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A necessidade de reformas no Poder Judiciário e no Ministério Público

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7 de dezembro de 2020, 13h06

Diante de fatos que a mídia vem noticiando, é necessário um debate sobre a necessidade da reforma do Judiciário e do MP. Uma eventual reforma centra-se na Constituição Federal e poderá servir como parâmetro para outras reformas de maior vulto. Todavia, serão elas suficientes para solucionar as crises que afloram sobremaneira na Justiça? Creio que não.

O ponto fulcral reside na cultura. Advogados despreparados, com discursos infundados e despidos de retórica, aliados, ainda, à distorção e à difícil compreensão da linguagem escrita, com crassos erros do vernáculo. Petitórios que não encarnam a figura do advogado, visto pelo povo como o "probus da liberdade". Essa gama de fatores desiquilibra o contraditório contradito.

E os juízes? Preparam-se tecnicamente, porém, afastam-se do humanismo. Para o ingresso, noções literárias, filosóficas e psicológicas não são exigidas. Transformam-se em técnicos e esquecem-se de outros valores que avaliam a conduta humana. Perdem tempo com questões periféricas formais e guardam ranço do positivismo normativista, mantendo-se distante da Justiça real. Cultivam demasiada reverência às cúpulas dos tribunais e esquecem-se de criar um Direito humano, compatível com os tempo modernos.

À escola da magistratura, de inspiração constitucional (artigo 93), caberia a mudança desse estado de coisa. O juiz deveria passar por periódicas avaliações, tanto de cultura quanto de caráter. Essa reciclagem é necessária, pois o magistrado, com o poder de julgar, se sobrepõe ao próprio homem. Por isso deve ser constantemente avaliado.

A falta de preparação cultural dos juízes dificulta o termo da Justiça. Geralmente adotam, por comodidade, posturas conservadoras de outros tempos. Não se utilizam de pena com o objetivo de "reeducar o criminoso". Distanciam-se deste e, na sentença final, exilam o réu, certos de que, com tal exaurimento, livram e protegem a sociedade.

Os juízes dificilmente mantêm contato com as penitenciárias. Quando o fazem, permanecem mudos a qualquer reclamo. Os sentenciados falam e reclamam, mas ninguém os ouve. Muitos, depois de cumprir a pena, ainda continuam presos. Isso motiva rebeliões.

Com o ranço do passado, os juízes plagiam sentenças antigas. Não têm a coragem de um guerreiro para mudarem o rumo da nau. Um reincidente, por bagatela, se processado por outra bagatela, vai amargar sua dor na prisão por tempo bem razoável. A maioria dos juízes não se anima de mitigar o cumprimento da reprimida. Caso o regime declarado tenha sido o semiaberto, mas não haja vagas, o sentenciado cumprirá a pena no regime fechado. De nada adianta a veemente instância do defensor. Decisões fluem ao mundo do processo estereotipadas: "Acolho o bem lançado parecer do MP. Indefiro".

Caso existisse uma busca por outras formas de cultura, como a literária, sociológica, filosófica etc., os juízes ganhariam ânimo para enfrentar tais dissabores e, por certo, as decisões seriam mais justas e humanas. A obra literária "Os Filhos da Rua Arbat", do escritor russo Anatoli Ribakov, servir-lhes-ia de consolo. Afinal, em um excerto da narrativa, todos se espantam quando o juiz anuncia oito anos de cadeia pelo furto de 40 metros de fio. Essa é apenas uma amostragem, mas a literatura russa, francesa, norueguesa, brasileira etc. é rica nesse detalhes.

O advogado, principalmente aquele que já pisa no outono da vida, sente a tristeza do quadro, talvez porque aprendeu com a idade e com os anos de sofrimento. Não há quem não sofra com a dor alheia.

Para avaliar os juízes, é imprescindível o controle externo rigoroso. No futuro nos envergonharemos de saber que existiu "um poder sem controle", tal como nos envergonhamos hoje da escravidão.

A súmula vinculante não trouxe avanço algum. Poderá até ser um mal para juízes preguiçosos, que em nome de celeridade passarão a dar enquadramento a todos os fatos, livrando-se do processo. E quem não se resigna que bata às portas do tribunal…

O Poder Judiciário é um poder desarmado, que deve inspirar respeito e admiração através da cultura, da coragem e da moral de seus integrantes.

E os promotores? Na mesma linha de abordagem. São duros no cumprimento da lei e não poupam a mídia para acusar. E o fazem precipitadamente. O membro do órgão, além de suas funções processuais, possui, na condição de representante do povo, a autoridade do diálogo, podendo buscar soluções extrajudiciais para questões que enfrenta, notadamente na seara das execuções criminais. Porém, dificilmente se observa a presença de um Parquet atuando ou mesmo visitando um presídio. Ora, tal função, apesar de prevista em nossa Magna Carta, dificilmente será observada na prática.

O concurso de ingresso em ambas carreiras — da magistratura ou do Parquet — deve revestir-se da maior dignidade. A fiscalização deve ser constante para que os operadores do Direito não se sintam pejados com os últimos acontecimentos que abalaram, há alguns anos, o concurso do Ministério Público paulista, após fraudes terem sido apuradas na aprovação de candidatos em duas edições, comprometendo o prestígio da instituição. Assim, sabendo desses casos (que não foram devidamente relatados à sociedade), quando vejo um promotor todo vaidoso, desfilando pelos corredores dos tribunais, como se príncipe fosse, fico a pensar "se esse doutor foi aprovado em concurso ou só assinou a prova".

Ora, o Ministério Público e povo são indissociáveis, umbilicalmente ligados, e o Parquet deve conhecer a sociedade. Cabe a nós indagar a notícia, veiculada recentemente, de que o Ministério Público do Mato Grosso adquiriu 400 celulares com tecnologia de ponta a um custo de R$ 2,2 milhões, em um período em que a nação se encontra em uma grave crise financeira e pandêmica, gerando perplexidade a adoção de tal medida por um órgão que deve, por preceitos constitucionais, zelar pelo bem público.

É o preço que toda a instituição paga pela leviandade de poucos.

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