Prática Trabalhista

Julgamentos virtuais e por videoconferência na Justiça do Trabalho

Autor

  • Ricardo Calcini

    é professor advogado parecerista e consultor trabalhista. Atuação estratégica e especializada nos Tribunais (TRTs TST e STF). Coordenador trabalhista da Editora Mizuno. Membro do Comitê Técnico da Revista Síntese Trabalhista e Previdenciária. Membro e Pesquisador do Grupo de Estudos de Direito Contemporâneo do Trabalho e da Seguridade Social da Universidade de São Paulo (Getrab-USP) do Gedtrab-FDRP/USP e da Cielo Laboral.

30 de abril de 2020, 10h51

Spacca
Seguindo orientação do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), através da Portaria nº 61/20201, o Tribunal Regional do Trabalho de São Paulo da 2ª Região publicou o ATO GP de nº 8, em 27 de abril de 2020, dispondo especificamente sobre a manutenção da suspensão do expediente presencial no âmbito do TRT/SP, a retomada da contagem de prazos processuais na forma que especifica e a adoção de meios virtuais e telepresenciais para a realização de audiências e sessões de julgamento nas Varas, Turmas e Seções Especializadas, durante a vigência das medidas de isolamento social para a prevenção do contágio pelo coronavírus (COVID-19).2

O texto do referido ATO GP nº 8/2020, dentre outras providências, justifica a necessidade de adoção da medida da virtualização das sessões de julgamento e audiências em razão de diversos argumentos apropriados ao atual momento de pandemia que atinge o País, quais sejam:

  • necessidade de ampliação das medidas de isolamento, especialmente na Capital de São Paulo, conforme previsão das autoridades de saúde em razão dos atuais números de casos confirmados e suspeitos, além da taxa de isolamento social que vem caindo.
  • em razão da essencialidade do serviço jurisdicional, que possui caráter ininterrupto, e a necessidade de assegurar condições mínimas para a continuidade da prestação do referido serviço e, com isso, a retomada da realização de audiências e sessões de julgamento;
  • natureza alimentar dos créditos trabalhistas;
  • a inexistência de desrespeito à qualquer regulamentação proveniente da CNJ, uma vez que a virtualização das sessões de julgamentos e audiências garantem efetividade, segurança e afastam qualquer tipo de nulidade processual.
  • a adoção das referidas medidas possuem o devido respaldo de análises técnicas realizadas por equipes do TRT/SP, com a coordenação do Comitê Gestor Regional do Processo Eletrônico, com aval da Ordem dos Advogados do Brasil, Ministério Público do Trabalho e Procuradoria Geral do Estado de São Paulo.

Com isso, a virtualização das sessões de julgamento e audiências nas Varas do Trabalhos, Turmas e Seções Especializadas no TRT/SP, bem como as audiências designadas nos Centros Judiciários de Métodos Consensuais de Solução de Disputas (CEJUSC) em 1º e 2º Graus, começam a ser realizadas agora neste mês de maio (dias 11/5 e 18/5, respectivamente, conforme ordem prevista no ATO GP nº 8/2020), por ora sem data limite, através da Plataforma Emergencial de Videoconferência instituída pela Portaria 61/2020 pelo CNJ.

Em que pese a maioria dos operadores do Direito no ramo trabalhista já esteja familiarizada com atos judiciais eletrônicos, conjectura-se que alguns desafios serão enfrentados para a adaptação de audiência e julgamentos trabalhistas de forma satisfatória, cuja retomada dos atos processuais ocorrerá de forma gradativa, por força do retorno da contagem dos prazos processuais a partir do dia 4 de maio de 2020, exceção feita aos processos físicos.3

Nesse sentido, considerando-se que o foco do presente artigo serão os julgamentos colegiados proferidos pelas Turmas e Seções Especializadas do E. TRT/SP da 2ª Região, é importante destacar a diferenciação entre sessões de julgamentos virtuais e aquelas telepresenciais realizadas pelo sistema de videoconferência.

Com efeito, as sessões de julgamentos virtuais, não presenciais, serão realizadas pelo já conhecido “Sistema PJe”, ao qual terão acesso remoto os Desembargadores e os Juízes Convocados integrantes do respectivo órgão colegiado, bem como o representante do Ministério Público do Trabalho.

Ainda, segundo o ATO GP nº 8/2020, a duração de cada sessão virtual será de 7 (sete) dias, fixando-se as datas e horários de início e fim. Nesse período, os integrantes do Colegiado se manifestarão até o dia e horário designados para o encerramento da sessão virtual, mediante lançamento das opções de voto no PJe. Finda a sessão de julgamento virtual, a proclamação do resultado observará os critérios vigentes para as sessões presenciais, tal como previstos no Regimento Interno do TRT/SP da 2ª Região.

Lado outro, a sessão telepresencial, que se dará pela modalidade de videoconferência, ocorrerá na hipótese em que houver pedido de um dos Magistrados integrantes do Colegiado ou do representante do Ministério Público do Trabalho até o dia e horário previstos para o término da sessão virtual; ou, e aqui fica o dado mais relevante, em caso de inscrição para sustentação oral, por qualquer dos patronos das partes, quando cabível4, desde que solicitada até 48 (quarenta e oito) horas antes do horário fixado para o término da sessão virtual.

E, mais, para conferir lisura aos atos virtuais praticados, garantindo o respeito ao princípio da publicidade contido na Carta da República5, as sessões de julgamento poderão ser acompanhadas por pessoas não relacionadas às demandas, ressalvados os casos de segredo de justiça, mediante cadastro prévio como “espectador”, com antecedência mínima de 2 (dois) dias úteis antes da data da sessão. Insta salientar que, como mero observador do ato processual dos julgamentos virtuais, o acesso como “espectador” não permitirá qualquer interação com os participantes, mas resguardará o acompanhamento do evento.

E, mais, do ponto de vista operacional, os processos adiados das sessões virtuais serão incluídos em sessões telepresenciais, sempre resguardando a comunicação prévia aos interessados (partes/procuradores). Ainda, há também a possibilidade de haver objeção da parte ou do seu patrono à realização de sessão virtual, cujo pedido de inclusão do processo em sessão telepresencial será submetida à apreciação do Relator, desde que tenha concordância prévia de todas as partes.

Em tempos de pandemia por força do Covid-19, não será permitida a conversão do julgamento telepresencial, em presencial, em face da vedação prevista no art. 3º da Resolução CNJ nº 314/2020. Isso representa dizer que, na prática, as Secretarias das Turmas e das Seções Especializadas criarão salas de videoconferência, para cada sessão de julgamento telepresencial, cadastrando os participantes e com posterior comunicação às partes. O nome da sala deverá indicar a Turma e a data da pauta. Ainda, no E. TRT/SP da 2ª Região, os julgamentos, por ora, são serão gravados ou transmitidos ao vivo.6

No tocante ao uso da Plataforma Emergencial de Videoconferência para realização das sessões de julgamento, que passou a ser conhecida como Cisco Webex Meet, é certo que os advogados que farão as sustentações orais não terão a necessidade de qualquer cadastramento junto ao CNJ, sendo necessária apenas a indicação de um e-mail de contato para o encaminhamento do convite para o ato telepresencial.

Aliás, o e-mail convite a ser encaminhado a todos os participantes da sessão telepresencial por videoconferência, além de exigir a juntada de certidão aos autos, deverá trazer todas as informações registradas para a realizaão do ato: data e horário de sua realização, número da reunião (código de acesso), senha da reunião, endereço virtual com o caminho para acessar a videoconferência pela rede mundial de computadores (URL) e outros meios para contato (telefone, aplicativo ou sistema de vídeo).

E, mais, uma vez iniciada a sessão virtual, na data e horário previstos, estando incluído o Procurador do MPT, os processos serão analisados por todos os Magistrados do órgão colegiado, mantida a mesma sistemática de votação livre e possível adiamento/retirada de pauta pelos próprios Desembargadores, se assim entenderem necessário. Isso em nada muda se comparada à sistemática tradicionalmente adotada no formato presencial das sessões.

Entretanto, registre-se que a sessão virtual não comportará sustentação oral pelos advogados interessados, salvo se houver prévia manifestação de interesse7 com suas inscrições no sítio eletrônico do Tribunal8, desde que observado o prazo mínimo de 48 horas de antecedência, quando então o processo será direcionado à sala específica de sessão telepresencial que viabilizará a participação dos patronos pelo sistema de videoconferência.

Ressalte-se, uma vez mais, que o advogado inscrito para fazer a sustentação oral, bem como os demais participantes da sessão telepresencial, receberão, nos e-mails indicados no ato de inscrição, todas as informações que viabilizam o acesso à sala virtual de videoconferência no horário definido. E para garantir a publicidade dos atos jurídicos, os dados constantes do convite enviado serão, uma vez mais, transcritos em certidão juntada aos autos.

Um cuidado muito relevante a ser observado pelos advogados é que eles devem ser diligentes para garantir que suas conexões à internet sejam estáveis. Para tanto, será necessário instalar o aplicativo de acesso à Plataforma Emergencial de Videoconferência para realização sessões de julgamento (Cisco Webex Meet) em seus equipamentos de uso regular.

Entrementes, havendo impossibilidades técnicas ou de ordem prática para a realização da sessão telepresencial, faculta-se sua suspensão e designação para nova data, quer por parte dos membros da Turma ou do Ministério Público do Trabalho, quer por advogados mediante pedido e por decisão fundamentada. No caso específico das sustentações orais, caso o advogado devidamente inscrito não consiga realizar ou completar a sua intervenção por dificuldade ou indisponibilidade tecnológica dos recursos utilizados, o julgamento do processo poderá ser interrompido, com novo pregão ao final da pauta estabelecida para a data, restituindo-se integralmente o prazo legal para sustentação oral.9

Neste atual cenário, há de se tentar para o fato de que o ato da sustentação oral por videoconferência exigirá dos procuradores novas habilidades e conhecimento na área da tecnologia, o que pode demandar maiores desafios para alguns profissionais, inclusive nos quesitos socioeconômico e de faixa etária, sendo, portanto, necessário que se analise cada caso de forma individualizada, para não inviabilizar o acesso do causídico ao Poder Judiciário.

Nesse sentido, dado o momento excepcional que o País se encontra, caso haja notícia de eventuais impedimentos pontuais ocorridos por conta dos motivos elencados acima, é prudente que haja pronta assistência por parte da OAB e demais entidades de classe, a fim de auxiliar os respectivos advogados na realização satisfatória das sustentações orais por videoconferência.

Por outro lado, há também que se ressaltar os benefícios trazidos com tal medida, como economia de tempo e de recursos públicos, uma vez que procuradores e demais envolvidos para a realização dos julgamentos virtuais e telepresenciais não precisarão se deslocar, o que, para grandes cidades – a capital paulista do Estado de SP, onde está sediado, aliás, o maior Tribunal Trabalhista do Brasil, é o melhor exemplo disso -, torna-se muito benéfico.

Cabe salientar que, em outros ramos do Direto, como o Direito Penal, as audiências por videoconferência não são há muito tempo efetivas novidades, tendo sido regulamentadas desde o ano 2010 pela Resolução 105 do CNJ.

A par disso, não se vislumbra no referido ATO GP nº 8/2020 do TRT/SP da 2ª Região nenhuma afronta aos direitos e garantias constitucionais das partes e procuradores, sobretudo no tocante aos princípios do devido processo legal e ampla defesa, previstos na Constituição Federal em seu artigo 5º, LV. Não por outra razão que as sessões de julgamento telepresenciais têm valor jurídico equivalente às presenciais, asseguradas a publicidade dos atos praticados e todas as prerrogativas processuais de advogados e partes.

Claro que, de certa forma, a virtualização dos julgamentos acaba por mitigar algumas práticas do cotidiano forense, como são os casos dos despachos de memorais e os “embargos auriculares” de advogados para com os Magistrados. Aqui, aliás, fica uma importantíssima dica na elaboração mais cuidadosa dos memoriais, por meio da adoção de ferramentas e técnicas de “visual law” – a exemplo do QR CODE, os quais, além de serem protocolizados no sistema do PJe, devem ser antecedidos com uma prévia e diferenciada apresentação via e-mail institucional aos gabinetes dos respectivos julgadores.10

Por fim, embora tenha-se consciência dos desafios que serão enfrentados pela operacionalização dos julgamentos remotos, é justo contemplar a intenção destas medidas adotadas pelos órgãos jurisdicionais a fim de facilitar e agilizar o funcionamento da justiça, em busca de uma prestação jurisdicional mais célere e efetiva, sobretudo por tratar-se de créditos alimentares, tudo em consonância com a garantia da razoável duração do processo, conforme o ditame previsto pelo inciso LVIII, do artigo 5º, da Constituição Federal de 1988.


1 O Conselho Nacional de Justiça, na Portaria nº 61, de 31 de março de 2020, instituiu a Plataforma Emergencial de Videoconferência para realização de audiências e sessões de julgamento, nos órgãos do Poder Judiciário, no período de isolamento social decorrente da pandemia Covid-19, a qual foi igualmente adotada pelo Tribunal Superior do Trabalho (Ato Conjunto TST.GP.GVP.CGJT nº 159, de 6 de abril de 2020.

2 Nesse sentido: Ato Conjunto CSJT.GP.GVP.CGJT nº 005, de 17 de abril de 2020, da Resolução CNJ nº 314, de 20 de abril de 2020, e do Ato GCGJT nº 11, de 23 de abril de 2020, que exigem a adequação dos normativos expedidos no âmbito dos Tribunais.

3 Ficará suspenso o expediente presencial nos Fóruns da Justiça do Trabalho da 2ª Região, bem como no Edifício Sede onde funciona a 2ª Instância até ulterior deliberação.

4 Consoante o §2º do art. 100 do Regimento Interno do E. TRT/SP da 2ª Região, não haverá sustentação oral em agravo de instrumento, agravo regimental e embargos de declaração.

5 Nos termos do art. 5º, LX, da CRFB, a lei só poderá restringir a publicidade dos atos processuais quando a defesa da intimidade ou o interesse social o exigirem, como são os casos de segredo de justiça.

6 ATO GP nº 8/2020, art. 9º: “A funcionalidade de gravação das audiências e sessões de julgamento existente na plataforma disponibilizada pelo CNJ está sob avaliação técnica e negocial e, portanto, não deve ser utilizada até ulterior deliberação e regulamentação, que contemplará as questões afetas à edição e ao armazenamento do arquivo, bem como à necessidade de degravação. Parágrafo único. A transmissão ao vivo das sessões de julgamento, por meio das plataformas previstas no art. 3º, § 1º, do Ato GCGJT nº 11/2020, está sendo avaliada pela equipe técnica devendo, por ora, serem observadas as disposições contidas no art. 7º, § 2º desta norma, até sua efetiva implantação”.

7 Fica sem efeito, durante o período de pandemia do Covid-19, o “caput” do art. 100 do Regimento Interno do TRT/SP da 2ª Região, ao asseverar que “o direito à sustentação oral independe de prévia inscrição, bastando que o Advogado esteja presente no início da sessão e oralmente o requeira”.

8 https://ww2.trt2.jus.br/servicos/acesso-online/sustentacao-oral/

9 RI do TRT/SP da 2ª Região, art. 100, §1º: “A sustentação oral será feita pela ordem de recorrente e recorrido; havendo recurso de vários litigantes, falará primeiro o autor. Havendo litisconsortes representados por mais de um Advogado, o tempo será computado em dobro e distribuído proporcionalmente entre eles.”.

10 Para maiores informações sobre “Boas Prática da Advocacia nos Tribunais (TRT´s)”, sobretudo neste período de coronavírus, acesse o site https://www.ricardocalcini.com/curso

Autores

  • Brave

    é mestre em Direito pela PUC-SP, professor de Direito do Trabalho da FMU, especialista nas Relações Trabalhistas e Sindicais, organizador do e-book digital "Coronavírus e os Impactos Trabalhista" (Editora JH Mizuno), palestrante e instrutor de eventos corporativos "in company” pela empresa Ricardo Calcini | Cursos e Treinamentos, especializada na área jurídica trabalhista com foco nas empresas, escritórios de advocacia e entidades de classe.

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