Cláusulas de barreira

STF pauta julgamento sobre regra sobre acesso a sobras eleitorais para outubro

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20 de setembro de 2019, 21h42

O Plenário do Supremo Tribunal Federal deve começar a julgar no dia 2 de outubro se partidos que não atingiram o número mínimo de votos nas eleições proporcionais podem concorrer às chamadas sobras eleitorais. Estão em pauta embargos contra a denegação do pedido de suspensão da regra, criada pela minirreforma eleitoral de 2017, pelo ministro Marco Aurélio, relator.

José Cruz/ABr
Supremo julga se partidos que não atingiram 10% do quociente eleitoral podem disputar sobras eleitorais
José Cruz/ABr

As sobras eleitorais são as vagas não preenchidas pelo resultado do quociente partidário. Desde 1945, o sistema eleitoral brasileiro é proporcional: as vagas na Câmara dos Deputados são preenchidas por meio de contas de divisão.

Primeiro, o número de votos de obtidos por partido é divido pela quantidade de vagas para se chegar ao quociente eleitoral. Depois, o número de votos de cada partido é divido pelo quociente eleitoral, chegando ao quociente partidário.

Só que essas contas não preenchem todas as 513 cadeiras da Câmara dos Deputados. As vagas não preenchidas são as sobras eleitorais. Desde 1985, eram disputadas pelos partidos que atingissem o número de votos do quociente partidário.

A minirreforma de 2017 também criou uma cláusula de barreira, para que só os partidos que tivessem atingido 10% do quociente eleitoral pudessem ter acesso ao fundo partidário.

Mas a mudança também criou uma atenuante à cláusula e deu nova redação ao parágrafo 2º do artigo 109 do Código Eleitoral. Com a nova redação, todos os partidos, até mesmo os que não atingiram os 10%, podem disputar as sobras.

O Supremo começa a julgar no dia 2 se essa mudança é constitucional. De acordo com o DEM, autor da ação direta de inconstitucionalidade, a nova redação subverte o sistema de representação proporcional do Congresso —e, pior, subverte a cláusula de barreira.

A mudança, diz a petição inicial enviada ao Supremo, “termina por distorcer ainda mais o sistema eleitoral proporcional vigente”. “Isso porque permite que agremiações sem um mínimo razoável de representatividade democrática consigam eleger parlamentares, contribuindo, assim, para a contínua proliferação de agremiações com frágil ou nenhum conteúdo ideológico.”

O ministro Marco Aurélio já negou a liminar monocraticamente. Segundo ele, a arena para discutir os argumentos do DEM é o Congresso, e não o Supremo. De acordo com o ministro, a Constituição não diz qual modelo de proporcionalidade deve funcionar. Portanto, discordâncias quanto ao modelo de representação devem ser resolvidas na política, e não na Justiça, afirmou, na liminar.

"Preservado o núcleo essencial do sistema representativo e proporcional, descabe ao Supremo, em sede liminar, atuar como fonte de direito, observados os limites impostos pela Lei das leis, a Constituição Federal", escreveu o ministro, na decisão, do dia 19 de dezembro de 2018.

Questão numérica
O que está em discussão, na verdade, é o acesso à Câmara. O pedágio de 10% do quociente eleitoral não é a cláusula de barreira “oficial”, de mínimo de 3% dos votos válidos, que passa a valer em 2030. Mas é uma prévia.

De acordo com dados da Câmara, dos 35 partidos que inscreveram candidatos a deputado nas eleições de 2018, 14 ficarão sem receber dinheiro do fundo partidário até as próximas eleições.

“A intenção é inibir os casos em que um candidato com poucos votos seja eleito com a ajuda dos chamados ‘puxadores de votos’ do partido ou da coligação”, diz o site da Câmara que explica as mudanças.

A intenção, portanto, é acabar com o efeito Tiririca (PL-CE): artista sem experiência na vida política, recebeu 1 milhão de votos em 2014 e puxou outros cinco deputados de sua coligação, já que o quociente eleitoral levava em conta os votos da agremiação de partidos e não de cada partido.

Essa é outra matemática que vai acabar em 2020. A Emenda Constitucional 97/2017, que criou a cláusula de barreira “oficial”, proibiu as coligações partidárias a partir de 2020.

Ou seja, cada partido terá de concorrer com seus próprios votos. A depender da decisão do Supremo, a disputa pelas sobras também terá de ser conforme o desempenho de cada um.

Jogo jogado
Na denegação da liminar, no entanto, Marco Aurélio afirma que o DEM, autor da ação, não se opôs à aprovação da minirreforma de 2017 e não houve oposição no Senado ao dispositivo questionado no Supremo.

Mas, segundo o Republicanos (antigo PRB), a própria votação desse trecho da minirreforma foi inconstitucional. O partido foi aceito na ação como terceiro interessado. Em memorial distribuído aos ministros e assinado pelo advogado Israel Nonato, o partido afirma que a mudança no parágrafo 2º não estava na redação original do projeto que deu origem à lei. A nova redação foi proposta pelo deputado Vicente Cândido (PT-SP) e aprovada em votação simbólica pelo Plenário da Câmara.

Isso significa que ela foi aprovada por indicação dos líderes partidários, e não pela maioria dos deputados presentes à sessão. E, para o Republicanos, isso violou o artigo 47 da Constituição Federal, já que não foi possível verificar o quórum, que deveria ser de metade dos deputados.

“Não há estabilidade se um Parlamento não consegue deliberar matérias urgentes para o país, dado o número extravagante de partidos que, sem representatividade mínima de votos, se valem de mecanismos regimentais para atrasar ou mesmo emperrar o funcionamento do Parlamento”, afirma o memorial.

"Não há legitimidade se um Parlamento não consegue o mínimo de consenso na tomada de decisões, uma vez que a fragmentação partidária exige que as negociações das matérias se deem parlamentar por parlamentar, o que atrasa ou mesmo inviabiliza as deliberações essenciais para o país."

ADI 5.497

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