Desembargador minimiza coronavírus e diz que tráfico é tratado com "leniência"
2 de abril de 2020, 7h54
Ainda que haja decisão anterior determinando que um dependente químico seja internado e que o próprio Ministério Público tenha recomendado a internação, isso não é o suficiente para que o réu tenha sua liberdade decretada.
O entendimento é do desembargador Xisto Albarelli Rangel Neto, da 3ª Câmara de Direito Criminal do TJ-SP, ao indeferir revogação de prisão preventiva. O réu é acusado de tráfico e associação para o tráfico.
O pedido foi feito com base na Recomendação 62, do Conselho Nacional de Justiça, e no artigo 318 do Código de Processo Penal, que afirma que o juiz poderá substituir a prisão preventiva pela domiciliar quando o agente estiver debilitado por motivo de doença grave.
Segundo a decisão, proferida na última terça-feira (25/3), o fato do acusado tomar remédios para controlar sua dependência não é argumento que faça concluir que ele precise voltar para casa.
“A uma, porque não consta que tais medicamentos — se é que os toma — não possam ser ministrados onde se encontra. A duas porque nada garante que em casa, sem controle, ele venha a tomá-los em vez de se drogar e traficar entorpecentes”, diz a decisão.
O vício do réu é comprovado por laudo médico. O próprio Ministério Público se pronunciou afirmando que o homem deve ser internado.
"Para tanto, requer-se que seja oficiada a Secretaria Municipal de Saúde, para que providencie, inclusive com reforço policial, a condução para a internação em pronto socorro", afirma o MP.
“Simples resfriado”
O magistrado também minimizou a pandemia do novo coronavírus e afirmou que parte da sociedade trata o crime de tráfico de forma branda.
“Chega a ser intrigante ver como a sociedade reage enfaticamente à disseminação de um vírus que supostamente não provoca na maioria dos jovens infectados mais do que os sintomas de um simples resfriado; e a leniência com que espera — ao menos parte dela —, sejam tratados os traficantes de drogas, que disseminam especialmente entre a juventude, a praga indelével do vício e da derrocada física, social e moral”.
Ainda de acordo com a decisão, “se de um lado a necessidade de refrear a disseminação da doença impõe razoavelmente a nós todos, cidadãos de bem, o confinamento domiciliar, por que não aceitar a cautelar segregação de alguns no cárcere para preservar a nossa juventude do aliciamento para a drogadição?”.
Para o magistrado, não há motivo para conceder tratamento diverso ao réu somente por ele ser dependente químico, já que a cautelar tem como objetivo zelar pela ordem pública.
“O vírus liberto é perigoso, e como não dá para prendê-lo, prendemos-nos nós. O traficante livre também é perigoso, mas dele podemos nos ver livres desde que o prendamos ou o mantenhamos presos, ainda que por um período que o faça refletir sobre a gravidade do que fizera”.
053292-65.2020.8.26.0000
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