Consultor Jurídico

Especialistas debatem judicialização das políticas de saúde pública

28 de julho de 2020, 14h39

Por Tábata Viapiana

imprimir

Os juízes podem melhorar muito nas decisões ligadas à saúde, mas não dá para jogar ao Judiciário a palavra final de um problema paradoxal da sociedade brasileira. É preciso formar novos mecanismos que possam absorver a complexidade que uma decisão judicial não consegue.

istockphotoJudicialização da saúde foi tema de palestra no Congresso Digital da OAB

A fala é do professor da PUC-SP Georges Abboud em uma palestra sobre judicialização das políticas de saúde pública durante o I Congresso Digital da OAB. Segundo ele, trata-se de um problema complexo, que só se acentuou durante a epidemia do coronavírus. “Enquanto houver desigualdade social e cortes no SUS, a judicialização da saúde será inevitável no Brasil”, afirmou.

Abboud apontou como risco da judicialização da saúde a desregulamentação relevante do setor. “Nas últimas décadas, começamos a confundir o império do direito com o império dos tribunais. Mas há temas, como a saúde, em que a regulamentação não está nos tribunais, mas em órgãos de regulação”, completou. Segundo ele, os juízes precisam tomar cuidado com a consequência de suas decisões na regulamentação do setor.

Para Henderson Fürst, presidente da Comissão Especial de Bioética e Biodireito da OAB Nacional, o Poder Judiciário ainda opera na lógica de vencido e vencedor, procedente e improcedente, e não tem todo o aparato técnico para resolver os inúmeros problemas da saúde. Ele trouxe dados da judicialização da saúde no Brasil: em 2019, havia 2,2 milhões de processos em andamento; o custo aos cofres públicos, em condenações, foi de R$ 1,3 bilhão em 2016; e, do total de sentenças, pouco mais de 6% se embasam em protocolos estabelecidos por agências reguladoras e órgãos de saúde.

“O Judiciário tem sido fundamental para avanços no direito fundamental à saúde, mas tem feito isso de um modo, um pouco, às cegas, sem compreender bem a regulamentação do setor”, afirmou Fürst. Georges Abboud concorda: “O Judiciário está preparado para enfrentar conflitos. Mas alguns fenômenos da sociedade contemporânea são mais que conflitos, são paradoxos, como a judicialização da saúde no Brasil. É impossível o Judiciário resolver esse problema se não houver um trabalho conjunto, porque envolve orçamento, estrutura, e outros fatores que só o direito não consegue solucionar”.

Os dois defenderam novos espaços de diálogos, maior conhecimento técnico, soluções consensuais e auto-regulação regulada como formas de ajudar o Judiciário a enfrentar a judicialização da saúde pública.

Ações do Conselho Nacional de Saúde
O presidente do Conselho Nacional de Saúde Fernando Zasso Pigatto também participou da palestra e falou sobre as ações adotadas pelo órgão desde o início da epidemia, como a criação de comitês, boletins semanais, reuniões e debates com autoridades e especialistas e a produção de documentos para auxiliar os órgãos públicos.

Com relação à judicialização da saúde, Pigatto afirmou que o Brasil tem um histórico de desigualdades que produz iniquidades. “A judicialização vem sendo muito utilizada pela população porque há muitos fossos de acesso nos diferentes ‘brasis’”, disse.