Ato de ministro de Estado

TRF não pode antecipar tutela contra demissão de diplomata, diz STJ

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13 de agosto de 2020, 9h53

A concessão de liminar em ação ordinária que tramita no primeiro grau contra ato de ministro de Estado — autoridade sujeita à competência do Superior Tribunal de Justiça — na via do mandado de segurança configura usurpação de competência desse tribunal, mesmo se feita por desembargador.

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Ato de demissão por ministro das Relações Exteriores deve ter pedido em liminar julgado pelo STJ 
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Com esse entendimento, a 1ª Seção do Superior Tribunal de Justiça deu provimento a reclamação impetrada pela União contra decisão liminar de desembargador do Tribunal Regional Federal da 1ª Região que antecipou a tutela para determinar a reintegração da ex-diplomata Elizabeth-Sophie Mazzella Di Bosco Balsa.

A ex-embaixadora do Brasil no Sri Lanka foi demitida em 2018 pelo ministério das Relações Exteriores, com aprovação do então chanceler Aloysio Nunes Ferreira. Ela foi acusada de fraudar o auxílio-aluguel pago pelo Itamaraty enquanto trabalhava na missão brasileira em Haia, na Holanda.

Por isso, ajuizou ação ordinária perante a seção judiciária do Distrito Federal para anular a penalidade administrativa de demissão, com pedido liminar para imediata reintegração no cargo. O juízo de primeiro grau negou a antecipação da tutela, mas o desembargador Francisco Neves da Cunha concedeu a ordem em agravo de instrumento.

Contra essa decisão, a União interpôs reclamação ao STJ. O ministro relator, Sergio Kukina, concedeu liminar para suspender a ordem de reintegração, posição que foi mantida por maioria. O entendimento é de que o desembargador do TRF-1 não poderia ter analisado a liminar contra ato de ministro do Estado, pois a competência é do STJ.

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Relator, ministro Sérgio Kukina entendeu que decisão do TRF usurpou competência 
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Competência usurpada
A 1ª Seção do STJ concluiu que o ato do desembargador do TRF-1 feriu o parágrafo 1º do artigo 1º da Lei 8.437/1992, que trata da concessão de medidas cautelares contra atos do poder público.

A norma diz que não será cabível, no juízo de primeiro grau, medida cautelar inominada ou a sua liminar, quando impugnado ato de autoridade sujeita, na via de mandado de segurança, à competência originária de tribunal.

Segundo o ministro Sérgio Kukina, a interpretação deve ser sistematizada e ampliada. Soaria ilógico concluir que o juiz de primeiro grau não possa definir mandado de segurança contra ato de autoridade cuja competência seja de Tribunal de segundo grau, mas que, por outro lado, o desembargador possa afastar essa regra quando a competência for de ministro do STJ.

"A competência originária do STJ seria deixada à margem. Parece que não foi esse o propósito do legislador da Lei 8.437. Nesse passo, a lei falou menos do que literalmente deveria dizer. Mas com auxílio da hermenêutica deve-se chegar a uma interpretação razoável", opinou o relator.

Esgotamento de instância
Divergiu o ministro Napoleão Nunes Maia, para quem a Lei 8.437 deve ter interpretação que leve em conta os direitos humanos, liberdades e proteções. Ou seja, seria possível superá-la no caso de desembargador que antecipa tutela para anular ato de ministro de Estado, se esse ato for referente a direitos pessoais, como no caso do emprego da ex-diplomata.

E também abordou a alegação de que a reclamação não é cabível — segundo a defesa, porque as vias ordinárias no caso não foram exauridas. 

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Reclamação não pode virar "pau para toda obra", segundo ministro Napoleão 
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"Se levarmos às últimas consequências esse entendimento, a reclamação vai virar pau para toda obra. Ela pode servir para tudo. E não é assim. Concordo que não precise esperar o esgotamento das instâncias ordinárias, mas os defeitos de competência devem ser corrigidos na via recursal", destacou o ministro Napoleão.

Prevaleceu o entendimento do relator, segundo o qual aguardar o exaurimento das instâncias ordinárias seria abrir mão da competência, de fato, do STJ.

"Na hipótese de usurpação de competência soaria estranho que, após interposição de reclamação no STJ, o próprio STJ estaria de mãos atadas para intervir pelo zelo de sua competência. Teria que esperar quanto tempo até que se esgotasse a instância ordinária? Não guarda sentido", disse.

Rcl 39.864

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