Primeira infância

Projeto em prol da paternidade ajuda a prevenir violência de gênero

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5 de julho de 2020, 8h40

Desde que entrou na maternidade para ter seu primeiro filho, a estudante Giovanna Letícia, de 17 anos, contou com a presença do pai da criança ao seu lado. Na Maternidade Carmela Dutra, no Rio de Janeiro, pai não é considerado acompanhante, mas responsável pelo bebê que vai nascer, assim como a mãe. O estabelecimento é uma das instituições públicas que aplicam a metodologia do Programa P, projeto vencedor, na categoria Sociedade Civil, da premiação de boas práticas em prol da primeira infância, coordenada pelo Conselho Nacional de Justiça.

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IstockphotoPrograma criado pela ONG Promundo conquistou um prêmio do CNJ

Idealizado pela ONG Promundo, o Programa P é um manual criado com o objetivo de abrir o diálogo com os pais sobre suas preocupações, dúvidas e necessidades e incentivar comportamentos mais positivos desses homens dentro de suas famílias e nas suas comunidades. Pelos resultados apresentados e a possibilidade de replicação, o Programa P recebeu, em dezembro de 2019, o prêmio de R$ 20 mil, além de troféu e certificado oferecidos pelo CNJ, e passa, agora, para a fase de divulgação e replicação da prática.

Por meio de oficinas e cursos, o manual trabalha o despertar do vínculo afetivo entre pai e filho e, de quebra, contribui para promover equidade de gênero e prevenir a violência contra mulheres e crianças. O manual pode ser trabalhado em empresas, escolas, comunidades, instituições públicas ou privadas, de saúde, de educação, de assistência social ou de Justiça, onde houver homens ou mulheres, jovens ou adultos.

Atualmente, o programa está sendo aplicado, no Rio de Janeiro, em rodas de conversas com jovens e adultos de comunidades carentes e na Maternidade Carmela Dutra, entidade 100% financiada pelo SUS. Lá, o pai é estimulado a estar presente desde o pré-natal até o parto e, mesmo após o parto, pode acompanhar a mãe de seu filho e o bebê o tempo que for preciso. Até mesmo na UTI neonatal os homens são bem aceitos. 

"Mulheres que têm parceiros envolvidos no cuidado do bebê desenvolvem menos doenças, sentem-se menos exaustas e agem de maneira menos violenta com os filhos", diz o especialista em Políticas Públicas para a Infância pelo Núcleo Latino-Americano da Universidade de Harvard, Luciano Ramos. Ele é o consultor de Programas do Instituto Promundo.

Segundo o especialista, as crianças que vivem em ambiente com mais amorosidade e apoio paterno tendem a ser mais seguras, mais felizes e mais protegidas da violência. Os homens envolvidos na paternidade também se beneficiam: apresentam melhoras na saúde e são menos envolvidos em episódios de violência doméstica baseada em gênero.

O Programa P está sendo adaptado, em fase piloto, para vários países, como África do Sul, Ruanda e Indonésia. Na Índia, os facilitadores utilizam as atividades para combater o casamento infantil.

Papel de todos
Até se tornarem "parceiros do pai", enfermeiros, médicos e funcionários da Maternidade Carmela Dutra precisaram mudar suas concepções para aceitar a presença dos homens em todas as áreas. Foram várias ações para sensibilizá-los — desde fotos de pais amorosos expostas em diversos locais do hospital e discussão do tema paternidade na Semana de Enfermagem até pequenas rodas de conversa com todos os grupos profissionais do hospital. Tudo com o objetivo de refletir sobre como contribuir para estabelecer o vínculo sentimental do pai com seu filho.

"Para funcionar, toda a rede de profissionais (enfermeiros, técnicos em enfermagem, seguranças, recepcionistas, médicos) da maternidade teve de ser capacitada", lembra Márcio Ferreira, assessor da Superintendência de Hospitais Pediátricos e Maternidade (SHPM) e um dos implementadores do Programa P na Maternidade Carmela Dutra, onde trabalhou por 18 anos.

"Quando os profissionais de saúde se dirigem às mulheres e deixam o homem de lado, ou mesmo, nas consultas médicas, deixamos o homem em pé ao lado da mulher, estamos empurrando o pai pra fora do círculo familiar e reforçando que a única responsável por aquela situação é a mulher. Isso não é justo com nenhum dos dois, aliás, dos três. O homem precisa ser inserido. Nosso trabalho é reforçar esse vínculo a fim de obtermos mais comprometimento e menos abandono", complementa Márcio.

Primeira infância
O compartilhamento de boas práticas contribui para o cumprimento do Marco Legal da Primeira Infância (Lei 13.257/2016) e para a promoção da garantia dos direitos e atenção às crianças. O prêmio é um dos desdobramentos do Projeto "Justiça começa na Infância: Fortalecendo a atuação do Sistema de Justiça na promoção de direitos para o desenvolvimento humano integral", coordenado pelo CNJ e financiado pelo Fundo de Defesa dos Direitos Difusos (FDD) do Ministério da Justiça e Segurança Pública (MJSP). Com informações da assessoria de imprensa do CNJ.

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