É urgente aprovação do projeto que busca criar o tipo penal da pirâmide financeira
5 de julho de 2020, 13h12
Equiparados a uma grande nuvem de gafanhotos, os esquemas de pirâmides financeiras e Ponzi não param de crescer no Brasil. De todas as fraudes identificadas no país, 55% são esquemas dessa natureza, que já lesaram 11% da população brasileira. A CVM (Comissão de Valores Mobiliários) recebeu dez vezes mais reclamações no ano de 2019 do que nos últimos sete anos. Com o advento da internet, e principalmente com a popularidade das criptomoedas, os golpistas encontraram um solo fértil para fisgar vítimas desavisadas.
Em esquemas dessa natureza, existe sempre uma figura central, um grande líder, uma figura que muitas vezes é tratada com devoção messiânica. Muitas vezes a tiracolo tem um ou mais comparsas associados, que são tratados como deuses ante a devoção dos incautos.
Essa devoção tem tempo determinado no roteiro desses crimes. Isso porque em determinado momento os saques são suspensos e a devoção vira uma mescla de sentimentos que beiram o desespero, o ódio e, em algumas vítimas, a subserviência, pois se colocam em uma posição de vassalo desses criminosos, com objetivo de serem os primeiros a receber em uma eventual devolução do dinheiro para os investidores.
Nesse momento é possível qualificar os atores da organização, em que pese seja difícil identificar se a figura central é o denominado Faraó, que são milionários que atuam internacionalmente plantando pirâmides nos países, ou se são sócios-laranjas, que são pessoas que residem no país alvo e investem para ter um retorno percentual com o sucesso do golpe.
Atrelados ao esquema criminoso, surgem figuras que se utilizam da sua capacidade de liderança para atrair novos investidores, fazendo fortunas com isso, geralmente ostentando o resultado dos golpes em suas redes sociais, despertando o interesse de novas vítimas.
No que tange aos investidores, os mesmos são divididos em duas categorias. Primeiro, aqueles que acompanham os líderes com a ciência de que o esquema é fraudulento, mas se arriscam para fazer fortuna rapidamente dentro do golpe, que podemos denominar como participantes conscientes. O segundo grupo, que é a grande maioria de investidores, é formado por pessoas que não fizeram uma pesquisa prévia, que deduzem ter encontrado a fórmula para ficar rico, que denominamos de vítimas de primeira viagem.
Ante essa divisão de papéis e nível de consciência, convém conceituar o que é organização criminosa, conforme previsto no artigo 1º, §1º, da seguinte forma: a Lei 12.850 de 2013 considera organização criminosa a associação de quatro ou mais pessoas estruturalmente ordenada e caracterizada pela divisão de tarefas, ainda que informalmente, com objetivo de obter, direta ou indiretamente, vantagem de qualquer natureza, mediante a prática de infrações penais cujas penas máximas sejam superiores a quatro anos, ou que sejam de caráter transnacional.
Resta claro que o mesmo tem alguns destaques que são essenciais para a caracterização do delito, quais sejam, a composição de quatro ou mais pessoas, de forma estruturada, com divisão de tarefas, obtendo vantagem de qualquer natureza com a prática de infrações com penas máximas superiores a quatro anos ou de caráter transnacional.
Ante toda a descrição dos atores na estrutura dos esquemas pirâmide e Ponzi, é cristalino destacar que, tanto o descrito como Faraó como seus comparsas, sócios e líderes se enquadram perfeitamente no descrito tipo legal. No que tange às vítimas, os participantes conscientes não se enquadram, pois assumiram o risco da própria torpeza, e não podem figurar na mesma categoria daqueles que denominamos de vítimas de primeira viagem.
Na questão relacionada à pena máxima superior a quatro anos para configurar a organização criminosa, faz-se necessário separar o joio do trigo, pois crimes dessa natureza podem tanto ser enquadrados como estelionato ou como o crime previsto no artigo 2º da Lei dos Crimes contra a Economia Popular. No estelionato, que tem pena que permite o enquadramento no tipo da organização criminosa, a vontade do autor é dirigida a uma pessoa determinada. Já no crime contra a economia popular, o delito dirige-se a uma universalidade de sujeitos indeterminados e sua pena é inferior para a configuração.
Essa identificação das vítimas e das suas histórias para que se alcance o numero determinado de pessoas que se faz necessário para assim realmente configurar o organização criminosa, e não apenas um mero concurso de pessoas atrelado a um crime de baixo potencial ofensivo. Para tanto trazer para colação o que elenca a lei que combate as organizações criminosas em seu artigo 2º: "Artigo 2º — Promover, constituir, financiar ou integrar, pessoalmente ou por interposta pessoa, organização criminosa: Pena — reclusão, de 3 (três) a 8 (oito) anos, e multa, sem prejuízo das penas correspondentes às demais infrações penais praticadas".
Além de enquadrar esses criminosos na presente lei, faz-se urgente a aprovação do Projeto de Lei 4.233/2019, de autoria do senador Flávio Arns (REDE/PR), que busca criar o tipo penal da pirâmide financeira, endurecendo a pena para quem for condenado nesse esquema fraudulento. Somente com o fim desse sentimento de impunidade, bem como o perdimento de bens e valores adquiridos com o proveito do crime, é que efetivamente serão combatidos esses esquemas fraudulentos que devassam as economias de milhões de brasileiros.
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