Opinião

A recontratação de ex-empregados é mais do que possível, é recomendável

Autor

  • Renato Melquíades de Araújo

    é advogado mestre em Direito pela Universidade Federal de Pernambuco mestre em Relações Industriais e Empregatícias pela Università di Torino e especialista em Direito e Processo do Trabalho pelo Mackenzie-SP.

22 de julho de 2020, 10h36

No dia 16 de junho, a imprensa noticiou que o governo pretendia alterar a Portaria nº 384, de 1992, que considera fraudulenta a rescisão seguida de recontratação, quando ocorrida dentro do prazo de 90 dias subsequentes ao desligamento.

Findou-se que, no dia 14 de julho, foi publicada a Portaria nº 16.655, que afirma logo em seu artigo 1º que "durante o estado de calamidade pública" da pandemia do coronavírus "não se presumirá fraudulenta a rescisão de contrato de trabalho sem justa causa seguida de recontratação dentro dos noventa dias subsequentes".

Em que pese ter sido louvável a atenção do governo à "necessidade de afastar a presunção de fraude na recontratação", a verdade é que tanto a Portaria nº 384/92 quanto a Portaria nº 16.655/20 são ilegais, pois criam, cada uma ao seu modo, um tipo de presunção que contraria texto expresso de lei e deforma o princípio da presunção de boa-fé, que alicerça as relações privadas no Brasil.

Sem dúvidas que se a prestação dos serviços foi mantida e o desligamento tiver sido realizado apenas para o recebimento indevido do FGTS ou do seguro-desemprego, trata-se de procedimento fraudulento que, além de nulo, expõe os seus autores às penas da lei.

Todavia, se a relação de trabalho foi efetivamente extinta e o empregador realizou o pagamento dos valores cabíveis, eventual recontratação é válida e não pode ser considerada uma fraude, exceto se houver provas nesse sentido. Esse é o entendimento atual do Tribunal Superior do Trabalho, que realizou, inclusive, o cancelamento da sua antiga Súmula nº 20, que dispunha em sentido contrário.

A posição do TST está amparada na legislação do trabalho. A própria CLT prevê em seu artigo 133, inciso I, uma hipótese de recontratação em prazo inferior a 60 dias, na qual o empregado recontratado não perde o direito às férias. Assim, não poderia uma portaria, que tem caráter meramente regulamentar, alterar o disposto na lei federal, que se trata de um tipo normativo de hierarquia superior e impõe limites ao regulamento.

É importante observar, contudo, alguns cuidados na relação de emprego a ser restabelecida, como a impossibilidade de fixação de um período de experiência no contrato e a necessidade de manutenção de salários e benefícios, quando o novo vínculo é para a mesma função, com o desempenho das mesmas atividades.

Além disso, é preciso comunicar a readmissão ao Ministério da Economia, para interrupção do seguro-desemprego, sendo que eventual ocultação do novo vínculo para a manutenção do benefício pode ser considerada como crime de estelionato.

Sendo assim, feita de modo idôneo, como consequência de um interesse mútuo na retomada da relação interrompida pelos efeitos danosos da pandemia, a recontratação de ex-empregados recentemente demitidos não é só possível como altamente recomendável.

Trata-se de trabalhador que já goza da confiança do empregador, possui vivência na atividade e conhece a cultura da empresa. Portanto, em tempos de Covid-19, quando as empresas estão avaliando com muita cautela os gastos e investimentos a serem realizados, apostar na recontratação de um ex-empregado é aumentar as chances de sucesso do novo vínculo.

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