual:

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