Opinião

A pandemia do coronavírus e a revolução digital no Poder Judiciário

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13 de abril de 2020, 9h52

Da sua origem até o período contemporâneo, o processo judicial sofreu transformações, adequando-se a mudanças e necessidades sociais, surgindo, por consequência, novos mecanismos de efetivação da Justiça.

Nesse cenário de evolução social, o uso da informática e de meios eletrônicos na busca de melhores resultados de prestação jurisdicional apresenta-se como solução para dois dos maiores problemas do Poder Judiciário, que são a morosidade e o número ascendente de demandas judiciais.

Um movimento de desmaterialização iniciou-se no final do século passado, ganhando impulso, ao longo dos anos, com a substituição de listas telefônicas por portais de busca na internet e a troca do CD-ROM por downloads de músicas em portais como o iTunes.

Os recursos tecnológicos possibilitaram uma terceira onda de avanço na prestação jurisdicional, que, depois da escrita e a impressa, tem revolucionado o Poder Judiciário, promovendo a substituição do produto físico (papel e tinta composto de átomos) pelo digital (composto de bits), com a adoção do processo eletrônico, o que se mostrou um caminho irreversível para todos os órgãos do mencionado poder, os quais, seja pela opção de um software livre ou um proprietário, já desmaterializaram a quase totalidade dos processos em curso com a entrada das novas petições exclusivamente pela via digital.

Com a pandemia do novo coronavírus (Covid-19), essa terceira onda, que vinha em uma crescente gradativa, assume a força de um tsunami, com diversos órgãos do Poder Judiciário, inclusive o Conselho Nacional de Justiça (CNJ), editando atos normativos para a execução de suas atividades em ambiente virtual.[1]

A natureza das emergências, a exemplo da Covid-19, faz com que processos históricos avancem rapidamente. O escritor israelense Yuval Harari afirma que, em situações emergenciais, "as decisões que em tempos normais podem levar anos de deliberação são aprovadas em questão de horas. Tecnologias imaturas e até perigosas são colocadas em serviço porque os riscos de não fazer nada são maiores".[2]

Essa revolução é observada, no âmbito do Poder Judiciário, com a utilização em larga escala de teletrabalho, audiências, sessões, reuniões e casamentos virtuais, atendimento remoto e comunicação de atos eletronicamente.

Não que essas medidas, em sua grande maioria, deixassem de ser adotadas, mas o processo de virtualização do Poder Judiciário dá um salto de anos com a utilização em larga escala de todas as potencialidades que o processo eletrônico pode oferecer.

O sistema de audiências por videoconferência, utilizado pontualmente, em especial para processos com réu preso, objetivando evitar seu deslocamento, passou a ser adotado nas mais variadas classes processuais.

O emprego dos aplicativos WhatsApp, Google, Hangouts e Zoom é regulamentado por diversos tribunais, permitindo a realização de audiências de conciliação, admonitórias, transação penal, suspensão condicional do processo, homologação de acordo de não persecução penal, justificação, acolhimento, saneamento e instrução.

Criaram-se salas virtuais para garantir a entrevista reservada entre o réu e o advogado/defensor, permitindo o acesso apenas a ambos, com a oportunidade de o réu conversar e sanar dúvidas sobre o processo antes, durante e após a audiência.

A despeito de, há quase duas décadas, a Lei 10.259/2001 admitir reuniões pela via eletrônica para juízes de turmas recursais domiciliados em cidades diversas, muitos desses órgãos realizam apenas agora os seus primeiros julgamentos virtuais como forma de prevenção ao novo coronavírus. Outrossim, tribunais de todo o país passam a normatizar e a realizar as suas sessões unicamente no formato virtual.

Reuniões virtuais são feitas pelas unidades judiciárias, entre juízes e servidores, e também pelos diversos setores administrativos dos tribunais. Por sua vez, o canal de atendimento remoto por telefone, e-mail, Skype, WhatsApp e outros meios eletrônicos é colocado à disposição do público externo.

Soma-se a essas iniciativas a disponibilização pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ) da plataforma emergencial de videoconferência para a realização de audiências, sessões de julgamento e reuniões.[3]

Os bons números de produtividade dos tribunais nas primeiras semanas de teletrabalho, em razão da pandemia, revelam as possibilidades, a irreversibilidade e o crescimento do processo de virtualização, que já estava acelerado com a adoção de modelos de computação em nuvem, da Inteligência Artificial (IA), de secretarias de processamento unificado e da aplicação de fluxos de trabalhos automatizados por meio de softwares.

Essa revolução digital faz com que o Poder Judiciário melhore exponencialmente a execução de suas atividades, com ganhos de produtividade e transparência, flexibilizando formalidades e prescindindo de práticas pouco eficazes, otimizando, assim, a tutela jurisdicional.

 

[1]Resolução 313 do Conselho Nacional de Justiça estabelece o regime de plantão extraordinário, no âmbito do Poder Judiciário Nacional. Disponível em: <https://atos.cnj.jus.br/atos/detalhar/3249>. Acesso em: 1º abr. 2020.

[2]No original consta: “Decisions that in normal times could take years of deliberation are passed in a matter of hours. Immature and even dangerous technologies are pressed into service, because the risks of doing nothing are bigger.” Disponível em: <https://www.ft.com/content/19d90308-6858-11ea-a3c9-1fe6fedcca75>. Acesso em: 2 abr. 2020.

[3]Disponível em: <https://www.cnj.jus.br/plataforma-videoconferencia-nacional/>. Acesso em: 1º abr. 2020.

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