Interesse público

Paralisia decisória, nepotismo e a pandemia da Covid-19

Autor

  • Paulo Modesto

    é professor da Faculdade de Direito da Universidade Federal da Bahia (UFBA) presidente do Instituto Brasileiro de Direito Público membro do Ministério Público da Bahia da Academia de Letras Jurídicas da Bahia e do Observatório da Jurisdição Constitucional da Bahia.

16 de abril de 2020, 8h30

Spacca
Paralisia Decisória em Tempos de Crise
Em períodos de crise a história acelera e múltiplas decisões devem ser adotadas pela Administração Pública e por agentes privados. Paradigmas tradicionais de administrar, bilaterais e simplórios, mostram-se ineficazes diante de relações poligonais, envolventes de diversos agentes, centros de poder e interesses públicos e privados, que disputam recursos escassos. Em tempos de grave incerteza, com a rápida dissolução da rotina, agentes burocráticos simplesmente paralisam ante a complexidade técnica e política dos litígios e, outros, diante dos novos desafios, adotam postura de negação, isto é, recusam-se a reconhecer a ocorrência de eventos relevantes e que exigem decisão imediata. Essa paralisia decisória é um tema importante para o direito administrativo.

Na administração pública, práticas clientelistas, como o loteamento de cargos estratégicos com pessoal sem vocação de liderança, muitas vezes sem nível superior ou formação técnica suficiente, agravam a crise, pois momentos extraordinários não suportam apenas a continuidade da rotina. Em momentos de pandemia ou medo pandêmico, o “código do fracasso” (de Dromi) converte-se em “código de tragédia”[1].

Essa é a primeira questão que um olhar atento sobre a crise atual não pode desconsiderar: não se pode mais aceitar como juridicamente legítima a improvisação de lideranças administrativas. Aceitar a nomeação de secretários(as) de saúde que nada entendem de medicina, que não são médicos(as), biólogos(as), enfermeiros(as) ou administradores (as) especializados, mas simplesmente familiares da autoridade política. Em momentos de emergência sanitária e humanitária fica evidente a intolerabilidade da nomeação de autoridades administrativas ou político-administrativas sem preparo técnico para funções que exigem liderança técnica, convocadas unicamente a partir de relações de parentesco ou vínculos circunstanciais, que na crise simplesmente cruzam os braços ou vociferam frivolidades. A credibilidade da Administração Pública sucumbe quando o cidadão não localiza nos cargos de direção técnica agentes preparados para atender aos desafios da liderança.

Pode surpreender alguns, mas neste país continental, em cidades grandes e pequenas, é comum encontrar secretários de saúde sem formação técnica e é possível que isto esteja ocorrendo em plena crise sanitária. Há secretários de saúde com apenas segundo grau, sem noções mínimas de administração ou medicina, mas que precisam coordenar hospitais e centros de saúde, comandar equipes de atendimento e socorro, apenas com um carimbo na testa: são irmãos, sobrinhos, maridos, esposas, filhos e filhas de agentes políticos. Foram nomeados livremente e defendem a lisura da nomeação administrativa familiar, unilateral e discricionária, sob o argumento de ocuparem cargos políticos, embora não tenham sido eleitos para cargo algum. Invocam precedentes do STF e afirmam que contra as suas designações não se pode aplicar a Súmula Vinculante 13 (Antinepotismo) ou qualquer princípio republicano da Constituição Federal. [2]. De fato existem precedentes, mas é uma leitura simplificada, falsa e injuriosa ao Supremo Tribunal afirmar que o órgão autoriza qualquer espécie de farra administrativa familiar de primeiro escalão.

Nepotismo em Cargos Político-Administrativos em Repercussão Geral (Tema 1000)
Em agosto de 2008, sob a Presidência do Min. GILMAR MENDES, com fundamento direto nos princípios da impessoalidade, igualdade, eficiência e moralidade enunciados expressamente na cabeça do art. 37 da Constituição da República, no princípio republicano e em três precedentes da Corte[3], o STF editou Súmula Vinculante proibindo a nomeação de cônjuges, companheiros e parentes até o terceiro grau para os cargos comissionados ou funções gratificadas nos três Poderes, inclusive mediante designações cruzadas, com o seguinte teor:

“A nomeação de cônjuge, companheiro ou parente em linha reta, colateral ou por afinidade, até o terceiro grau, inclusive, da autoridade nomeante ou de servidor da mesma pessoa jurídica, investido em cargo de direção, chefia ou assessoramento, para o exercício de cargo em comissão ou de confiança, ou, ainda, de função gratificada na Administração Pública direta e indireta, em qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos municípios, compreendido o ajuste mediante designações recíprocas, viola a Constituição Federal.”

A Súmula Vinculante n. 13 não pretendeu esgotar todas as hipóteses de nepotismo[4] ou enunciar qualquer autorização para o provimento administrativo unilateral e discricionário de cargos de primeiro escalão do Poder Executivo com finalidade de favorecimento familiar.[5]

Porém, a SV13 constituía uma norma, elaborada a partir de precedentes da Corte e, como toda norma, foi objeto de interpretações diversas na intimidade do próprio STF. Algumas decisões estabeleceram exceções à proibição enunciada ou restringiram os seus limites. A mais grave das ressalvas foi germinada nas primeiras decisões da Corte sobre o tema nepotismo, a partir de uma distinção ausente do enunciado da súmula entre o favorecimento familiar de agentes no provimento de cargos administrativos e no provimento de “cargos políticos” ou “político-administrativos” (STF, RE 579.951/RN, Rel. Min. RICARDO LEWANDOWSKI; Rcl 6650 MC-AgR/PR, Rel. Min. ELLEN GRACIE; Rcl 7.590-MC/PR, Rel. Min. MENEZES DIREITO).

Segundo essa interpretação, difundida amplamente sem os matizes presentes nos debates da Corte, a SV 13 seria aplicável apenas a funções de confiança e cargos em comissão puramente administrativos, de livre nomeação e livre exoneração. O provimento de cargos políticos, mesmo os não eletivos, não sofreria as limitações da proibição de nepotismo. É dizer: cargos de secretários municipais, secretários estaduais, ministro de estado, situados no cume da administração pública, poderiam ser titularizados por parentes imediatos do governante, sem a possibilidade de se qualificar o respectivo ato de designação como inválido por nepotismo.[6]

Para exemplificar de forma simples: o Prefeito Municipal não poderia nomear a sua esposa para o cargo de diretora de estabelecimento escolar, mas poderia nomeá-la para Secretária Municipal de Educação. Não poderia nomear o irmão motorista, mas poderia nomeá-lo Secretário de Transportes. Não poderia nomear o filho estudante de medicina diretor de hospital, mas poderia nomeá-lo Secretário de Saúde.

É equívoco afirmar, porém, que o STF tenha admitido a nomeação irrestrita de parentes para cargos de primeiro escalão da administração pública brasileira. A Corte, ao tratar da matéria, assentou em diversos julgados reservar-se a apurar caso a caso situações de abuso, nepotismo cruzado e falta de razoabilidade em designações de primeiro escalão, inclusive eventual ausência de qualificação técnica dos nomeados como indicativo de fraude à lei e aos princípios da impessoalidade, moralidade e eficiência na administração pública (STF, Rcl 8625/MG, Rel. Min. ELLEN GRACIE, J. 01/12/2009; Rcl 6938 MC/MG, Rel. Min. CÁRMEN LÚCIA, j. 22/08/2011; Rcl 11605 MC / SP, Rel. Min. CELSO DE MELLO, j. 29/06/2012; Rcl 14.497 MC, Rel. Min. JOAQUIM BARBOSA, j. 11/10/2012) Trata-se de orientação que atenua o problema, mas é evidentemente imprópria para uma Suprema Corte, que não deve cuidar de avaliar situações concretas [7], cumprindo-lhe antes fixar critérios gerais e objetivos de aplicação da Constituição Federal na matéria.

Com o tempo e a sucessão de abusos, alguns Ministros em decisões de turma passaram a recusar explicitamente, para efeitos de censura por nepotismo, a relevância da distinção entre cargo administrativo/cargos político-administrativo, e a proclamar inválidas as nomeações familiares para cargos de primeiro escalão independentemente da análise concreta de aptidão técnica ou presença de fraude ou nepotismo cruzado nas nomeações. Essas decisões ora invocavam diretamente os princípios republicanos da impessoalidade, da eficiência e da moralidade, implícitos na Súmula Vinculante 13[8], ora recusavam qualquer ressalva expressa a essas hipóteses na Súmula.[9]

Hoje a situação é de incerteza jurídica e quase loteria na Corte. Para alguns, a Constituição autoriza ampla liberdade para a designação unilateral dos agentes de primeiro escalão da administração pública e a SV 13 não os abrange; para outros, a Súmula 13 não cuida do tema, tendo sintetizado restrições apenas ao provimento de cargos administrativos simples, podendo ser objeto de reformulação ou alteração para abranger outras hipóteses; outros ainda, consideram a SV abrangente dos provimentos administrativos de primeiro escalão desde sempre, pois sintetiza princípios republicanos que colhem a todos os agentes públicos. A própria extensão do conceito de cargo político é problemática [10]

A decisão uniforme dessa matéria sensível parece estar mais próxima. Em 19/02/2020 voltou ao Gabinete do Relator, Min. LUIZ FUX, já com todos os pareceres e informes cabíveis, os autos do RE 1133118, para fixação em Plenário do STF da legitimidade constitucional ou não da exclusão, em lei, do conceito de nepotismo para designação de cargos de primeiro escalão na administração pública. Em 15/06/2018 o Tribunal, por unanimidade, reconheceu a existência de repercussão geral para a questão constitucional suscitada, que passou a ser o Tema 1000 na lista da Corte [11]. A decisão do caso terá efeito vinculante e fulminará, espera-se, a situação atual de insegurança jurídica para os gestores e para os próprios órgãos de controle. É um tema que merece atenção de todos, especialmente neste momento em que a credibilidade do poder público é essencial para a própria proteção da saúde pública.

Em uma democracia, a decisão política de escolha de representantes deve ser livre e soberana, pois o titular da soberania é o povo. Ainda assim a liberdade não é plena, pois a própria Constituição Federal impede a criação e manutenção de partidos políticos que contravenham ao regime democrático, violem os direitos fundamentais da pessoa humana ou a soberania nacional, recebam recursos financeiros de governos estrangeiros ou utilizem organizações paramilitares. Mas as decisões administrativas subseqüentes, emitidas por governantes, estas devem estar sujeitas a limites e a escrutínio jurídico ainda mais rigoroso. É erro confundir eleição (forma de provimento vinculado) com nomeação unilateral (forma de provimento discricionário). Eleição respeita-se, observada a lisura do procedimento de escolha e exigências democráticas elementares; nomeação é ato administrativo vinculado a fins, o que em uma República significa observância de limites materiais incontornáveis. Exigências materiais que não se compatibilizam com o favorecimento de interesses domésticos na gestão pública, que contrastam com práticas que já deveriam estar superadas, por serem incompatíveis com a promoção da confiança pública.


1 Recordo aqui o conhecido “código do fracasso”, que ROBERTO DROMI utilizou para explicar como alguns setores da administração pública argentina haviam se convertido em “caras máquinas de impedir”: “Artigo primeiro: não pode. Artigo segundo: em caso de dúvida, abstenha-se. Artigo terceiro: se é urgente, espere. Artigo quarto: sempre é mais prudente não fazer nada”. Ver DROMI, Roberto. Derecho Administrativo. 4. ed. Buenos Aires: Ciudad Argentina, 1995. p. 35.

2 Não são hipóteses acadêmicas. Em diversos precedentes do STF o cargo de Secretário de Saúde, que mobiliza recursos expressivos, era o locus do questionamento. Ver, por exemplo, Rcl 26448 / RJ, Rel. Min. EDSON FACHIN, j. 12/09/2019 (nomeação do pai do vice-prefeito da cidade para o cargo de Secretário Municipal de Saúde); Rcl 33818 / MG, Rel. Min. RICARDO LEWANDOWSKI, j. 01/04/2019 (filha do Prefeito nomeada Secretária Municipal de Saúde); RE 579.951, Pleno, DJe 24.10.2008, Rel.Min. RICARDO LEWANDOWSKI (irmão de Vereador nomeado Secretário Municipal de Saúde); Rcl 26424 MC/RN, Rel. Min. MARCO AURÉLIO, J. 28/06/2018 (filho do Prefeito nomeado Secretário de Saúde). Os exemplos poderiam ser multiplicados à exaustão.

3 Cf. ADC 12, Rel. Min. AYRES BRITTO, Tribunal Pleno, julgamento em 16/2/2006, DJ de 1º/9/2006; MS 23.780, Rel. Min. JOAQUIM BARBOSA, Tribunal Pleno, julgado em 28/09/2005, DJ 3/3/2006; RE 579.951 RG, Rel. Min. RICARDO LEWANDOWSKI, Tribunal Pleno, julgado em 20/08/2008, Dje de 24/10/2008, Tema 66.

4 “A redação do enunciado da Súmula Vinculante 13 não pretendeu esgotar todas as possibilidades de configuração de nepotismo da Administração Pública, uma vez que a tese constitucional nele consagrada consiste na proposição de que essa irregularidade decorre diretamente do caput do art. 37 da Constituição Federal, independentemente da edição de lei formal sobre o tema” (STF, Rcl 15.451 AgR, Rel. min. DIAS TOFFOLI, P, j. 27-2-2014, DJE 66 de 3-4-2014).

5 Cf. Rcl 12.478 MC, rel. min. JOAQUIM BARBOSA, dec. monocrática, j. 3-11-2011, DJE 212 de 8-11-2011; RCL 26424 MC/RN, Rel. Min. MARCO AURÉLIO, Julgamento: 04/09/2018, DJe-188 DIVULG 06/09/2018.

6 Tratei com maior detalhe do tema em artigo escrito em 2012 e publicado em 2013 na coletânea organizada em homenagem a MARIA SYLVIA ZANELLA DI PIETRO: MODESTO, Paulo. Nepotismo em Cargos Político-Administrativos. In: MARQUES NETO, Floriano; MENEZES DE ALMEIDA, Fernando Dias; NOHARA, Irene Patrícia e MARRARA, Thiago (organizadores). Direito e Administração Pública. São Paulo: Atlas, 2013, pp. 260-298. O texto integral do artigo está disponível também na web: https://www.academia.edu/7789409 (Acesso em 15/04/2020).

7 Cf. “Ementa: Direito Administrativo. Agravo interno em reclamação. Nepotismo. Súmula Vinculante 13. 1. O Supremo Tribunal Federal tem afastado a aplicação da Súmula Vinculante 13 a cargos públicos de natureza política, ressalvados os casos de inequívoca falta de razoabilidade, por manifesta ausência de qualificação técnica ou inidoneidade moral. Precedentes. 2. Não há nos autos qualquer elemento que demonstre a ausência de razoabilidade da nomeação. 3. Agravo interno a que se nega provimento.” (Rcl 28024 AgR, Relator(a): Min. ROBERTO BARROSO, Primeira Turma, julgado em 29/05/2018, DJe-125 DIVULG 22-06-2018, PUBLIC 25-06-2018).Cf. também Rcl 23.131 AgR, Rel. Min. LUIZ FUX, Primeira Turma, DJe 18/04/2017).

8 EMENTA: CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. AGRAVO REGIMENTAL EM RECLAMAÇÃO. NEPOTISMO. SÚMULA VINCULANTE N. 13. CONCEITO DE PARENTESCO DO CÓDIGO CIVIL. INAPLICABILIDADE. PRINCÍPIO DA IMPESSOALIDADE. CARGO DE NATUREZA POLÍTICA. SERVIDOR COM VÍNCULO EFETIVO. CONFLITO DE INTERESSE CONFIGURADO. APLICABILIDADE DA SÚMULA. AGRAVO REGIMENTAL A QUE SE NEGA PROVIMENTO. 1. O nepotismo subverte os valores que devem pautar o desempenho das funções administrativas. Ao invés de se avaliar a pessoa subordinada à autoridade nomeante por critérios de eficiência, privilegiam-se critérios alheios ao bom desempenho da Administração. 2. A proibição ao nepotismo decorre diretamente dos princípios da impessoalidade, da moralidade e da eficiência e é evidente que eles também incidem sobre os chamados cargos políticos. Quanto mais próximo da legitimidade do voto popular, maior a responsabilidade do governante para afastar qualquer conflito de interesse que possa macular sua atuação. Quanto mais alto o cargo, maior deve ser a exigência pela obediência incondicional à Constituição e a seus princípios. 3. Quando a nomeação para cargo ou a designação para função recai sobre servidor que tem relação de parentesco ou relação íntima com a autoridade nomeante, há incidência da Súmula Vinculante n. 13, mesmo se houver vínculo efetivo, pois, nesses casos, tal como se dá com a nomeação de quem não o tem, o exercício do cargo passa a atender critérios que não são exclusivamente públicos e a confiança que se deve ter no desempenho da função pública é prejudicada. 4. O conceito de parentesco para efeitos da incidência da Súmula não coincide com o do Código Civil, pois o problema não é de definir quais são os parentes para efeitos civis, mas definir quais aquelas pessoas que, sob a classe de parentela, tendem a ser escolhidas, não por interesse público, mas por interesse de caráter pessoal. Precedentes. 5. Agravo regimental a que se nega provimento. Rcl 26448 AgR, Relator(a): Min. EDSON FACHIN, Segunda Turma, julgado em 20/12/2019, DJe-023 DIVULG 05-02-2020)

9Voto vencido do Min. MARCO AURÉLIO na Recl. 6650 MC-AgR/PR. E esse tem sido o seu entendimento, mantido em decisões monocráticas ao longo do tempo, por exemplo RCL 26424 MC/RN, Rel. Min. MARCO AURÉLIO, Julgamento: 04/09/2018, DJe-188 DIVULG 06/09/2018.

10 O conceito de cargo político no Brasil não é preciso ou unívoco. Admite inteligência doutrinária e jurisprudencial ampla ou restritiva. No texto Nepotismo em Cargos Político-Administrativos, de 2012, sugiro que o regime jurídico dos cargos políticos não é uniforme: há cargos políticos de provimento vinculado (v.g. cargos político-representativos, como os deputados, e cargos a que se acende por concurso público, como os juízes e promotores); cargos políticos de provimento condicionado ou compartilhado entre mais de um órgão (cargos político-funcionais, a exemplo dos embaixadores) e cargos de provimento unilateral e precário (cargos político-administrativos, a exemplo dos secretários e Ministros de Estado). Nos dois últimos casos, os cargos político-funcionais e cargos político-administrativos, a apuração sobre desvio na escolha do governante é sempre cabível, sendo possível cogitar inclusive de situações típicas de desvio de finalidade e ilegitimidade constitucional por nepotismo. Os cargos político-representativos não suscitam o tema do nepotismo por ser a eleição forma de provimento vinculado. E não se diga que esta diferenciação com base no provimento é artificial ou acadêmica. O STF tem atuado em casos paradigmáticos em matéria de provimento – por exemplo, em 2016, decisão do Ministro GILMAR MENDES no MS 34.070, considerou hipótese de “desvio de finalidade” e sustou nomeação do Ex-Presidente Lula como Ministro Chefe da Casa Civil (cargo político-administrativo típico, de provimento unilateral e precário); em 2017, na Reclamação (RCL) 26303, o Ministro MARCO AURÉLIO suspendeu decreto do Prefeito do Município do Rio de Janeiro, MARCELO CRIVELLA, que nomeava seu filho MARCELO HODGE CRIVELLA, para o cargo de secretário chefe da Casa Civil da Prefeitura. E muitas outras decisões poderiam ser referidas (v.g. Rcl8.625-ELLEN GRACIE, DJe 26.4.2010; RCL6.938 MC/MG-CÁRMEN LÚCIA, DJE 02/09/2011; Rcl 12.478-MC/DF, JOAQUIM BARBOSA).

11 Inteiro teor da decisão está disponível através do link: http://stf.jus.br/portal/processo/verProcessoPeca.asp?id=314646429&tipoApp=.pdf

Autores

  • é professor da Faculdade de Direito da Universidade Federal da Bahia (UFBA), presidente do Instituto Brasileiro de Direito Público e membro do Ministério Público da Bahia e da Academia de Letras Jurídicas da Bahia.

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