Casos de família

Abin produziu relatórios para orientar defesa de Flávio Bolsonaro no caso Queiroz

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11 de dezembro de 2020, 12h11

A Agência Brasileira de Inteligência produziu ao menos dois relatórios para ajudar a defesa do senador Flávio Bolsonaro (Republicanos-RJ) a buscar a anulação do caso Queiroz, em que o político é investigado pelo esquema de "rachadinha" quando ainda era deputado estadual.  

Wilson Dias/Agência Brasil
Abin ajudou defesa do Senador Flávio Bolsonaro, afirma reportagem da Época
Wilson Dias/Agência Brasil

A informação foi publicada nesta sexta-feira (11/12) pelo jornalista Guilherme Amado, da revista Época. Os relatórios, que tiveram a autenticidade comprovada pela defesa de Flávio, apontam a existência de uma suposta organização criminosa dentro da Receita Federal que teria sido responsável por fazer um escrutínio ilegal nos dados fiscais do senador.

Um dos documentos afirma ter como finalidade "defender FB [Flávio Bolsonaro] no caso Alerj, demonstrando a nulidade processual resultante de acessos imotivados aos dados fiscais de FB". Os relatórios teriam sido encaminhados ao senador por WhatsApp e, em seguida, enviados por ele para a sua advogada. 

Em provável referência a servidores da Receita, o relatórios sugere a substituição de "postos", e, sem dar mais detalhes, diz que essa recomendação já havia sido feita em 2019. 

"Permanece o entendimento de que a melhor linha de ação para tratar o assunto FB e principalmente o interesse público é substituir os postos conforme relatório anterior. Se a sugestão de 2019 tivesse sido adotada, nada disso estaria acontecendo, todos os envolvidos teriam sido trocados com pouca repercussão em processo interno na RFB [Receita Federal]", diz um dos textos. 

Comandada pelo delegado da Polícia Federal Alexandre Ramagem, a Abin também faz sugestões específicas. Diz, por exemplo, que o presidente Jair Bolsonaro deve demitir Waller Júnior da Corregedoria-Geral. "Neste caso, basta ao 01 (Bolsonaro) comandar a troca de Waller por outro CGU isento. Por exemplo, um ex-PF, de preferência ex-corregedor da PF de sua confiança". 

O documento ainda traça um modo de ação que envolve a Controladoria-Geral da União (CGU), o Serviço Federal de Processamento de Dados (Serpro) e a Advocacia-Geral da União (AGU). 

"Com base na representação de FB protocolada na RFB, CGU instaura sindicância para apurar os fatos no âmbito da Corregedoria e Inteligência da Receita Federal; Comissão de Sindicância requisita a Apuração Especial ao Serpro para instrução dos trabalhos. Em caso de recusa do Serpro (invocando sigilo profissional), CGU requisita judicialização da matéria pela AGU. FB peticiona acesso à CGU aos autos de apuração especial, visando instruir representação ao PGR Aras, ajuizamento de ação penal e defesa no processo que defende RJ", recomenda a Abin. 

Neutralização
O segundo relatório sugere uma tripla atuação para tentar conseguir documentos necessários para a defesa de Flávio. As orientações também são bastante específicas. 

"A dra. Juliete (em referência, segundo a Época, à advogada Juliana Bierrenbach, da defesa de Flávio) deve visitar Tostes, tomar um cafezinho e informar que ajuizará a ação demandando o acesso agora exigido", diz o texto, em referência a José Tostes Neto, chefe da Receita. 

O relatório diz que a defesa deve solicitar ao Serpro uma apuração especial sobre os dados da Receita e que três "elementos-chave dentro do grupo criminoso" da Receita devem ser neutralizados.  

"Sobre estes elementos pesam condutas incompatíveis com os cargos que ocupam, sendo protagonistas de diversas fraudes fartamente documentadas", diz o texto, sem especificar condutas específicas. Os "elementos-chave" seriam o corregedor José Barros Neto, corregedor da Receita; o chefe do Escritório de Inteligência da Receita no Rio, Cléber Homem; e Christiano Paes, chefe do Escritório da Corregedoria da Receita no Rio. 

A reportagem da Época foi publicada na mesma semana em que a Folha de S. Paulo revelou que uma produtora de conteúdo digital que presta serviços ao governo federal fez, gratuitamente, a cobertura da festa de inauguração de uma empresa de Jair Renan Bolsonaro, o filho 04 do presidente da República. 

"Inaceitável"
O Sindifisco Nacional, sindicato que representa os auditores fiscais da Receita, publicou nota afirmando que as informações divulgadas, caso confirmadas, são inaceitáveis. 

"O fato é inaceitável em todos os sentidos. Se não bastasse a gravidade de se ter uma agência de inteligência mobilizada para defender o filho do presidente da República, acusado de atos ilícitos, como a rachadinha na Alerj, não se pode admitir que um órgão de governo busque interferir num órgão de Estado, protegido pela Constituição Federal, sugerindo o afastamento de servidores públicos", diz a nota. 

Kleber Cabral, presidente do Sindifisco, também comentou o caso. "Ao estar a serviço de uma causa que não é republicana, a atuação da Abin passou de qualquer limite. A Receita Federal, diante do que vem sendo noticiado pela mídia, tem resistido às pressões políticas, tentativas de ingerência que precisam de um fim imediato. É preciso de uma reação por parte do próprio órgão, do Congresso Nacional e da imprensa contra esse que pode se configurar no maior escândalo da República", disse. 

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