O direito de pleitear a restituição de descontos indevidos feitos por plano de previdência complementar prescreve em dez anos, conforme artigo 205 do Código Civil. Isso porque a existência da relação contratual entre o beneficiário e a entidade faz com que haja causa jurídica para o indébito.
Com esse entendimento, a 3ª Turma do Superior Tribunal de Justiça deu provimento a recurso especial para afastar a prescrição e permitir a restituição dos valores descontados indevidamente nos dez anos anteriores ao ajuizamento da ação. O acórdão muda a jurisprudência do colegiado.
A ação foi impetrada por funcionários da Companhia de Transmissão de Energia Elétrica Paulista (CTEEP), que integrava a administração indireta do Estado de São Paulo. Por isso, tinham direito aos mesmos benefícios previdenciários dos funcionários públicos, de acordo com a Lei paulista 4.819/1958.
Mesmo assim, pagavam valores extras à Fundação Cesp, entidade de previdência complementar, para manter os benefícios adicionais do chamado Plano A, ao qual aderiram. Esse plano de previdência foi depois convertido no Plano 4.819, que não oferece qualquer benefício além dos estritamente previstos na Lei 4.819/1958.
Apesar disso, a Fundação Cesp não parou de descontar valores, nem devolveu os que já haviam sido pagos. Foi essa devolução que os autores pleitearam no processo, referente aos 20 anos anteriores à data da propositura da ação. O pedido foi concedido em primeiro grau, mas reformado em segundo.
O Tribunal de Justiça de São Paulo seguiu a jurisprudência do STJ ao decidir e aplicou o prazo prescricional de três anos, conforme o artigo 206, parágrafo 3º, incisvo IV do Código Civil. Ao analisar o caso, o relator, ministro Paulo de Tarso Sanseverino, mudou a jurisprudência, aplicando o prazo de dez anos, conforme o artigo 205 do Código Civil.
Novo precedente
Para isso, o relator tomou como base acórdão da Corte Especial de fevereiro de 2019 em que, por maioria, o colegiado entendeu que prazo trienal para cobrança de indébito somente seria cabível quando não houver "causa jurídica" para o indébito.
O precedente diz respeito a restituição de cobrança indevida de serviço de telefonia, em que a "causa jurídica" é o próprio contrato entre as partes — o consumidor e a companhia de telefonia. O caso dos autos é semelhante porque, durante um contrato — o do plano de benefícios — houve a cobrança indevida de contribuições, cuja restituição agora se pleiteia.
"Aplicando-se, então, as razões de decidir do referido precedente da Corte Especial ao cenário fático dos autos, a conclusão que se impõe é também no sentido da incidência da prescrição decenal, pois o enriquecimento da entidade de previdência tinha uma causa jurídica, que era a prévia relação contratual com os participantes do referido 'Plano 4.819', não sendo hipótese, portanto, de enriquecimento sem causa, que conduziria à prescrição trienal", concluiu o ministro Paulo de Tarso Sanseverino.
Voto vencido
Ficou vencido o ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, para quem a "causa jurídica" não existe no caso concreto pelo simples fato de que o desconto foi considerado ilegal tanto pelo juiz de primeiro grau quanto pelo TJ-SP.
"Ao que tudo indica, a despeito da adesão do participante ao denominado 'Plano A', nunca houve, por força de disposição contratual, causa jurídica que legitimasse a cobrança da contribuição", apontou o ministro.
Se a pretensão de ressarcimento é fundada na ausência de causa jurídica para a cobrança das contribuições, ainda que "como simples pano de fundo existe uma relação contratual entre as partes (termo de adesão)", entendeu ser aplicável o prazo trienal do artigo 206, parágrafo 3º, inciso IV do Código Civil.
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REsp 1.803.627