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Inquérito das fake news pode indicar mudança de jurisprudência do Supremo

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28 de julho de 2020, 17h57

Pierpaolo Bottini pregou a necessidade de não fazer do combate às fake news um instrumento de controle de opinião
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"As fake news têm alguns componentes que fazem com que o nosso ordenamento não consiga dar conta de resolver".  Esse foi um dos pontos de partida da exposição da desembargadora Simone Schreiber, no painel "Fake news, crimes contra a honra e liberdade de expressão". O seminário integra a programação do "1º Congresso Digital Covid-19: Repercussões jurídicas e sociais da pandemia", promovido pela Ordem dos Advogados do Brasil.

Além da desembargadora, também fizeram exposições sobre o tema o advogado e professor da USP, Pierpaolo Bottini, e o professor de Direito Penal da Faculdade de Direito da Universidade Humboldt, Luis Greco.

Em sua fala, Simone apontou que a disseminação massiva de fake news pode causar danos concretos. "Informações que negam a pandemia da Covid-19, por exemplo, podem prejudicar seriamente políticas públicas", explica.

A magistrada também ponderou sobre as fake news direcionadas a um individuo específico. "Nesse ponto, o fenômeno dialoga com discurso de ódio, que não cabe em uma sociedade democrática", pontua.

Ela também abordou o inquérito das fake news (Inq 4.871), aberto pelo STF. Para ela, a jurisprudência do STF sempre foi muito protetiva em relação à liberdade de expressão e a abertura esse procedimento pode sinalizar uma mudança de entendimento da corte. Simone lembra que os ataques aos ministros do STF são graves e temos que ter respostas novas para esse fenômeno.

Liberdade de expressão
O professor da USP Pierpaolo Bottini também citou o inquérito das fake news em sua exposição. O jurista leu trechos de decisão que mostraram posições contraditórias em relação à liberdade de expressão e nas justificativas para manutenção do procedimento investigatório.

"Temos inúmeros apontamentos de mentiras que em certos contextos são consideradas crimes. O desafio é lidar com mentiras não delimitadas em tipos penais. Qualquer intervenção estatal nesse tipo de comunicação é perigosa. Por mais absurda que seja a ideia, como defender a terra plana. A mim me parece que isso se corrige com o debate de informações e não com intervenção estatal", comenta.

Bottini também pontuou sobre as justificativas dos ministros para a manutenção do inquérito das fake news. "Alguns ministros apontaram que era necessário apurar o cometimento de crimes contra a honra no inquérito. Em relação a isso eu concordo. Mas, considero perigoso o fato de apontarem como razão do inquérito o combate à inverdade", pontua.

Por fim, o jurista Luis Greco apontou que o debate em relação às fake news deve ser aprofundado. "A discussão deve passar pelo debate das relações dos meios de comunicação com a sociedade. O modelo clássico pensado para jornalistas tem que ser repensado. Temos que repensar tudo. O princípio básico para essa reconstrução que deve ser feito no Direito Constitucional parte da premissa de que na democracia o erro se corrige de forma clara", explica.

O professor também abordou a dificuldade em se definir claramente o que é fake news e lembrou que o problema é uma oportunidade para discutir o financiamento da mídia e o poder que os grupos de comunicação ainda detêm no Brasil.

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