Opinião

A manutenção do desequilíbrio entre tributação, arrecadação, saúde e economia

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20 de dezembro de 2020, 6h33

2020 está sendo "o ano da provação". Há cerca de oito meses escrevemos sobre um dilema parecido, ou seja, como o país, enquanto Estado democrático de Direito, poderia equilibrar o tripé arrecadação, saúde pública e economia.

Logicamente o cenário era outro em relação aos dias de hoje. Tínhamos pouco conhecimento sobre a Covid-19, suas formas de contaminação, tratamento, eventuais remédios, quais seriam os reais impactos sociais, econômicos e, quiçá, falávamos em vacinas.

O desafio à época era trazer uma equidade entre os pilares mencionados, sem deixá-los desprotegidos.

Era momento único, ímpar e sem precedentes recentes em nossa história.

O governo, como Estado, quis proteger sua sociedade da melhor forma possível, até porque não tínhamos (na verdade, ninguém tinha) um manual de crise voltado à Covid-19.

Procurou-se manter o sistema de saúde ativo, evitando seu colapso por meio de duas grandes medidas: sociedade ficando em casa e a decretação de orçamento de guerra.

A economia parou. As reservas foram sendo utilizadas e os cofres públicos ficaram sem fonte de arrecadação.

A pandemia começou a ser um pouco mais controlada e a reabertura foi necessária, muito mais do ponto de vista econômico do que de saúde mental (num primeiro momento).

Ocorreram várias alterações legislativas para manutenção do emprego, de forma a não deixar a riqueza se esvair, bem como a postergação de tributos e abertura de créditos para pequenas e micros empresas.

Quando vimos, a reabertura era a atual realidade, a economia se reerguendo e o sistema de saúde se estabilizando.

Neste ínterim, muito foi falado sobre reforma tributária como uma oportunidade de crescimento da economia sem as amarras do nosso atual sistema tributário arcaico. Mas ele é o que temos hoje e é o que não gera "surpresas".

Muito embora a reforma, ao nosso ver, seja imprescindível, ela não poderia ser implementada num cenário volátil como o nosso e no meio de uma pandemia. Seria trocar o "não tão certo" pelo mais duvidoso.

Não obstante, muitas famílias tiveram suas fontes de renda mais agravadas e necessitaram do  auxílio emergencial, que unitariamente não é muita coisa, embora a conta final seja altíssima. Com certeza é uma conta rateada por toda a sociedade. E esse não é o problema.

O que temos pela frente é um efeito rebote, por várias razões:

— Do total de R$ 605 bilhões do "orçamento de guerra", foram destinados R$ 322 bilhões ao auxílio emergencial [1];

— Para empresas, as ações emergenciais somaram R$ 140 bilhões para capital de giro, manutenção de empregos e outros programas [2];

— Numa comparação com o primeiro semestre do ano passado, o governo federal teve de gastar 70% a mais para manter funcionando a estrutura de fornecimento de bens e serviços para os cidadãos [3];

— As dez atividades econômicas mais impactadas pela pandemia são: 1) atividades artísticas, criativas e de espetáculos; 2) transporte aéreo; 3) transporte ferroviário e metroferroviário de passageiros; 4) transporte interestadual e intermunicipal de passageiros; 5) transporte público urbano; 6) serviços de alojamento; 7) serviços de alimentação; 8) fabricação de veículos automotores, reboques e carrocerias; 9) fabricação de calçados e de artefatos de couro; e 10) comércio de veículos, peças e motocicletas [4].

Ou seja, os números são estratosféricos, ainda mais considerando que o Brasil ainda faz parte do terceiro mundo, muito embora tenha uma economia emergente.

Ocorre que os números de contágios e mortes pela Covid-19 voltaram a crescer [5], não tendo como vilã a retomada da economia, mas o próprio cidadão, que, ao ver o "cenário de controle da pandemia", descuidou-se e voltou a ser o principal veículo de contágio.

O referido aumento do contágio não se dá, em regra, durante o horário comercial, mas, sim, no happy hour, nas confraternizações e festas, que trazem à tona não uma qualidade do ser humano que precisa viver em sociedade, mas, sim, um lado egoísta e sem noção do todo. No nosso cenário o particular tem de respeitar o público, o todo.

Quanto maior o contágio, maior risco de a economia frear, maior a necessidade de tributação e arrecadação para manter o Estado amparador da sociedade, e mais longe do pós-pandemia estaremos, contando com a "sorte" de não sermos contaminados e com a esperança numa vacina ainda em fase de testes, a qual precisa ser aprovada pela Anvisa e fabricada na quantidade necessária à imunização de todos.

O cidadão brasileiro precisa ser responsável, patriota e, acima de tudo, empático.

Por fim, o que aprendemos após um ano de Covid-19 no mundo, após cerca nove meses de pandemia mundial, é que a saúde pública precisa de amparo financeiro para ser eficiente e eficaz para toda sociedade, e isso custa muito caro. Por enquanto tem sido viável absorver esse custo pelos recursos da tributação, mas o descuido de uma parte da população pode implicar na necessidade de apropriação do patrimônio do particular (empréstimo compulsório).

Este artigo não tem cunho psicológico ou filosófico, mas quer ao menos mostrar o cenário brasileiro e conduzir a uma reflexão que tenha como finalidade espalhar um mínimo de consciência coletiva, fraternidade e solidariedade.

Façamos por merecer um 2021 positivamente diferente!

 


[1] Fonte: Agência Câmara de Notícias.

[2] Fonte: Agência Câmara de Notícias.

[3] Correio Brasiliense.

[4] Ministério da Economia.

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