Sem saída

Pandemia da Covid-19 não é motivo para soltura indiscriminada de presos, diz TJ-RS

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9 de agosto de 2020, 8h49

Embora não se desconheça a importância de o Estado zelar pela saúde dos indivíduos colocados sob sua custódia, notadamente em tempos de pandemia da Covid-19, tal não se pode constituir em justificativa para a soltura ampla e indiscriminada de meliantes perigosos.

CNJ
Covid-19 não é motivo para que preso mude para regime domiciliar, segundo o TJ-RS
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Por aderir a essa tese, de autoria do procurador de Justiça Roberto Neumann, a 1ª Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul cassou despacho que deferiu a progressão de regime a um homem condenado por tráfico de drogas em Itaqui. Em função da pandemia, o juízo da vara de execução autorizara que ele migrasse do regime fechado para o semi-aberto, passando a cumprir a pena em prisão domiciliar.

O relator do agravo em execução, desembargador Sylvio Baptista Neto, por meio da fundamentação per relationen, disse que "a situação foi bem apanhada" pelo representante do Ministério Público no colegiado, tomando o conteúdo do parecer como razões de decidir.

No presídio é mais seguro
Neumann lembrou que o "paciente" tem cerca de 30 anos, não apresenta histórico de doenças e pode continuar preso, pois não há registro de casos de infecção por Covid-19 nos cárceres gaúchos. E isso se deve às medidas tomadas para que a pandemia não ingresse nos estabelecimentos penais. E mais: parecer técnico do Conselho Regional de Medicina (Cremers) indica que a manutenção dos detentos no ambiente prisional é a medida mais segura na atual conjuntura, mesmo para aqueles que se encontram no denominado grupo de risco.

"Não se pode fragilizar, em sede de segurança, uma sociedade que já está despedaçada por uma situação similar à de guerra. Quem ignorar isso estará ainda mais a tornar inclemente não a vida de presos, mas a dos cidadãos cumpridores da lei. Quem se colocou na situação de estar preso não foi a sociedade", advertiu o procurador MP.

Em conclusão, acrescentou que a Resolução 62, de 18 de março de 2020, do Conselho Nacional de Justiça recomenda a tribunais e magistrados a adoção de medidas preventivas à propagação da infecção pelo novo coronavírus, no âmbito dos sistemas de Justiça penal e socioeducativo, mas isso não implica automática substituição da prisão preventiva pela domiciliar. E essa é a posição do Superior Tribunal de Justiça.

Logo, considerando a crise sanitária, não se pode afirmar que o "paciente" é vítima de constrangimento ilegal. "Nesse sentido, chamada a se pronunciar sobre o tema, essa corte, em sua imensa maioria, tem compreendido de, além da pandemia viral, não submeter à sociedade gaúcha a um enfrentamento ainda mais visceral com criminosos de alta periculosidade", agregou Sylvio Baptista Neto em acórdão lavrado na sessão virtual de 9 de julho.

Fundamentação per relationen
A técnica da fundamentação per relationem, na qual o magistrado se utiliza de trechos de decisão anterior ou de parecer do Ministério Público como razões de decidir, não ofende o disposto no artigo 93, inciso IX, da Constituição, que trata do dever de fundamentação das decisões judiciais, nem ofende o contraditório,

No acórdão, Baptista Neto afirmou que, se quisesse, poderia usar a mesma fundamentação expressa no parecer do procurador. Era só instruir a sua assessoria para que, empregando os mesmos argumentos, trocasse palavras e verbos por seus sinônimos, invertendo frases ou parte delas. Mas essa atitude não seria honesta, segundo ele.

"Prefiro reproduzir o parecer como proferido. Desse modo, valorizo o trabalho do procurador de Justiça, quem, efetivamente, teve o esforço intelectual da argumentação jurídica e fática, para mostrar, fundamentalmente, porque opinou pelo deslinde do recurso", explicou o desembargador relator.

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