Mesmo contra regra estadual, Rio de Janeiro pode retomar aulas do ensino fundamental
6 de agosto de 2020, 8h52
O estado e a Prefeitura do Rio de Janeiro estão em conflito com relação à volta às aulas de alunos do ensino fundamental. Nesse caso, as normas municipais devem prevalecer, uma vez que se trata de assunto de saúde de interesse local.
A prefeitura do Rio autorizou a volta às aulas presenciais das turmas de 4º, 5º, 8º e 9º ano da rede privada. Porém, o estado do Rio anunciou, nesta quarta-feira (5/8), que as aulas de escolas públicas e privadas e instituições de ensino superior seguem proibidas até 20 de agosto.
Em comunicado à imprensa, a prefeitura afirmou que "um decreto do estado não se sobrepõe à independência da administração municipal com relação aos assuntos da municipalidade, conforme determina a distribuição federativa".
Por outro lado, o Ministério Público e a Defensoria Pública recomendaram que a Secretaria estadual de Educação impeça a retomada das aulas em colégios particulares. Os órgãos sustentaram que, de acordo com a Lei de Diretrizes e Bases da Educação (Lei 9.394/1996), as escolas privadas de ensino fundamental e médio integram o sistema estadual de ensino. Dessa maneira, cabe ao estado, e não ao município, regulamentar o seu funcionamento.
A volta às aulas durante a epidemia de Covid-19 é assunto de saúde pública, de interesse local. Portanto, as regras municipais prevalecem sobre as estaduais, afirma o jurista Lenio Streck.
O Supremo Tribunal Federal estabeleceu, no julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade 6.341, que, além da União, estados e municípios têm competência para determinar regras de funcionamento de estabelecimentos para o combate ao coronavírus. Estados têm poder para regular assuntos metropolitanos ou regionais. Municípios tratam de atividades de interesse local.
Com base nesse decisão, o professor da Universidade do Estado do Rio de Janeiro Gustavo Binenbojm aponta que a prefeitura carioca pode permitir a volta às aulas. "Autorizar ou não o funcionamento de escolas no âmbito de cada localidade é competência dos municípios. Aos estados compete apenas definir a reabertura ou manutenção do fechamento das atividades e serviços de natureza metropolitana ou regional, ou seja, interesses que transcendem a mera localidade ou a mera municipalidade. Sendo escolas algo de interesse local, a competência é de cada município, não de cada estado."
Nessa linha, o professor Pedro Estevam Serrano, da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, avalia que a epidemia de coronavírus é um assunto de interesse predominantemente local, pois se desenvolve de forma diferente em cada município. Ele cita, por exemplo, que o número de infectados e mortos pela Covid-19 está caindo na cidade do Rio, mas subindo em outros locais do estado, como na Região Serrana.
Na visão de Serrano, o estado pode interferir em assuntos municipais durante a epidemia, como transferir médicos da rede pública de uma cidade para outra. Mas, com relação às escolas do ensino fundamental, prevalece a regra da cidade. "Se existe queda do número de casos e leitos hospitalares suficientes para tratar infectados com a Covid-19, a regra do município do Rio que libera as aulas presenciais deve preponderar. O interesse local prepondera sobre o regional, e este, sobre o federal."
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