Justiça Eleitoral e democracia são aliadas, não adversárias
28 de agosto de 2020, 6h03
A democracia brasileira é ambígua e contraditória. Se de um lado é um ser jovem, ainda raiando no horizonte, de outro é uma senhora de considerável idade, com mais de 500 anos acompanhando a evolução da História do Brasil. Se já viu imperadores serem entronados e presidentes, nomeados ou eleitos, também já viu vergonhosas saídas, entre renúncias, cassações e impeachments.
Se aparentemente restringe as nomeações e os mandatos dos candidatos eleitos soberanamente pela maioria dos votos, por outro aspecto impede que políticos e agentes públicos violem a própria democracia, no momento em que deixam de lado a lisura e a ética inerentes ao seu cargo ou função. Ou seja, preserva a liberdade e o direito de escolha justamente porque coloca esses valores dentro de determinados requisitos e padrões mínimos de condição.
Se existe no mundo desde os tempos do Império Romano, ainda é um regime dinâmico e em constante mutação, sempre acompanhando o desenvolvimento da sociedade e do próprio ser humano. Se para Abraham Lincoln "a democracia é o governo do povo, pelo povo e para o povo", ainda existem aqueles que a veem como um regime defasado e que merece cair no esquecimento.
Pois é essa mesma democracia, assegurada pela Constituição de 1988, que necessita tanto ser protegida pelos Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário como pela própria Justiça Eleitoral. Se o STF é conhecido como o guardião da Carta Magna, pode-se dizer que o TSE é o guardião do processo eleitoral e, consequentemente, da própria democracia.
Atualmente, verifica-se que o papel da Justiça Eleitoral vai muito além de meramente fiscalizar o funcionamento dos partidos e o processo eleitoral, a fim de evitar e punir abusos, corrupção e fraude, promovendo a igualdade de condições mínimas entre os candidatos.
Imagine-se por um segundo um Brasil sem uma Justiça Eleitoral, sem um órgão que acompanhe e fiscalize todo o processo eleitoral, desde a criação de um partido à homologação da apuração dos votos. Um país em que a análise dos eventuais crimes eleitorais fosse atribuída ao Poder Judiciário lato sensu, tão atravancado com suas próprias responsabilidades e cada vez mais abarrotado com infindáveis e incontáveis demandas, além da máquina operacional cada vez mais enxuta.
Ao constituir-se como parte da chamada Justiça Especial, juntamente com a Justiça Militar e a Justiça do Trabalho, retira do Poder Judiciário uma pesada carga e passa a atendê-la de modo específico, com servidores especializados em solucionar demandas inerentes ao tema, procurando estabelecer a licitude do processo eleitoral e coibindo a compra de votos, abuso de poder econômico e político, corrupção, fraude e os atuais crimes informatizados, como as cada vez mais presentes fake news.
A Lei nº 13.165/2015 alterou diversos dispositivos da legislação eleitoral, principalmente o acréscimo dos parágrafos 3º e 4º ao artigo 224 do Código Eleitoral, prevendo os casos de indeferimento ou cassação do registro ou a perda do mandato, com a subsequente realização de novas eleições. Com isso, e amparado nos princípios da Constituição Federal, a Justiça Eleitoral busca a lisura na conduta das eleições, tanto por parte do candidato quanto do eleitor.
Não há como emanar poder de uma sociedade democrática sem um processo eleitoral digno e justo, e no Brasil torna-se difícil isso acontecer sem o toldo e o lastro de uma Justiça Eleitoral. Graças a esse órgão, o eleitor brasileiro tem o direito de escolher os representantes nos quais acredita que terão o condão de bem conduzir o país — ainda que muitas vezes isso não se comprove.
As eleições não garantem a democracia, nem o inverso ocorre. Um sufrágio livre e universal, justo na sua concepção e legal na sua realização, permite o exercício da democracia na sua mais ampla forma, qual seja o direito de escolha à representação política. Todavia, a permanência da democracia deriva desse mesmo processo, posto serem os escolhidos pelo povo os responsáveis pela sua condução. A Justiça Eleitoral e a democracia não são adversárias, portanto, e, sim, aliadas na busca pela garantia dos direitos constitucionais, essencialmente o direito à liberdade e à igualdade.
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