Risco Zero

Juíza do RS indefere penhora eletrônica por medo da Lei de Abuso de Autoridade

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15 de agosto de 2020, 8h45

Enquanto o Supremo Tribunal Federal não se posicionar sobre as ações diretas de inconstitucionalidade (ADIs) que contestam dispositivos da Lei de Abuso de Autoridade (Lei 13.869/2019), os julgadores não terão segurança para deferir a penhora de valores via BacenJud num processo de execução.

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Juíza indeferiu pedido de penhora eletrônica por receio de ser enquadrada na Lei de abuso de autoridade
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Sob a batuta deste entendimento, a 3ª Vara Cível da Comarca de São Leopoldo, na região metropolitana, indeferiu pedido de penhora eletrônica de dinheiro, nos autos de uma execução extrajudicial, em razão dos rigores da Lei de Abuso de Autoridade. A penhora pelo sistema BacenJud é a forma mais usual e eficaz de se garantir o pagamento de uma dívida ao credor.

Em seu despacho, de 7 de agosto, a juíza Fernanda Pinheiro Tractenberg reconheceu que esta é uma prática forense de grande eficácia na obtenção do crédito buscado pelo exequente. No entanto, a partir da vigência da Lei do Abuso de Autoridade, em 5 de setembro de 2019, o uso deste recurso "não se mostra prudente"’.

E o motivo, segundo ela, é simples: o artigo 36 tipificou como crime de abuso de autoridade, punido com pena de detenção de um a quatro anos e multa, "decretar, em processo judicial, a indisponibilidade de ativos financeiros em quantia que extrapole exacerbadamente o valor estimado para a satisfação da dívida da parte e, ante a demonstração, pela parte, da excessividade da medida, deixar de corrigi-la".

Criminalização dos julgadores
A juíza explicou que, dada a ordem judicial de indisponibilidade de certo valor, o sistema BacenJud bloqueia todas as contas bancárias vinculadas ao devedor. O retorno da ordem judicial emanada ocorre, apenas, passadas 48 horas úteis após a determinação de bloqueio. Desta forma, só após este interregno de tempo é que o magistrado poderá apurar eventual excesso de penhora ou impenhorabilidade, por se tratar de conta-salário, por exemplo. Aí, sim, corrigirá o vício, que não pode ser previsto e coibido anteriormente a tal prazo.

Neste cenário, discorreu a magistrada, fica evidenciado que o juiz não tem qualquer ingerência nas contas do devedor durante o período citado. Mesmo assim, está à mercê de ser responsabilizado criminalmente pela ordem de indisponibilidade proferida. Afinal, a Lei não esclarece as terminologias "exacerbadamente" e "excessividade da medida", no artigo 36, que são de tipo penal aberto. Logo, dão margem às mais diversas interpretações, afetando "a tranquilidade do julgador no exercício de sua atividade jurisdicional, que pode ser acusado de prática de conduta criminosa".

"Precedente perigoso"
A advogada Roberta Bitarello, que defende a parte exequente, classificou a decisão da juíza como "preocupante", dado que a penhora em dinheiro está prevista na lei processual, inclusive como preferencial. Isso sem falar que os sistemas eletrônicos foram uma conquista para a efetividade da execução.

"Essa decisão abre precedentes para que outras prestações jurisdicionais previstas em lei não ocorram sob o argumento de 'risco da autoridade'. Lembramos que isto pode vir a ocorrer em outras situações, já que a validação deste argumento pode autorizar que qualquer autoridade, nas mais diversas situações, deixem de cumprir o seu ofício", manifestou-se em e-mail à ConJur.

Clique aqui para ler a íntegra do despacho.
1.18.0014236-6 (Comarca de São Leopoldo)

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