Artigo 142

Professores retomam debate sobre papel de militares em conflitos entre Poderes

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30 de julho de 2020, 16h29

Os professores Ives Gandra da Silva Martins e Gustavo Binenbojm reeditaram, em painel do "1º Congresso Digital da OAB", nesta quinta-feira (30/7), o debate sobre o artigo 142 da Constituição e as situações em que as Forças Armadas podem ser usadas para garantia da lei e da ordem. O primeiro defende que os militares podem ser empregados para conter um Poder que esteja extrapolando as suas funções. Já o segundo argumenta que as Forças Armadas não podem se sobrepor a Executivo, Legislativo ou Judiciário.

Exército Brasileiro
Artigo 142 da Constituição elenca funções das Forças Armadas
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Ives Gandra — cujo artigo publicado na ConJur retomou recentemente a discussão — afirmou que o artigo 142 da Constituição confere três funções às Forças Armadas. A primeira é a defesa da pátria, seja em solo nacional ou no exterior. A segunda é a defesa e garantia dos Poderes. Isso ocorreu quando a União, por meio dos militares, interveio na segurança do Rio de Janeiro em 2018 e quando o Exército foi convocado pelo então presidente Michel Temer, em 2017, para conter protestos em Brasília.

Já a terceira função das Formas Armadas, segundo o jurista, é atuar, por convocação de um dos Poderes, para garantia da lei e da ordem contra outro Poder que estivesse excedendo suas atribuições.

“As Forças Armadas podem, a pedido de um dos poderes, interferir contra outro poder que estiver violando a lei e a ordem. Isso poderia ter ocorrido quando Delcídio do Amaral foi preso preventivamente em 2015 sem autorização dos senadores ou quando o Supremo Tribunal Federal desrespeitou o Código Penal e legislou ao permitir o aborto de anencéfalos", explicou Ives Gandra.

A Constituição de 1988 pressupõe a harmonia e independência entre os Poderes, lembrou o advogado. Porém, ressaltou, isso não impede que haja conflitos entre eles. Nesse cenário, as Forças Armadas podem atuar para garantir o Estado de Direito e as instituições democráticas, analisou Ives Gandra, dizendo que espera que essa função nunca tenha que ser exercida pelos militares.

Poder do Direito
Gustavo Binenbojm — que assinou parecer do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil afirmando que as Forças Armadas não podem atuar como Poder Moderador — discordou de Ives Gandra.

Cabe ao Supremo Tribunal Federal, e não aos militares, a garantia da Constituição, apontou o professor. Ele citou que, desde 1891, não há Poder Moderador no Brasil. Tanto que a Carta Magna de 1988 equilibra os três Poderes por meio de freios e contrapesos.

Na visão de Binenbojm, o artigo 142 tem que ser interpretado conforme o sistema e o espírito da Constituição de 1988. Assim, nenhum Poder pode se sobrepor aos demais. Muito menos as Forças Armadas, que são subordinadas ao presidente da República e ao Ministério da Defesa.

"Se as Forças Armadas se subordinam a essas duas instâncias, não há sentido em se imaginar que, mesmo em momentos de crise, elas podem agir como árbitro dos Poderes”, opinou. O docente avaliou que a atuação dos militares para garantia da lei e da ordem não é decisória, mas instrumental, a mando da instituição que os convocou.

“Quando se sucumbe ao poder da força, o Direito não tem nada a dizer. O Estado de Direito é um projeto moral, que exige um compromisso do coração e da consciência dos cidadãos. E o projeto constitucional de 1988 não comportaria o papel de árbitro das Forças Armadas, mesmo em momento de grave abalo institucional”, afirmou Binenbojm.

Sem politização
O general Carlos Alberto dos Santos Cruz, ex-ministro da Secretaria de Governo de Jair Bolsonaro, disse que as Forças Armadas não devem ser politizadas, para não desequilibrar o jogo político-ideológico.

Nenhum dos Poderes pode procurar a ruptura, analisou o general. Segundo ele, quando “incidentes de falta de harmonia” entre os Poderes vinham ocorrendo semanalmente, os interesses da população ficaram de lado — especialmente o combate ao coronavírus e à crise econômica.

Santos Cruz ainda afirmou que as Forças Armadas devem apoiar políticas públicas e ressaltou as ações dos militares na epidemia, como o resgate de brasileiros no exterior, o transporte de remédios e equipamentos médicos e a descontaminação de locais públicos.

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