Opinião

É necessário haver especialização no combate aos crimes do colarinho branco

Autor

  • César Dario Mariano da Silva

    é procurador de Justiça (MP-SP) mestre em Direito das Relações Sociais (PUC-SP) especialista em Direito Penal (ESMP-SP) professor e palestrante autor de diversas obras jurídicas dentre elas: Comentários à Lei de Execução Penal Manual de Direito Penal Lei de Drogas Comentada Estatuto do Desarmamento Provas Ilícitas e Tutela Penal da Intimidade publicadas pela Editora Juruá.

6 de agosto de 2020, 13h15

Apurar crimes de corrupção, lavagem de dinheiro e formação de cartel, quando praticados por organizações criminosas, não é tarefa fácil. Os meios empregados para a dissimulação desses delitos, ausência de testemunhas e o enorme número de documentos, físicos e digitais, compõem um emaranhado de provas que exigem do investigador conhecimentos técnicos e do todo, ou seja, das provas em conjunto.

A análise dessas provas individualmente, sem o cotejo com todas as outras, normalmente não leva a absolutamente nada. Não é possível conhecer e identificar essas condutas criminosas e sua autoria sem ater-se a todo conjunto probatório.

Por isso, como antes da "lava jato" as provas eram pulverizadas entre os diversos atores da persecução penal e seus colaboradores (Ministério Público, polícias, Tribunais de Contas, controladorias, entre outros), não se identificavam as condutas criminosas e elas ficavam impunes.

Dessa desorganização e descentralização das investigações se aproveitaram os corruptos, lavadores de dinheiro e outros marginais, travestidos de empresários, políticos e administradores públicos, que quase levaram o Brasil à ruína.

Quero dizer com isso que só se apuram crimes desses tipos com especialização, atuação conjunta e coordenada, normalmente em grupos e forças-tarefas, empregando-se a prova indiciária para a montagem de um grande quebra-cabeça com inúmeras peças esparsas, que, se analisadas adequadamente, levarão à verdade dos fatos.

Indícios são fatos secundários, conhecidos e provados, relacionados com o fato principal, que autorizem com o emprego de processo dedutivo/indutivo chegar-se à conclusão sobre algo (maiores informações sobre a prova indiciária podem ser obtidas aqui).

Enquanto a prova direta se refere aos fatos a serem provados, ao objeto da prova, a prova indireta ou indiciária se refere a outros fatos próximos ou remotos ao indicado, que permitem por meio de processo lógico (indução e dedução) chegar-se ao objeto da prova.

Isoladamente, em regra, o indício não é uma prova plena. Mas vários indícios apontando sempre em uma mesma direção podem demonstrar a ocorrência de um fato ou circunstância.

Na prova indiciária são coletados diversos fatos convergentes e fortes que, após o emprego da dedução e da indução, pode trazer a necessária certeza sobre a ocorrência de um fato até então processualmente desconhecido.

Obtém-se uma conclusão lógica por meio do somatório de outros fatos próximos ou remotos. O indício é a premissa menor do silogismo. A ele se adicionam regras científicas e máximas de experiência (extraída de casos semelhantes) e, com isso, permite-se chegar a uma conclusão sobre algo.

O objetivo da prova indiciária não é alcançar a verdade absoluta dos fatos, que é impossível de ser obtida. Chega-se à verdade processual de modo a reduzir-se ao máximo a margem de erro, levando o magistrado a decidir com enorme probabilidade de acerto, já que a verdade absoluta é utopia e não é alcançada.

A prova indiciária coletada, normalmente aliada às colaborações premiadas e eventuais testemunhas existentes, se bem analisadas de forma conjunta e técnica, demonstra a verdade dos fatos e pode levar à condenação dos acusados.

Com tudo isso, afirmo que só é possível o combate ao crime organizado com especialização e atuação conjunta dos diversos atores da persecução penal, de modo a se angariar o conhecimento do todo. A pulverização das investigações entre diversos órgãos da persecução penal, que não se comunicam, e a falta de especialização, que só se adquire com anos de atuação prática, resultará no retorno ao status quo de outrora em que o crime compensava, uma vez que não era descoberto e, quando era, as provas mostravam-se fracas e normalmente resultavam na absolvição, para o delírio e a satisfação dos criminosos do colarinho branco.

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