Opinião

A curva de falências de empresas precisa ser achatada

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5 de junho de 2020, 7h07

O Brasil enfrenta a pior crise da sua história com a pandemia da Covid-19 e mais de 30 mil vidas perdidas até o momento. Com a desaceleração do crescimento ao menor índice, o pico da pandemia se aproxima, o que indica que a curva de óbitos deve estar próxima do platô. Finalmente, é preciso falar em achatar a curva de falência dos negócios e da economia.

O Congresso aprovou, pendente agora no Senado Federal, o Projeto de Lei 1.397/2020, que cria medidas de emergência para prevenir a crise econômico-financeira de empresas e produtores e facilita o regime jurídico da recuperação judicial e extrajudicial. Desta vez, o legislador leva mais a sério os efeitos de uma economia em depressão e de fechamento em massa de empresas no país. É certo que precisamos melhorar, e muito, nosso sistema de manutenção de empresas. Assim, esse projeto de lei é um bom começo.

A primeira inovação é permitir que qualquer agente econômico (incluem-se aqui associação, clubes e entidades sem fins lucrativos) possa entrar com pedido de negociação prévia. O ente econômico recebe uma proteção judicial por até 90 dias para uma negociação direta com os credores, sem juiz, mediador ou qualquer intermediário. A empresa tem a blindagem necessária para negociar, levando-se em conta sua capacidade de pagamento e não a necessidade do credor. Isso diminui os custos do processo e agiliza a solução dos problemas.

O estímulo à mediação já é um começo. Ainda que o tempo de 90 dias seja curto para negociações de maior porte, há claramente a indicação de que a sociedade quer a mediação levada ao extremo, ao dar as mãos e unir os interesses. Nesse sentido, há chances de menos falências e fechamento de negócios.

Caso não ocorra acordo dentro desse período, o processo pode transformar-se automaticamente em recuperação judicial, o que parece razoável. Outra inovação é a possibilidade de ocorrer a recuperação extrajudicial, com blindagem da empresa, suspensão de execuções, arrestos e qualquer medida contra a empresa. Essa é a segunda mais importante inovação desde que surgiu a lei de recuperação de empresas.

A recuperação, quando judicial, é extrema, complexa, cara, com terceiros que interveem e com riscos altos para todos os lados. Já a recuperação extrajudicial sempre foi por demais branda, incapaz de trazer à mesa uma negociação que efetivamente permitisse o levantamento do negócio. Por não trazer a proteção necessária ao empresário, permite as execuções individuais e toma força contra os ativos que deveriam atender à própria empresa e, no limite, à coletividade de credores.

Permitir a proteção à empresa devedora enquanto a mesma corre com sua recuperação extrajudicial é o caminho mais acertado, pois diminui o custo, o risco e o estresse de mercado. Leva os credores a cederem ao limite que permite o recebimento de acordo com a capacidade da empresa. Para isso, o Poder Judiciário tem a seu dispor, agora, proteger a empresa através de uma reestruturação mais simples, menos burocrática e custosa: a recuperação extrajudicial.

Milhares de empresas não fazem uma recuperação judicial por não quererem submeter ao juízo suas contas, sua administração, seu know-how. Assim, ficavam fora do sistema de renegociação de dívidas que poderia salvá-las. Hoje, tal luxo não pode mais existir. Por isso, é preciso salvar o mercado através de um sistema mais ágil e eficiente. Essa nova lei traz isso a recuperação extrajudicial com proteção dos ativos.

A terceira boa inovação é que a lei não exige mais três quintos dos créditos para ter o plano extrajudicial aprovado. Basta a regular maioria de 50% mais um, o que traz mais equilíbrio ao sistema e joga para uma recuperação judicial apenas os casos muito complexos.

Agora é necessário aperfeiçoar a utilização da lei. Quando entrou em vigor a Lei 11.101/05, há 15 anos, foram dispendidos mais de cinco anos em críticas. É fundamental aplicar a nova lei, quando aprovada, indistintamente. Em que pese que hoje quase 13 mil empresas já fizeram recuperação judicial.

Se já no embalo da atual crise sem precedentes for usada a recuperação extrajudicial com proteção judicial, como previsto na lei aprovada pela Câmara, é possível ganhar tempo e impedir a falência de inúmeras empresas. Serão salvos milhares de negócios, trabalhos, empregos e, na última linha, vidas.

É possível enfrentar essa crise com retorno em "V", em "U" ou em "L". Para que seja em "V", precisamos iniciar hoje, agora, o tratamento das empresas do país, disseminar a informação corretamente sobre o alcance do processo recuperacional, preparar os agentes operadores desse instituto, utilizar as ferramentas negociais, inclusive os sites digitais já preparados para essa negociação e mediação. Isso é apenas o começo, mas o mínimo do que é preciso fazer.

Por isso, o momento é de união. Chega de críticas aos devedores e falsas notícias de que o estímulo à reestruturação elevará os juros e quebrará o país. Essa fase passou e, em última análise, são fake news e argumentos terroristas, desde o início. Agora é necessário encarar o fato de que esses empreendedores, milhões de pequenos, médios e grandes empresas, defendem o crescimento e a prosperidade deste país.

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