Parecer do MPF

Prisão em flagrante não pode ser convertida, de ofício, em preventiva

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4 de agosto de 2020, 10h01

Associação Nacional dos Procuradores da República / ANPR
Raquel Dodge assinou parecer enviado ao Superior Tribunal de Justiça
ANPR

A conversão de prisão em flagrante em prisão preventiva, de ofício, pelo juiz, sem requerimento do Ministério Público, afronta o sistema penal acusatório. Esse é o entendimento adotado pela subprocuradora-geral da República Raquel Dodge em parecer enviado ao Superior Tribunal de Justiça (STJ). A manifestação se deu no âmbito do HC 594.557, no qual Dodge opinou pela concessão da ordem. Assim, para ela, a preventiva deve ser anulada, o que colocaria o réu em liberdade. Ele foi preso em flagrante e, em abril de 2020, denunciado pela prática de furto qualificado.

Raquel Dodge lembrou que a chamada "lei anticrime" (Lei 13.964/19) proíbe a conversão ex officio da prisão em flagrante em preventiva, pois a decretação dessa medida cautelar penal depende, sempre, do prévio e necessário requerimento do Ministério Público.

Também mencionou precedente do STF no HC 186.421 — relatado por Celso de Mello —, segundo o qual, em tema de privação de
restrição cautelar da liberdade, "não mais subsiste, em nosso
sistema processual penal, a possibilidade de atuação ex officio
do juiz".

A subprocuradora-geral da República destacou ainda que o sistema penal acusatório, instituído pela Constituição de 1988, definiu a titularidade exclusiva do Ministério Público para o exercício da ação penal pública. 

Caso concreto
Dodge também apontou que a dispensa da audiência de custódia ou a não realização no prazo de 24 horas após a prisão em flagrante afronta direito fundamental do paciente, além de violar decisão vinculativa do Plenário do STF e Resolução do Conselho Nacional de Justiça (CNJ). Segundo ela, no caso em análise, embora o flagrante tenha ocorrido em 16 de abril e nesse mesmo dia tenha sido proferida a decisão judicial de conversão em prisão preventiva, a audiência de custódia só foi realizada dois meses depois, em 4 de junho.

Ela sustentou que, ao instituir a tipificação legal estrita e a legalidade estrita em matéria penal, a Constituição ampliou as garantias deferidas aos indivíduos, que é o devido processo legal.

"Para que alguém seja validamente processado em juízo e para que uma medida cautelar penal imponha restrição a suas liberdades, deverá sempre haver pedido expresso do titular privativo da ação penal (CF. art. 129-I), que é o Ministério Público, de modo a que o indivíduo tenha clareza a respeito da imputação criminal, do objeto da investigação penal e das razões legais que autorizem restrição a sua liberdade no curso da investigação ou da ação penal", explicou.

De acordo com o parecer, não existe poder geral de cautela do juiz no processo penal. "O que impede que o juiz decrete prisão preventiva sem que haja pedido do Ministério Público fundado nas hipóteses do artigo 312 do Código de Processo Penal, devidamente calcado nos indícios validamente coligidos, e que converta de ofício a prisão em flagrante", completa Dodge. Para ela, o sistema penal acusatório, de que é titular privativo o Ministério Público, é uma garantia constitucional para os cidadãos, pois limita e controla a persecução penal ao que dispõe o regime de leis. Com informações da Secretaria de Comunicação Social
Procuradoria-Geral da República.

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