Justiça Tributária

Uma sugestão ao ministro Paulo Guedes sobre os depósitos judiciais na crise

Autor

  • Fernando Facury Scaff

    é professor titular de Direito Financeiro da Universidade de São Paulo (USP) advogado e sócio do escritório Silveira Athias Soriano de Mello Bentes Lobato & Scaff Advogados.

1 de junho de 2020, 7h53

Spacca
Faço uma sugestão ao Ministro da Economia, Paulo Guedes, buscando auxiliar as empresas atingidas pela pandemia econômica, decorrente da pandemia sanitária. Embora seja advogado, não falo em nome de nenhuma empresa específica e nem de confederações ou associações. Escrevo como um procurador de todos, atribuindo-me um mandato difuso, sem procuração, expondo um problema que aflige inúmeras empresas, cuja solução está nas mãos do ministro, pois tem tinta na caneta para o resolver.

O ponto central diz respeito aos depósitos judiciais para garantia de demandas tributárias.

Para suspender a exigibilidade do crédito tributário em discussão judicial, as empresas efetuam depósitos em dinheiro como garantia, fazendo-o de forma facultativa, como uma estratégia processual, ou compulsoriamente, através de bloqueios em conta corrente via Bancenjud.

Pois bem, a sugestão é singela e facilitará enormemente a vida dessas empresas que hoje enfrentam dificuldade de caixa em face da forte redução de atividades econômicas, decorrentes das necessárias medidas de contenção sanitária.

Basta que o ministro determine à Advocacia-Geral da União e à Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional, órgãos que lhe são vinculados (não subordinados, mas vinculados), que aceitem todos os pedidos de troca de garantias efetuados nos múltiplos processos judiciais em curso.

A legislação permite que sejam utilizadas outras formas de garantir o valor em disputa, por meio de seguro garantia, carta de fiança ou bens imóveis, porém, nem sempre isso é aceito pelos advogados públicos, acarretando muitos ônus no caixa das empresas que necessitam dispor de vultosas quantias para fazer frente a esses processos, em vez de utilizar esse dinheiro, hoje imprescindível para sobreviver e manter empregos.

Considere-se que não se trata de um “liberou geral”, pois a sugestão é de “troca” de garantias e não de “liberação” de garantias. Os valores em discussão judicial permaneceriam em disputa devidamente garantidos, através do instrumento financeiro do seguro garantia (que é contratado com empresas seguradoras) ou através do instrumento financeiro de carta de fiança (que, por sua vez, é contratado com empresas do sistema financeiro), ou ainda, aceitando bens imóveis que deverão ser avaliados por perícia idônea.

Desse modo, os processos judiciais permaneceriam garantidos, mas não por dinheiro, que está fazendo falta no caixa das empresas. Além disso, haveria uma dinamização da economia, pois essas garantias necessitam ser contratadas no mercado com empresas seguradoras, financeiras ou avaliadoras idôneas para serem válidas.

Trata-se de uma sugestão válida, de um advogado sem mandato específico, mas que constata diariamente o problema em sua banca, pois o número de empresas nessa situação vem aumentando em volume exponencial, e os advogados públicos (da União e procuradores da Fazenda Nacional) vêm contestando esse tipo de pedido formulado em cada processo.

Sei que os advogados públicos federais estão fazendo a sua parte, mas o ministro Paulo Guedes, na qualidade de ministro da Economia, logo, principal cliente desses advogados, poderia formalmente orientá-los a aceitar a troca de garantias aqui sugerida, facilitando a vida das empresas e concedendo a elas um fôlego a mais para enfrentar a crise atual. Com essa orientação de seu cliente, os advogados públicos poderão anuir com os pedidos que forem formulados nos autos, e seguramente o Poder Judiciário deferirá a troca, sem maiores entraves. Normativamente isso seria resolvido através de uma singela portaria do Ministro.

Hoje, em face da correta postura combativa dos advogados públicos federais, essa troca de garantias vem ocorrendo a conta-gotas, a depender do entendimento de cada magistrado, nas diversas instâncias judiciais. Se for adotada essa orientação pelo ministério da Economia, a medida será republicana, pois atingirá igualmente todas as empresas que se encontram nessa situação e manterá as garantias processuais em curso.

Caso essa orientação geral e equânime, portanto republicana, não vier do ministério da Economia, as empresas e seus advogados permanecerão na luta inglória, processo a processo, tentando liberar os depósitos judiciais, e, com isso, dependendo do convencimento e da boa vontade dos magistrados em fazê-lo. A consequência da inação ministerial é que esse dinheiro não irrigará a Economia, permanecendo empoçado nesses depósitos judiciais, e os advogados dessas empresas permanecerão dependentes da sorte na disputa judicial hoje existente.

Caso tal sugestão venha a ser acatada, muitas empresas serão beneficiadas e o governo não terá significativas perdas com essa decisão.

Observe-se ainda que tal proposta não interfere nem um milímetro no mérito das discussões em curso. O que estava sendo discutido permanece em discussão, sem nenhuma alteração de conteúdo. Apenas a garantia será alterada, de dinheiro para um dos instrumentos financeiros acima mencionados, ou por imóveis.

Em síntese, poderiam dizer as empresas ao Ministro Guedes: Esta proposta a mim ajuda e a ti não prejudica. Trago essa frase na memória afetiva, pois sempre era usada em situações como essas por Otávio Mendonça, advogado com quem estagiei milênios atrás.

É usual ouvir que não surgem ideias propositivas para a solução dos problemas. Fica a dica que se espera seja ouvida, e com agilidade.

Autores

  • Brave

    é Professor Titular de Direito Financeiro da Universidade de São Paulo (USP) e sócio do Silveira, Athias, Soriano de Melo, Guimarães, Pinheiro & Scaff – Advogados.

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