Desmilitarização de combate à Covid em terras indígenas é impossível, diz Barroso
22 de julho de 2020, 18h48
A primeira reunião virtual entre governo e representantes indígenas para traçar plano de contenção da epidemia não deu certo. Houve problemas tecnológicos, além de estranhamento entre os representantes das partes e militares. Relator do processo que tramita sobre o tema no Supremo Tribunal Federal, o ministro Luís Roberto Barroso determinou que as partes tenham um "novo começo" na relação intercultural.
A decisão foi dada no âmbito de arguição de descumprimento de preceito fundamental, após pedido da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib). A instauração de uma "Sala de Situação" virtual que conecte governo e índios foi feita a mando do ministro Barroso. A primeira reunião aconteceu na última sexta-feira (17/11).
No novo pedido cautelar, a entidade diz que houve dificuldades técnicas de vídeo e áudio, número excessivo de presentes e metodologia inadequada. Além disso, foram ofendidos por declarações de algumas autoridades. Segundo a revista Veja, o entrevero se deu com o ministro do Gabinete de Segurança Institucional da Presidência (GSI), general Augusto Heleno.
Responsável por coordenar os trabalhos, o militar da reserva afirmou que a questão indígena deveria ter sido resolvida há 50 anos no Brasil e que os povos encontrados fora de terras demarcadas serão tratados como produtores rurais e orientados a buscar o atendimento no SUS, como qualquer cidadão, segundo a publicação.
"As medidas cautelares determinadas nesses autos são uma experiência pioneira de diálogo institucional (entre o Judiciário e o Executivo) e de diálogo intercultural (entre a nossa cultura e as tradições indígenas). É natural que haja posições e visões diferentes. Mas há um objetivo comum: salvar vidas e preservar etnias. Esse objetivo deve estar acima de divergências e descontentamentos", afirmou o ministro Barroso, na decisão desta quarta.
"Como foi impossível a comunicação adequada entre os participantes, o melhor caminho será o de termos um novo começo, sem reavivar mal-entendidos que dificultem uma solução de compromisso e construtiva, que, de resto, é urgente", complementou.
O ministro ainda esclareceu, em relação ao pedido da entidade que representa os indígenas, que não há solução possível para as medidas pretendidas sem a participação das Forças Armadas e de ministérios dos quais dependem as diversas providências a serem adotadas.
"Não se trata aqui de legitimar a militarização de soluções. Trata-se de um dado da realidade: as informações já disponibilizadas a este Juízo dão conta de que as Forças Armadas são imprescindíveis para a criação de barreiras sanitárias, para o transporte de equipes de saúde para áreas remotas, para o interior de florestas e por meio de rios, e para a contenção de invasões, que podem inclusive ensejar conflitos violentos", disse.
"Não se pode pretender formular uma política pública, dispor de recursos materiais e de pessoal, sem ouvir atores essenciais para o sucesso do plano e de sua execução", explicou.
Observador e sistema correto
Ao conceder a liminar, o relator determina que as reuniões subsequentes serão acompanhadas por um representante de seu gabinete, bem como por Maria Thereza Uille Gomes, membro do Conselho Nacional de Justiça. A metodologia de trabalho deverá ser definida, por meio de diálogo, entre os próprios participantes.
Além disso, a União deverá utilizar plataforma de reunião virtual que possibilite a plena comunicação e participação de todos os envolvidos, inclusive e especialmente dos representantes dos povos indígenas.
Além da criação da Sala de Reunião, o relator determinou que o governo federal adote providências para evitar o contágio pelo coronavírus entre indígenas em duas frentes: para os povos indígenas em isolamento e de contato recente, e para os indígenas em geral.
A ação foi ajuizada pela Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib) em conjunto com seis partidos políticos. Eles alegam que os povos se encontram sujeitos a diversas vulnerabilidades em decorrência das falhas e omissões do Poder Público no combate à epidemia.
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ADPF 709
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