Opinião

Ranulfo e outras 'más influências' do IBCCRIM e da AJD

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3 de agosto de 2020, 9h15

Conheci pessoalmente Ranulfo de Melo Freire em 2013, quando fui procurar abrigo junto ao IBCCRIM após ter deixado de atuar na área criminal em razão de representação disciplinar incomodada com minha prática garantista.

Na ocasião, lembro claramente das palavras de boas-vindas de um grande amigo dele, e que acabou também se tornando um querido amigo: "O IBCCRIM é a sua casa", disse Alberto Silva Franco.

A Ranulfo e a Alberto não contive o orgulho de dizer: "Somos colegas de AJD!".

Minha convivência com Ranulfo já não podia ser muito intensa, pois aquele mineiro contador de causos, de fala mansa e muito acolhedor, estava próximo dos seus 90 anos e, mesmo com relutância, devia observar certa prudência a limitar suas participações nos círculos que nos uniam: o IBCCRIM e a AJD.

E foi justamente a comemoração de seus 90 anos que me proporcionou outro encontro muitíssimo marcante. Conheci, na ocasião, Alexandra Szafir, que não demorou muito para ter a mim e a minha esposa como convidados em deliciosos encontros em seu apartamento deliciosos, mas não menos indignados com os descasos [1] da Justiça, que frequentemente ocupavam nossas conversas.

Já de saída daquela festa, cumprimentei Edmeu Carmesini, que fora colega de Alberto e Ranulfo na famosa 5ª Câmara do antigo Tribunal de Alçada Criminal de São Paulo.

E por pouco a ocasião não serviu também para conhecer outro integrante daquele que fora o berço do garantismo judicial em São Paulo, Adauto Suannes, que, além de jurista, foi escritor e multiartista (além, é claro, de colega de IBCCRIM e AJD!). Adauto havia falecido há pouco.

Passaram-se seis anos e uma eternidade parece nos distanciar daquele aniversário de Ranulfo.

Figuras como Ranulfo são capazes de influenciar nossas trajetórias muitas vezes sem que elas se deem conta disso, e ainda que os contatos pessoais tenham sido parcos ou até mesmo inexistentes.

Devo à convivência com figuras inspiradoras no IBCCRIM e na AJD a consolidação de minha prática garantista na jurisdição penal e infracional.

Cinco anos após aquele primeiro encontro com Ranulfo, tal prática garantista me rendeu uma censura oficial.

Mas muito mais do que isso, presenteou-me com mais humanismo, talvez sempre sorrateiramente sorvido de todas essas "más influências" com as quais convivi e convivo no IBCCRIM e na AJD.

Na última quinta-feira (30/7) ficamos sem Ranulfo. Mas o legado que ele, Alexandra, Adauto e outras figuras encantadoras deixaram continuará a inspirar todos os que mantêm acesa a capacidade de se indignar com descasos e injustiças.

Porém poucos talvez consigam fazê-lo carregando tanta doçura no sorriso quanto Ranulfo.

 


[1] Tomando emprestado o título do livro escrito por Alexandra Szafir.

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