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Epidemia exige medidas excepcionais no Direito de Família, dizem especialistas

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30 de abril de 2020, 15h21

Como ocorre nas relações de trabalho, contratuais e econômicas, as regras do Direito de Família e Sucessões também foram afetadas pela pandemia do coronavírus. A análise de especialistas no tema é de que o momento exige medidas excepcionais para manutenção da segurança jurídica e funcionamento do país. 

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O tema foi pauta do sétimo programa da série As Regras Emergenciais em Tempos de Covid-19, transmitido pela TV ConJur nesta quinta-feira (30/4).

De acordo com o ministro Antonio Carlos Ferreira, do Superior Tribunal de Justiça, o CNJ esteve na vanguarda ao baixar a Recomendação 62 que, dentre outras coisas, orientou a prisão domiciliar para devedores de pensão enquanto durar a epidemia.

As mudanças pedidas no Judiciário, segundo ele, podem ser vistas em números: o STJ tem até agora um acórdão no âmbito criminal e outras 2.988 decisões monocráticas indexadas com a palavra coronavírus, sendo 68 de Direito Público e 48 de Direito Privado. 

O ministro destacou um Habeas Corpus coletivo impetrado pela Defensoria Pública para pedir que todos os presos devedores de alimentos no Ceará cumprissem pena em regime domiciliar. A medida foi concedida pelo ministro Paulo de Tarso Sanseverino, do STJ, e depois estendida para todo o país

“Com base nessa recomendação do CNJ, as Defensorias Públicas coordenaram a impetração dos HCs. Embora muitos questionem a efetividade desta prisão domiciliar, é certo que trata de medida excepcional e temporária. Em tempos de escassez, são necessárias decisões trágicas ou a opção pelo mal menor”, afirmou.

Ainda sobre o HC coletivo, a desembargadora Ivanise Tratz Martins, do TJ do Paraná, disse que embora haja grande crítica quanto a  efetividade do cumprimento pelo devedor de alimentos em relação aos valores que ele deve, é preciso separar o joio do trigo. "Nós temos 'maus' diferentes. Deixar o pai devedor de alimentos, que não é um criminoso, em cárcere privado, só vai transformá-lo em mais um vetor de contaminação."

A magistrada defendeu a importância de respeitar os ritos da expropriação ou da coerção, em que se decreta prisão civil. "O que tem acontecido são magistrados determinarem, de ofício, a alteração do rito, o que afronta a jurisprudência do STJ", disse. Ela afirmou que mesmo em tempos de coronavírus é preciso ficar claro que "não haverá ato revisional que exonere a obrigação de pagar os alimentos". 

De acordo com a Ivanise, os magistrados tem criado situações diferenciadas e há certa dificuldade em termos de qualidade do monitoramento, como o uso da tornozeleira eletrônica. "Uma delas seria suspender a ordem de prisão. Entendo ser possível fazer isso, desde que a prisão não tenha sido decretada, nem cumprida. Já sobre revogar a prisão, dentro do contexto que estamos vivendo, não seria adequado. Neste caso, somos obrigados a seguir tanto a Recomendação 62 quanto a liminar do ministro Sanseverino", explicou.

Regime de famílias e guardas
Guilherme Calmon Nogueira da Gama
, desembargador do TRF da 2ª região, explicou a necessidade de conscientização dos pais em relação à guarda compartilhada. "Em tempos de pandemia, a guarda pode vir a gerar problemas e riscos não só à própria criança e adolescente, como também à idosos que convivem com os genitores".

Ele citou como exemplo o tribunal do Rio de Janeiro que baixou uma resolução para autorizar que os juízes das varas de família façam sessões de mediação por videoconferência. Para ele, "é preciso usar instrumentos como o contato em plataformas e celulares, além de mecanismos tecnológicos para auxiliar o trabalho".

De acordo com o magistrado, até mesmo alguns acordos anteriores ao período de pandemia ou imposição por sentenças "podem ser tratadas neste momento como período excepcional de férias em relação a um dos genitores. O que não pode acontecer de jeito nenhum é a falta de contato da criança com os ambos genitores, bem como outros parentes que a criança tem carinho especial, como avós". 

Já o professor da USP Carlos Alberto Dabus Maluf chamou a atenção para o fato de que muitos devedores de dívida alimentícia estão alegando que perderam emprego, então está havendo excessiva onerosidade. "Deve haver cuidado, pois se pedir a exoneração, pode beirar má-fé. Tenho acompanhado os pedidos de revisão de alugueis e geralmente estão pedindo a redução do aluguel e não simplesmente o não pagamento."

De acordo com o professor, é preciso estar atento para aquilo que diz o Código Civil sobre caso fortuito e força maior: "não é a imprevisibilidade que caracterizaria o caso fortuito, mas sim a inevitabilidade".

O seminário foi mediado pelo professor da USP Otavio Luiz Rodrigues Jr., também conselheiro do CNMP. O evento tem patrocínio da JBS e apoio da Rede de Pesquisa de Direito Civil Contemporâneo.

Assista ao seminário abaixo:

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