Reflexões Trabalhistas

Necessidade de novas políticas voltadas para o bem-estar social de todos

Autor

  • Raimundo Simão de Melo

    é consultor Jurídico advogado procurador regional do Trabalho aposentado doutor em Direito das Relações Sociais pela PUC/SP professor titular do Centro Universitário do Distrito Federal-UDF/mestrado em Direito das Relações Sociais e Trabalhistas membro da Academia Brasileira de Direito do Trabalho e autor de livros jurídicos.

10 de julho de 2020, 8h01

A crise da pandemia do novo coronavírus certamente deixará lições para todos os seres humanos que habitam o planeta terra. Depois dela o mundo não será mais o mesmo. O mundo do trabalho também não será mais o mesmo. Passada essa grave crise, com muitas mortes, aumento do desemprego, da pobreza e de exclusões sociais, espera-se que o mundo volte suas políticas mais para o ser humano. Como já estão dizendo líderes globais, o mundo deverá colocar no centro das atenções o "arrependimento" pelos desacertos sociais ao longo dos anos, uma vez que, se não tivessem demasiadamente desprezado as questões sociais, as consequências de referia crise seriam menores. Como está sendo visto e confirmado mundo afora, quem tem melhores condições financeiras, casa pra morar e comida se protege mais do novo coronavírus e da Covid-19 e, portanto, sofre menos suas consequências.

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O isolamento social tem sido a maior recomendação contra o novo coronavírus, como vêm recomendando a Organização Mundial da Saúde (OMS) e os cientistas. Depois de constatarem os grandes estragos humanos decorrentes da pandemia do novo coronavírus, governantes globais passaram a reconhecer, como que fazendo mea-culpa, que o maior valor global não é apenas a economia.

Será preciso mesmo um novo olhar para o Estado de bem-estar social (ou Estado-providência), um Estado social como forma de organização política, econômica e sócio-cultural, colocando o Estado como agente da promoção social e organizador da economia. Será necessário pensar numa nova economia voltada para o bem-estar social de todos e não apenas para enriquecer uns poucos, como é o que ocorre na atualidade. Entre outros líderes mundiais, antecipou nesse sentido o presidente Macron, da França, chamando a atenção dos seus colegas, dizendo que é preciso aumentar a capacidade de consumo como fator preventivo ao enfrentamento do coronavírus, porque ele ataca os mais fracos, desnutridos e velhos e que os olhos dos governantes devem se voltar para o social, em primeiro lugar.

Essas providências são urgentes. A crise do novo coronavírus está escancarando que grande parte do povo não tem como fazer quarentena, porque nem onde morar adequadamente tem. Não tem saneamento básico, não tem o que comer. É só ver a situação dos povos das comunidades nas grandes cidades, com famílias de grande número de pessoas morando em pequeníssimos casebres, sem a menor infraestrutura, sem água e sem sabão sequer para fazerem as recomendadas higienizações. "Durante a crise de covid-19, cuja higienização é uma das principais recomendações dos órgãos de saúde, um estudo do Instituto Trata Brasil aponta que 35 milhões de brasileiros não têm acesso à água tratada, além de 100 milhões viverem sem a coleta de esgoto".

Nesse contexto cabe lembrar e ponderar a relação que existe entre pobreza e trabalho, principalmente os trabalhos precarizados e informais, que vêm avançando mundo afora (no Brasil é uma realidade incontestável), que degradam as condições humanas. É preciso que todos reflitam sobre a noção de pobreza como elemento que se articula e reclama por políticas de assistência social dentro da noção de trabalho como elemento fundante da sociabilidade contemporânea e da dignificação da pessoa humana. É o que preconiza a Constituição no artigo 170, quando, ao estruturar a ordem econômica, funda-a na valorização do trabalho humano, na livre iniciativa e no pleno emprego. É claro que isso somente será possível quando se entender que as riquezas mundiais devem ser mais bem redistribuídas entre os povos da terra.

Se todos aprenderem um pouco com essa crise e passarem a entender que o ser humano está acima de tudo e que políticas sociais são os melhores investimentos para os Estados e para o próprio capital, talvez o mundo possa melhorar e o capital global mude suas feições mais perversas, especialmente no tocante à grande acumulação de riquezas nas mãos de uns poucos.

É uma questão de opção: ou se prioriza soluções para as questões sociais, incluindo formalização e melhores condições de trabalho e impedindo que poucos fiquem com as riquezas geradas pelo trabalho humano ou o mundo terá maiores dificuldades para suportar a possível próxima crise provocada por qualquer outro novo coronavírus.

Autores

  • é doutor e mestre em Direito das Relações Sociais pela PUC-SP. Professor Titular do Centro Universitário — UDF, no mestrado em Direito das Relações Sociais e Trabalhistas e na Faculdade de Direito de São Bernardo do Campo (SP), na Pós-Graduação em Direito e Relações do Trabalho. Consultor Jurídico e Advogado. Procurador Regional do Trabalho aposentado. Membro da Academia Brasileira de Direito do Trabalho.

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