Opinião

Diferença entre agravos e a possibilidade de interposição simultânea dos dois

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23 de dezembro de 2020, 7h51

Primeiramente, se faz necessário explicar no que consiste o recurso de agravo: o agravo é o recurso cabível para atacar decisões interlocutórias que, por sua vez, são deflagradas incidentalmente no curso da relação processual.

Atualmente, com o CPC 2015, editou-se o artigo 1.021, o qual formalizou o recurso de agravo interno, cuja previsão existia apenas nos regimentos internos dos tribunais.

Sendo assim, este cabe contra decisão proferida pelo relator, de forma monocrática, que na prática força o julgamento do recurso pelo colegiado, conforme dispõem o artigo 1.021 do CPC:

"Artigo 1.021 — Contra decisão proferida pelo relator caberá agravo interno para o respectivo órgão colegiado, observadas, quanto ao processamento, as regras do regimento interno do tribunal".

Porém, o seu cabimento não para no artigo 1.021, também caberá agravo interno da decisão que nega seguimento aos recursos especial e extraordinário interposto contra acórdão que esteja em conformidade com entendimento do Supremo Tribunal Federal ou do Superior Tribunal de Justiça, respectivamente, exarado no regime de julgamento de recursos repetitivos.

Cabe agravo interno da decisão que nega seguimento a recurso extraordinário que discuta questão constitucional à qual o Supremo Tribunal Federal não tenha reconhecido a existência de repercussão geral ou a recurso extraordinário interposto contra acórdão que esteja em conformidade com entendimento do Supremo Tribunal Federal exarado no regime de repercussão geral.

Temos também a decisão que sobrestar o recurso que versar sobre controvérsia de caráter repetitivo ainda não decidida pelo Supremo Tribunal Federal, ou pelo Superior Tribunal de Justiça, conforme se trate de matéria constitucional ou infraconstitucional

Conforme prevê o parágrafo 2 do artigo 1.030:

"Artigo 1.030 — Recebida a petição do recurso pela secretaria do tribunal, o recorrido será intimado para apresentar contrarrazões no prazo de 15 dias, findo o qual os autos serão conclusos ao presidente ou ao vice-presidente do tribunal recorrido, que deverá:
I. negar seguimento:
a) a recurso extraordinário que discuta questão constitucional à qual o Supremo Tribunal Federal não tenha reconhecido a existência de repercussão geral ou a recurso extraordinário interposto contra acórdão que esteja em conformidade com entendimento do Supremo Tribunal Federal exarado no regime de repercussão geral;
b) a recurso extraordinário ou a recurso especial interposto contra acórdão que esteja em conformidade com entendimento do Supremo Tribunal Federal ou do Superior Tribunal de Justiça, respectivamente, exarado no regime de julgamento de recursos repetitivos.
(…) III. sobrestar o recurso que versar sobre controvérsia de caráter repetitivo ainda não decidida pelo Supremo Tribunal Federal ou pelo Superior Tribunal de Justiça, conforme se trate de matéria constitucional ou infraconstitucional;
2º. Da decisão proferida com fundamento nos incisos I e III caberá agravo interno, nos termos do artigo 1.021".

Já o agravo previsto no artigo 1.042 do CPC tem lugar apenas no caso de inadmissão propriamente dita do recurso, ou seja, um mecanismo para forçar a subida do recurso objetivando a revisão pelo tribunal superior, com amparo no inciso V do artigo 1.030, consoante a regra estampada no parágrafo 1º do mesmo dispositivo, hipótese distinta da espécie. Vejamos:

"Artigo 1.042 — Cabe agravo contra decisão do presidente ou do vice-presidente do tribunal recorrido que inadmitir recurso extraordinário ou recurso especial, salvo quando fundada na aplicação de entendimento firmado em regime de repercussão geral ou em julgamento de recursos repetitivos".

E ainda cabe agravo, nos termos do artigo 1.042, da decisão de inadmissibilidade proferida com fundamento de o recurso ainda não tenha sido submetido ao regime de repercussão geral ou de julgamento de recursos repetitivos; o recurso que tenha sido selecionado como representativo da controvérsia; ou o tribunal recorrido tenha refutado o Juízo de retratação. Conforme preconiza o artigo 1.030 em seu parágrafo 1º, vejamos:

"Artigo 1.030 — Recebida a petição do recurso pela secretaria do tribunal, o recorrido será intimado para apresentar contrarrazões no prazo de 15 dias, findo o qual os autos serão conclusos ao presidente ou ao vice-presidente do tribunal recorrido, que deverá:
(…) V. realizar o juízo de admissibilidade e, se positivo, remeter o feito ao Supremo Tribunal Federal ou ao Superior Tribunal de Justiça, desde que:
a) o recurso ainda não tenha sido submetido ao regime de repercussão geral ou de julgamento de recursos repetitivos;
b) o recurso tenha sido selecionado como representativo da controvérsia; ou
c) o tribunal recorrido tenha refutado o juízo de retratação.
§ 1º. Da decisão de inadmissibilidade proferida com fundamento no inciso V caberá agravo ao tribunal superior, nos termos do artigo 1.042".

Diante da literalidade legal, os tribunais superiores têm reputado inviável eventual aplicação do princípio da fungibilidade.

Bem como, é autorizada a simples remessa do agravo do artigo 1.042 aos tribunais de superposição quando indevidamente manejado contra decisão fundada no artigo 1.030, I, do CPC. Afinal, não se trata de usurpação de competências superiores, senão exercício de competência própria do tribunal local.

Cabe destacar, que há outra exceção ao princípio da unirrecorribilidade, ao qual apenas víamos nos casos de interposição simultânea de REsp e RE, porém é possível hoje interpor agora e agravo interno de forma simultânea, tal entendimento se deu corroborado pelo enunciado 77 da I Jornada de Direito Processual Civil do Centro de Estudos Judiciários do Conselho da Justiça Federal:

"Enunciado 77 — Para impugnar decisão que obsta trânsito a recurso excepcional e que contenha simultaneamente fundamento relacionado à sistemática dos recursos repetitivos ou da repercussão geral (artigo 1.030, I, do CPC) e fundamento relacionado à análise dos pressupostos de admissibilidade recursais (artigo 1.030, V, do CPC), a parte sucumbente deve interpor, simultaneamente, agravo interno (artigo 1.021 do CPC) caso queira impugnar a parte relativa aos recursos repetitivos ou repercussão geral e agravo em recurso especial/extraordinário (artigo 1.042 do CPC) caso queira impugnar a parte relativa aos fundamentos de inadmissão por ausência dos pressupostos recursais".

O Enunciado 77 traz a seguinte questão: o que fazer se a decisão de inadmissibilidade do recurso for pautada em dois fundamentos distintos? Por exemplo, se a decisão de não admissão vier nos seguintes termos: "Nego seguimento ao recurso especial, no tocante ao tema "a", por ser contrário ao entendimento pacificado pelo STJ em sede de recurso repetitivo; bem como nego seguimento em relação ao tema "b" por esbarrar na necessidade de revolvimento de fatos e provas, nos termos da súmula 7 do STJ".

Em face da decisão usada como exemplo acima serão cabíveis, simultaneamente: a) agravo interno para o próprio tribunal local (quanto ao capítulo da decisão que aplicar o repetitivo ou repercussão geral); e b) agravo em recurso especial para o STJ (quanto ao capítulo da decisão que entender pela aplicação da Súmula 7).

Isso ocorre porque, embora seja uma única decisão, ela possui dois fundamentos diferentes e a competência legal para análise da correção ou não daquela decisão pertence a órgãos diversos, conforme expressamente previsto na legislação processual.

Sendo assim, a interposição apenas de um agravo, seja o interno, seja o agravo em REsp ou RE direcionado ao STJ/STF, pode vir a acarretar o não conhecimento do recurso interposto. Isso quando a decisão de inadmissão se referir ao mesmo ponto do recurso, mas com base nos dois fundamentos: ou seja, a não admissão se dá, ao mesmo tempo, tanto pela aplicação do repetitivo como pela aplicação da admissibilidade usual. Assim, nesse caso, haverá necessidade de interposição de ambos os recursos, uma vez que a decisão agravada será capaz de se manter sólida pelo fundamento não atacado.

Tal entendimento não consta do Enunciado 77/CJF. Contudo, é possível chegar a essa conclusão por analogia ao entendimento sedimentado pela súmula 126 do STJ:

"É inadmissível recurso especial, quando o acórdão recorrido assenta em fundamentos constitucional e infraconstitucional, qualquer deles suficiente, por si só, para mantê-lo, e a parte vencida não manifesta recurso extraordinário."

Conforme o Enunciado 77, é possível a interposição de apenas um dos agravos quando, os dois fundamentos se referirem a teses recursais distintas e o agravante tiver interesse em impugnar um único fundamento da decisão de inadmissibilidade, conformando-se com a negativa do outro. Neste caso, a interposição do agravo equivocado importa em erro grosseiro, não sendo admitida a fungibilidade recursal entre eles.

Por fim, o Enunciado 77, embora tenha uma redação de difícil compreensão, é elucidativo ao deixar claras as hipóteses de cabimento de cada um dos agravos contra a decisão que nega seguimento ao recurso especial ou extraordinário, evitando que os profissionais do Direito deixem de ter a análise de suas pretensões obstadas por erro na interposição do(s) agravo(s) correto(s). É assim que deve ser o processo, especialmente no âmbito dos tribunais superiores: sem surpresas quanto à tramitação dos recursos.

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