Ação anulatória

TRF-4 decide que marca 'Cachorro Quente do Rosário' fica com filho do pioneiro

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27 de julho de 2020, 9h04

O artigo 174 da Lei de Propriedade Industrial (LPI) diz que prescreve em cinco anos a ação para declarar a nulidade do registro marcário, contados da data da sua concessão. A não ser que este tenha sido obtido de má-fé, situação em que não haverá prazo determinado.

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Com a prevalência deste entendimento, assentado no Superior Tribunal de Justiça, a 2ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região manteve o registro da marca "Cachorro Quente do Rosário", a mais famosa do mercado de lanches populares no Rio Grande do Sul, com o filho do fundador do negócio. O filho, réu na ação, conseguiu o registro em 2005, e o pai só foi à Justiça reivindicar os seus direitos em 2012.

Disputa familiar
A disputa pela marca foi judicializada depois que o criador da "carrocinha" de lanches, Osmar Ferreira Labres, se desentendeu com o seu filho de criação, Eli Monteiro da Rosa, que, estando à frente dos negócios, providenciou o registro marcário em seu nome à revelia da vontade do pai.

Como consequência do reconhecimento da prescrição da ação anulatória, a Corte reformou a sentença que havia determinado o repasse da marca ao pai, o empreendedor pioneiro, mas sem registro, e o pagamento de danos morais e materiais arbitrados no montante de R$ 3 milhões. Este valor deveria ser pago pelo filho e sua microempresa em março de 2016 — data da sentença.

Para a maioria dos desembargadores, ficou claro que a designação "Cachorro Quente do Rosário" não era o nome comercial (ou empresarial) da firma individual do empreendedor pioneiro e autor da ação, já que este é o próprio nome do seu titular. A "carrocinha", aliás, não ostentava qualquer placa de identificação do negócio e só ficou conhecida por ser a única barraquinha de venda de cachorro-quente estacionada há décadas na frente do tradicional Colégio Marista Rosário.

"Nem seria exagero dizer que, se má-fé houve, ela é imputável exclusivamente ao autor, o qual, podendo ter pedido o registro da marca Cachorro Quente do Rosário ao INPI, desde os anos 1960, só veio a reivindicá-la neste século, por meio da presente demanda, precisamente após saber que o réu estava prosperando em seus negócios", resumiu no voto o relator da apelação, desembargador Rômulo Pizzolatti.

Atuou na defesa do réu Eli Monteiro da Rosa, o advogado Fabiano de Bem da Rocha, sócio da banca Leão Propriedade Intelectual.

Ação anulatória
Osmar Ferreira Labres (e microempresa) ajuizou ação anulatória — cumulada com danos materiais e morais — em face do filho adotivo Eli Monteiro da Rosa (e microempresa) e Instituto Nacional de Propriedade Industrial (INPI), pleiteando a declaração de nulidade do registro da marca "Cachorro Quente do Rosário", cuja "carrocinha" atende desde 1966 ao lado do colégio marista, em Porto Alegre.

Segundo os autos, em 1996, por problemas de saúde, o autor delegou a administração da "carrocinha" a Eli. Na época, o pequeno comércio vendia cerca de 2,5 mil lanches por dia. Percebendo a alta lucratividade do negócio e no comando do negócio, Eli requereu o registro da marca junto ao INPI em 1999, para utilizá-las em lojas franqueadas que abriu em nome de filhos, esposa e outros familiares. Em 2005, o registro foi concedido.

A retornar às suas atividades na "carrocinha" estacionada junto ao Colégio Rosário, o autor afirmou na inicial que se surpreendeu com a mudança, sendo obrigado a adotar o nome comercial "Cachorro Quente do R". E não só: teve de assumir uma dívida no valor de R$ 100 mil, deixada pelo filho adotivo.

Na inicial, o autor sustentou que é titular do nome comercial "Cachorro Quente do Rosário", em razão do uso prolongado no tempo, a despeito de não ter registro formal no Inpi. Alegou que o nome comercial é protegido pelo artigo 8º da Convenção de Paris, convalidada pelo Decreto 75.275, de 1975. Acrescentou que o registro da marca "Cachorro Quente do Rosário" pelo réu Eli foi obtido em flagrante ofensa ao inciso XIX do artigo 124 da Lei 9.279 (LPI), de 1996. Disse que a posse prolongada deste nome comercial constitui meio de aquisição da marca, a qual, por isso mesmo, lhe foi indevidamente usurpada.

Sentença de parcial procedência
A 3ª Vara Federal de Porto Alegre julgou parcialmente procedente a ação anulatória-indenizatória, por entender que o réu se apropriou indevidamente de um nome comercial preexistente, o que é expressamente vedado pela Lei da Propriedade Industrial (LPI) no artigo 124, caput e inciso V.

Para a juíza federal Maria Isabel Pezzi Klein, a prática de ato ilícito coloca aquele que sofreu o dano em posição de recuperar, da forma mais completa possível, a satisfação dos direitos respectivos, tanto os de natureza patrimonial como os de valor moral. É o que prevê o artigo 927, caput, do Código Civil e a Súmula 37 do Superior Tribunal de Justiça – "São cumuláveis as indenizações por dano material e dano moral oriundos do mesmo fato."

No dispositivo da sentença, a juíza determinou o cancelamento dos registros da marca em nome de Eli e de sua empresa, condenado o Inpi a averbar a denominação marcária em favor de Osmar e sua empresa. Por consequência, reconheceu o direito dos autores à indenização, condenando Eli a e sua empresa a pagarem R$ 1,5 milhão a título de danos materiais e R$ 1,5 milhão pelos danos morais.

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50669521020134047100/RS

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