Opinião

Atraso em entrega de produto durante a Covid-19 pode gerar dano moral

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4 de agosto de 2020, 6h04

Conforme a situação crítica de isolamento social em face da pandemia que atinge o mundo, recorrer ao e-commerce é uma alternativa cada vez mais crescente entre os consumidores, mas são muitos os desafios enfrentados pelos usuários: a demora no recebimento de produtos adquiridos pela internet é uma realidade no país e se agravou recentemente.

Como é sabido no mercado de consumo, em toda compra o fornecedor deve informar o prazo de entrega na oferta ou publicidade do produto, que deverá ser cumprido, sob pena de violação contratual e do Código de Defesa do Consumidor.

O cerne da questão é que o atraso na entrega de produto caracteriza descumprimento de oferta por parte do fornecedor, de acordo com os termos do artigo 35 do Código de Defesa do Consumidor (CDC). Nesse caso, o consumidor terá três opções: exigir o cumprimento forçado da entrega, aceitar outro produto equivalente ou desistir da compra e ser restituído integralmente do valor pago, acrescido de correção monetária, incluindo o frete, podendo pleitear eventual indenização pelos danos sofridos decorrentes da demora.

Cumpre salientar que eventuais problemas de logística causados atualmente pela Covid-19 podem ser considerados na análise do caso concreto, sendo imperioso na hipótese de compra durante a pandemia que a empresa fornecedora — ciente dos problemas existentes — informe o prazo de entrega ao consumidor no momento da compra, não se podendo justificar o atraso pura e simplesmente pela pandemia instalada.

Em caso de atraso, recomenda-se que o consumidor mantenha diálogo com o fornecedor, preferencialmente por escrito, para que as conversas e os comprovantes sejam guardados, caso seja necessário acionar o Poder Judiciário. E, durante as tratativas, o consumidor pode conceder um prazo razoável para que o fornecedor resolva o problema, além do que já foi combinado no momento da compra, com a prevalência da transparência e boa-fé contratual entre as partes, sendo válida a tentativa de solução do caso na via extrajudicial ao menos no primeiro momento.

Nesse aspecto, urge destacar que o atraso jamais pode se justificar pelo advento da Covid-19 se a empresa já se encontrava em mora no cumprimento do contrato. Uma vez caracterizado o atraso na entrega do produto de acordo com a previsão contratual, a superveniência do caos instalado no país pela doença não servirá para excluir a responsabilidade do fornecedor, podendo-se invocar, inclusive, o artigo 399 do CC.

Por outro lado, esgotadas as tentativas de solução do caso na via administrativa, pode o consumidor recorrer ao Judiciário para melhor salvaguarda dos seus direitos, sendo inúmeras as ações sobre a matéria nos juizados, número esse que tende a crescer diante da pandemia e deve ser analisado com cuidado a cada caso.

O fato é que não pode o consumidor aguardar eternamente o produto por ele adquirido e conviver longamente com o descaso do fornecedor que responde, sim, pela transportadora contratada para entrega da mercadoria ao terceirizar o serviço para conclusão do contrato.

Feitas as devidas considerações, caracterizada a falha na prestação dos serviços por parte da empresa, por força dos artigos 12 e 18 do CDC, o dever de indenizar pelo dano moral pode surgir de forma incontestável, não se podendo considerar um aborrecimento ou mero transtorno suportável, decorrente de imprevistos do dia a dia, mas, sim, inegável ofensa e abalo à esfera intima do consumidor, notadamente quando se considera a natureza do produto envolvido.

Uma ação bem elaborada e provas robustas têm sido suficientes para obter êxito nos tribunais do país, sendo válida e de extrema importância a tentativa ao menos de reparar os danos sofridos pelos consumidores que se frustram no recebimento do produto, apesar do pagamento regular da compra.

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