Opinião

Créditos do PIS e da Cofins durante a pandemia da Covid-19

Autores

  • Daniel Soares Gomes

    é advogado atuante nas áreas de Direito Tributário Comércio Exterior Aduaneiro e Societário do escritório David & Athayde Advogados mestrando em Ciências Contábeis pela Universidade Federal do Espírito Santo (UFES) e especialista em Direito Tributário pela Faculdade de Direito de Vitória (FDV).

  • Augusto Mansur

    é advogado atuante na área tributária sócio do Neffa Mansur & Fafá Advogados Associados e mestre em Direito pela Universidade Federal do Espírito Santo (UFES).

25 de abril de 2020, 7h03

O que sejam insumos da atividade empresarial para fins de tomada de crédito do PIS e da Cofins é tema sempre controverso nos debates de direito tributário. A atividade econômica é dinâmica, motivo pelo qual as empresas estão a todo momento respondendo aos estímulos externos do mercado, sejam inovações tecnológicas, dinâmicas de consumos ou até mesmo fatores extraordinários, como uma pandemia global.

Diante do quadro de pandemia provocado pelo coronavírus (Covid-19), toda a sociedade vem se esforçando, em conjunto, para conter a disseminação da doença, no intuito de garantir coletivamente a saúde dos indivíduos.

O sistema jurídico nacional estabelece que a saúde é direito fundamental do ser humano (artigo 6º, caput, da CRFB/88), devendo o Estado prover as condições indispensáveis ao seu pleno exercício. Porém, a CRFB/88 também deixa claro que o dever do Estado "não exclui o das pessoas, da família, das empresas e da sociedade" (artigo 2º, § 2º da Lei 8.080/90 [1]).

E, por isso, o Estado vem regulamentando o papel das empresas no combate à pandemia, indicando quais são as medidas de segurança necessárias para conter o avanço do vírus, como fornecimento de lavatórios com água e sabão, toalhas descartáveis e álcool em gel, ou ainda recomendando a realização de trabalhos a distância, que implica no fornecimento dos equipamentos necessários ao desempenho da função às custas do empregador, pois são condições para o exercício de sua atividade.

Os veículos normativos introdutores dessas determinações são diversos, podendo ser tratadas em lei em sentido estrito, normas técnicas, portarias e instruções normativas, entre outras.

Como exemplo: o Ministério Público do Trabalho editou a nota técnica (02/2020 — PGT/Codemat/Conap) com recomendações para as empresas. O governo do estado da Bahia dispôs na Lei nº 14.258 de 13/04/2020 a obrigatoriedade de uso e fornecimento de materiais para o enfrentamento da pandemia. E ainda o governo do estado do Espírito Santo editou a Portaria Sessa Nº 62-R de 6/4/2020, com orientações gerais a serem adotadas por estabelecimentos industriais no Espírito Santo, visando a práticas de segurança no enfrentamento do novo coronavírus.

Esses gastos para atender às recomendações ou imposições normativas do poder público refletem a necessidade do empresário em responder as mudanças externas que afetam o desenvolvimento da atividade empresarial.

Dessa forma, parece pertinente avaliar a possibilidade de descontos de créditos decorrentes de imposições legais para combater a atual pandemia.

O creditamento de valores calculados sobre os insumos da atividade empresarial prevista na apuração das contribuições de PIS e Cofins do regime não cumulativo foi definido pelo Superior Tribunal de Justiça no julgamento do RESP 1.221.170/PR, estabelecendo que o conceito de insumo deve ser verificado sob a ótica da essencialidade ou relevância do item para atividade empresarial.

O critério da relevância ficou estabelecido como aquele item cuja finalidade, embora não indispensável à elaboração do próprio produto ou à prestação do serviço, integre o processo de produção, seja pelas singularidades de cada cadeia produtiva, seja por imposição legal.

Gastos decorrentes de imposição legal tenderiam a estar restritos àquelas obrigações decorrentes de uma lei complementar ou ordinária, vetores normativos aptos a instituir, majorar ou definir tributos e seus fatos geradores, nos termos do artigo 97 do Código Tributário Nacional.

Contudo, a imposição de algum item previsto na legislação possui espectro mais amplo, podendo estar previstos em regulamentos, decretos, instruções normativas, portarias, resoluções, TAC’s e notas técnicas, entre outros.

No julgamento da Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça, o item considerado relevante em razão da imposição legal foram os equipamentos de proteção individual (EPIs) exigidos nas normas regulamentadoras, destinados a viabilizar a atuação da mão de obra.

Em outros casos, a própria Receita Federal vem permitindo o desconto de créditos decorrentes de outros atos normativos, como no processo nº 13963.000564/2005­29 [2], que considerou regular o aproveitamento de créditos decorrentes de itens tomados para cumprimento das condições ambientais impostas pelo Poder Público por meio de Acordo Judicial  de Conduta  e  Termos  de  Ajuste  de  Conduta (TAC’s).

Ou seja, muito embora tenham sido definidos como relevante os gastos e as despesas decorrentes de "imposição legal", os fundamentos e itens descritos e analisados dizem respeito a dispêndios decorrentes da "legislação" em geral, próximos ao conceito definido pelo Código Tributário Nacional em seu artigo 96 [3].

Assim, dispêndios decorrentes da legislação, em geral, poderiam ser descontados como créditos para fins de apuração do PIS e Cofins, considerando os demais requisitos previstos na legislação tributária.

No atual contexto, os gastos decorrentes das imposições do poder público para combate a disseminação do novo coronavírus (Covid-19) devem ser avaliados para findes de desconto de créditos para apuração do PIS e do Cofins não cumulativo, posto que podem decorrer de imposições normativas da legislação em geral.

E não é só, a dinâmica atual das relações humanas que vem sendo alterada pela atual crise epidemiológica deve ser acompanhada pelas empresas, considerando que itens irão passar a ter uma essencialidade e/ou relevância em função das mudanças que a sociedade vem sofrendo.

Dessa forma, a par do que já mudou, mais mudanças deverão acontecer por imposição legal para o combate à Covid-19, ensejando a possibilidade de novas tomadas de créditos de PIS e de Cofins em relação aos gastos pertinentes e às imposições legais com tal finalidade de saúde pública. De modo que será necessário aos contribuintes acompanhar tal dinâmica jurídica e seus efeitos tributários para a melhor adequação de suas atividades.

 


[1] Art. 2º A saúde é um direito fundamental do ser humano, devendo o Estado prover as condições indispensáveis ao seu pleno exercício.

§ 1º O dever do Estado de garantir a saúde consiste na formulação e execução de políticas econômicas e sociais que visem à redução de riscos de doenças e de outros agravos e no estabelecimento de condições que assegurem acesso universal e igualitário às ações e aos serviços para a sua promoção, proteção e recuperação.
§ 2º O dever do Estado não exclui o das pessoas, da família, das empresas e da sociedade.

[2] Processo nº 13963.000564/2005­29 – Insumo dedutível para efeito de Cofins não cumulativa  é todo aquele relacionado direta ou indiretamente com produção do contribuinte e que afete as receitas tributadas pela contribuição social. E quando o cumprimento das obrigações ambientais impostas pelo Poder Público, como condição para funcionamento da empresa, gere despesas estas ser consideradas insumo.

[3] Art. 96. A expressão "legislação tributária" compreende as leis, os tratados e as convenções internacionais, os decretos e as normas complementares que versem, no todo ou em parte, sobre tributos e relações jurídicas a eles pertinentes.

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    é advogado atuante nas áreas Tributária, Comércio Exterior, Aduaneiro e Societário do escritório David & Athayde Advogados, e mestrando em Ciências Contábeis pela Universidade Federal do Espírito Santo (UFES).

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    é advogado atuante na área tributária, sócio do Neffa, Mansur & Fafá Advogados Associados e mestre em Direito pela Universidade Federal do Espírito Santo (UFES).

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