Opinião

A inconstitucionalidade da Lei 13.606/2018 e do Parecer 33/2018

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25 de dezembro de 2020, 14h20

A Lei 13.606/2018 e a Portaria PGFN 33/2018 regulamentaram o artigo 20-B, parágrafo 3º, inciso III, da Lei 10.522/2002, instaurando o instituto da averbação pré-executória, que estabelece hipóteses em que os agentes fazendários possam tornar indisponíveis os bens imóveis dos contribuintes por meio da averbação de certidão em dívida ativa em órgãos de registros de bens e direitos.

Portanto, com o advento da referida norma, criou-se um meio absolutamente temeroso aos contribuintes uma vez que ficaram estabelecidos mecanismos e formas de comando que possibilitam o fisco a proceder com uma espécie de execução fiscal administrativa, porém, totalmente arbitrária possuindo, inclusive, as mesmas atribuições do Poder Judiciário.

Esse dispositivo foi considerado inconstitucional e ilegal pela maioria dos ministros do Supremo Tribunal Federal, uma vez que este instituto atesta vantagens e privilégios ao ente fazendário, pois fortalece a discricionariedade administrativa e contempla vários transtornos legais e jurídicos para o contribuinte.

É de suma importância destacarmos que, referida norma, além de inconstitucional por cercear direitos e garantias constitucionais, conferia ao fisco a autonomia de tornar bens imóveis dos contribuintes indisponíveis. Também, há de se notar que tal lei peca na inconstitucionalidade de sua formação, já que este assunto deve ser reservado ao conteúdo de lei complementar, mas foi criado através de lei ordinária.

Posto isto, é possível notarmos que há uma afronta direta ao princípio constitucional da segurança jurídica, vez que, outrora, os agentes fazendários fiscais achavam-se completamente amparados do poder e da capacidade de tornar os bens dos contribuintes indisponíveis, antes mesmo que estes tivessem a oportunidade de se manifestar, ofendendo, portanto, o princípio do direito ao contraditório e à ampla defesa, bem como o princípio do devido processo legal.

Inclusive, há de se destacar que, com a introdução desses dispositivos, legitimou-se a plena interferência do fisco em um domínio que deveria ser objeto de análise apenas e exclusivamente do Poder Judiciário (tutela jurisdicional).

Antes da Lei 13.606/2018 e da Portaria PGFN 33/2018, a única autoridade que tinha poderes e legitimidade para proceder com a averbação de indisponibilidade de um bem era um juiz de Direito, respeitando, por óbvio, todos os princípios constitucionais já mencionados.

Desta forma, antes de se proceder com o bloqueio de bens do contribuinte, o juiz deve sempre garantir todos os meios legais existentes para que, tanto o devedor quanto o credor, possam expor seus argumentos de defesa e acusação, juntando as provas que julguem necessárias para o livre convencimento do julgador e garantindo, desta forma, segurança às partes.

Esse assunto mostrou-se tão relevante em meio à comunidade jurídica por conta das consequências que este instituto poderia causar aos contribuintes, que foram ajuizadas diversas ações diretas de inconstitucionalidade no Supremo Tribunal Federal com metas bastante semelhantes — a suspensão da eficácia e a decretação da inconstitucionalidade dos efeitos do inciso II, parágrafo 3°, do artigo 20-B e do artigo 20-E da Lei 10.522/02.

Neste contexto, o Supremo Tribunal Federal começou a analisar o caso em junho deste ano — Ações Diretas de Inconstitucionalidade 5.881, 5.886, 5.890, 5.925, 5.931 e 5.932 —, através do plenário virtual, mas foi retirado de pauta por pedido do ministro Alexandre de Morais.

No entanto, devido às grandes repercussões e preocupações causadas à sociedade como um todo, o caso voltou a ser julgado no dia 3 de dezembro de 2020, sendo finalizado na última quinta-feira (9/12), ocasião em que restou firmado o entendimento de que a Fazenda Pública pode averbar, mas não pode decretar a indisponibilidade de bens sem decisão judicial ou direito ao contraditório sendo, portanto, definitivamente declarada a inconstitucionalidade de trecho Lei 13.606/2018.

Inclusive, há de se destacar que antes mesmo de ser retirado de pauta, o ministro Marco Aurélio já havia votado para determinar a inconstitucionalidade dos dispositivos. Para ele, a lei promoveu um desvirtuamento do sistema de cobrança da dívida ativa da União e está "em desarmonia com as balizas constitucionais no sentido de obstar ao máximo o exercício da autotutela pelo Estado".

Já para Luís Roberto Barroso, seu entendimento é o de que a averbação é legítima e prevista em lei, mas a indisponibilidade não pode ser automática e exige reserva de jurisdição. "A intervenção drástica sobre o direito de propriedade exige a atuação do Poder Judiciário."

É importante que se encontre um equilíbrio em relação aos interesses da Fazenda, visando a proteção do seu crédito tributário. No entanto, para que isso ocorra, não se pode admitir, em hipótese alguma, que a Constituição Federal e os princípios intrínsecos a ela sejam afrontados a fim de se garantir a satisfação de um crédito tributário.

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