O MP que vai até o povo

Ministério Público dos Estados cuida das causas do dia-a-dia da população

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22 de dezembro de 2020, 8h45

*Reportagem publicada no Anuário do Ministério Público Brasil 2020, lançado em 14 de dezembro no canal da ConJur no YouTube. O Anuário está disponível gratuitamente na versão online e à venda na Livraria ConJur, em sua versão impressa

De todo o Ministério Público brasileiro, o Ministério Público dos Estados é, sem dúvida, o que está mais próximo da população. De cada 10 processos que tramitam na Justiça do país, oito correm na Justiça estadual – e grande parte deles tem a digital de um promotor ou um procurador de Justiça. Por isso ele também é o maior. Dos cerca de 13 mil procuradores e promotores em atividade no país, 10,5 mil atuam na esfera estadual e estão presentes em quase metade dos municípios dos 26 estados da federação. O Ministério Público do Distrito Federal tem a mesma estrutura e as mesmas atribuições dos MPs estaduais, mas faz parte do MPU. 

A Lei 8.625/1993 está para o Ministério Público dos Estados assim como a Lei Complementar 75/1993 está para o Ministério Público da União. As duas regulamentam o que a Constituição instituiu para cada um dos ramos do MP e as duas começam replicando a Carta da República para dizer que “o Ministério Público é instituição permanente, essencial à função jurisdicional do Estado, incumbindo-lhe a defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis”. Diz também que “são princípios institucionais do Ministério Público a unidade, a indivisibilidade e a independência funcional". Nunca é demais repetir. 

O MPE é comandado pelo procurador-geral de Justiça, que é nomeado pelo governador do estado a partir de uma lista tríplice escolhida pelos integrantes da carreira. Procuradores e promotores são igualmente elegíveis, “na forma da lei”, como diz a Lei 8.625. Isso significa que em alguns estados, como é o caso de São Paulo e de Minas Gerais, a Lei Orgânica do MP local restringe a elegibilidade aos procuradores de Justiça. Mas nada menos que 16 MPs dentre os 26 estados hoje são comandados por promotores.

A lei também estabelece que são órgãos da administração superior a Procuradoria-Geral de Justiça, o Colégio de Procuradores, o Conselho Superior e a Corregedoria, além das Procuradorias de Justiça e as Promotorias de Justiça. Já os órgãos de execução funcional são o procurador-geral; os procuradores, que atuam em segunda instância, e os promotores, que intervêm no primeiro grau. A lei fala ainda dos Centros de Apoio Operacional, que “são órgãos auxiliares da atividade funcional do MP”. Existem ainda grupos especiais de atuação e núcleos técnicos, que oferecem auxílio para investigações, levantamento de dados, perícias, orientações gerais e informação atualizada sobre a área.

O que não está na Lei Orgânica geral, mas que está presente no organograma dos MP estaduais, são os grupos de atuação especiais, dos quais os mais conhecidos são os Gaecos, o Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado. Mas existem outros como o Gaecc, de combate à corrupção, o Gaesf, de combate à sonegação fiscal, ou o Gaema, de defesa do meio ambiente. São grupos de trabalho permanentes, multidisciplinares e interinstitucionais, especializados e que atuam por provocação de um promotor de Justiça.

Assim como as forças-tarefa do Ministério Público Federal, os Gaecos têm enfrentado resistência. Tramitam no Supremo Tribunal Federal duas ações que contestam a constitucionalidade de leis do Mato Groso e de Tocantins que criaram grupos do tipo.

O Ministério Público é o titular da ação penal e nos estados a face mais visível e mais midiática de sua atuação é o Tribunal do Júri, onde ele comparece como o acusador de quem cometeu crime contra a vida. Com certeza, a matéria criminal consome grande parte da energia do MP estadual.

Segundo o MP Um Retrato, o levantamento estatístico da atividade do MP brasileiro feito anualmente pelo CNMP, em 2019 a soma dos processos criminais que tiveram intervenção do MP dos estados, quer como parte, quer como fiscal da lei passou dos 14 milhões. 

Na fase extrajudicial, não é menos o trabalho de promotores e procuradores estaduais em matéria criminal. Ainda segundo o MP Um Retrato, em 2019 passaram pelos Ministérios Públicos estaduais outros 8,2 milhões de procedimentos, entre inquéritos policiais e termos circunstanciados de ocorrência. No mesmo período foram apresentadas ao Judiciário 1,7 milhão de denúncias penais. Usando suas prerrogativas investigatórias, o MP dos estados instaurou ainda 25 mil procedimentos investigativos criminais.

As principais demandas recebidas e investigadas pelos MPEs estavam relacionadas a crimes contra o patrimônio, responsável por 37% dos inquéritos policiais recebidos, violência doméstica e crimes contra a liberdade pessoal (13% cada), homicídio e tráfico de drogas (8% cada). Os crimes contra a administração pública, que compreendem os delitos por corrupção passiva e ativa, são apenas 2% do total de casos e aparecem em nono lugar entre os 10 tipos penais levados em conta no estudo do CNMP.

Na área cível toca ao promotor de Justiça a tutela dos direitos difusos e coletivos (como meio ambiente e patrimônio público) e dos direitos individuais indisponíveis (saúde, educação, direitos da criança, do idoso e dos deficientes). “O Ministério Público adquiriu uma nova fisionomia. Deixou de ser só o acusador. O Ministério Público brasileiro assumiu o papel constitucional de guardião da sociedade, com um encargo de defender os interesses individuais homogêneos, coletivos e difusos”, comenta o promotor de Justiça Mirtil Fernandes do Vale, do Ministério Público do Amazonas, em entrevista publicada no site da instituição. 

No exercício da tutela coletiva o MP dos estados recebeu quase 8 milhões de processos vindos do Judiciário, também atuando nos papeis de parte ou de fiscal da lei. Na fase extrajudicial, foram mais de 2 milhões de inquéritos civis e notícias de fato, que na distribuição por assuntos feita pelo MP Um
Retrato
 apontou a preponderância das causas relativas aos direitos da infância e da juventude (27% dos procedimentos), seguidas por meio ambiente (16%) e saúde (14%). Improbidade administrativa, que está diretamente relacionada com corrupção, aparece em quarto lugar com 13% dos procedimentos instaurados.

Na defesa dos direitos da sociedade, o promotor se vale de algumas medidas extrajudiciais, cada uma para uma finalidade. O procedimento administrativo é destinado a fiscalizar políticas públicas ou instituições. Ele pode ainda ser feito para acompanhar o cumprimento de um termo de ajustamento de conduta (TAC), que é um acordo celebrado pelo MP com o violador de determinado direito coletivo. A notícia de fato é uma demanda externa que chega ao MP por meio dos seus canais de atendimento ou por meio de notícias da imprensa, documentos, requerimentos ou representações.

Já o inquérito civil é instaurado pelo Ministério Público para descobrir se um direito coletivo foi violado. Os estados registraram, em 2019, quase 2 milhões de notícias de fato e 98 mil inquéritos civis em 2019. Estes procedimentos levaram ao ajuizamento de 70 mil ações judiciais e à celebração de mais de 13 mil TACs.

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