Opinião

Tribunal Superior Eleitoral reverte caso de infidelidade partidária

Autor

16 de setembro de 2019, 9h00

O Recurso 06001503, procedente de Belo Horizonte, voltou a julgamento após pedido de vista na sessão de 4 de junho. O pedido de vista foi feito pelo ministro Alexandre de Moraes após voto do relator, ministro Tarcísio Vieira, negando provimento ao Recurso Especial. O caso trata de ação de perda de mandato eletivo por infidelidade partidária proposta pelo suplente do recorrente, eleito vereador, e julgada procedente pela corte regional.

O vereador alega que sofreu perseguição durante seus dois anos de mandato, principalmente por questão ideológica e religiosa e que pediu uma carta de anuência do partido para que houvesse a justa causa para sua desfiliação. Após a obtenção da carta de anuência, o vereador se desfiliou do partido e se filiou. Logo após, o suplente entra com a ação, pedindo a cassação do mandato do recorrente e sua substituição, afirmando que o advogado do partido não tinha procuração específica para assinar a carta de anuência.

O partido anterior vai a juízo e ratifica integralmente a carta de anuência, afirmando que realmente houve um conflito ideológico, que não tem nada a opor com sua saída e, apesar disso, é decretada a perda do mandato eletivo do Vereador.

Em voto-vista, o ministro Alexandre de Moraes afirma que lhe parece que a decisão do TRE desrespeitou a vontade popular. Há, nessas hipóteses, a necessidade da mínima interferência da Justiça eleitoral, na vontade popular, afastando-se a necessidade exacerbada de uma tutela da justiça eleitoral.

Sustenta que o nosso sistema eleitoral, por cargos proporcionais, é um sistema eleitoral de lista aberta, ou seja, esse parlamentar que obteve a carta de anuência e a concordância de seu partido, obteve mais votos que o seu suplente, por isso, exatamente, que o suplente quer sua cassação. Salvo nos casos realmente graves, que caracterizem de fato a perda do mandato, essa substituição de quem teve mais voto por quem teve menos voto lhe parece uma interferência excessiva e um desrespeito à vontade popular.

A decisão do TRE, a seu ver, também atenta contra os princípios da segurança jurídica e da boa-fé, e, no caso concreto, também ao princípio da igualdade, visto que, na mesma legislatura para qual foi eleito esse candidato, ora recorrente, nove vereadores trocaram de partido justificando a justa causa mediante cartas de anuência, ou seja, dos dez casos com a mesma carta de anuência, a justiça eleitoral admitiu nove, sendo que em um único caso a justiça eleitoral acabou afastando esse vereador.

O ministro defende que há vários argumentos que constam no recurso e na análise dos autos, mas lhe parece que o mais importante é discutir que, se o candidato entende que há incompatibilidade política e o partido entende que há incompatibilidade política, logo, de fato há incompatibilidade política.

Aduz que toda a criação do TSE da resolução da fidelidade partidária e das exceções, como a questão da justa causa, foi baseada no fato de que o candidato ao mandato proporcional se utiliza do partido, mas, mais do que isso, ele se utiliza do quociente eleitoral, e que, por isso, não se aplica a questão da fidelidade partidária aos cargos majoritários.

Senador, governador, presidente e prefeito também se utilizam do fundo partidário, também se utilizam do tempo de horário eleitoral gratuito, mas a votação é majoritária. Em outras palavras, a questão da fidelidade partidária, para o Tribunal Superior Eleitoral e para o STF passou a ser entendida como: aquele que se utilizou do quociente eleitoral não pode sair do partido levando o mandato, sem uma justa causa, e quem deve melhor analisar tal justa causa é o próprio partido que perderá uma vaga na câmara dos vereadores.

A questão formal de não haver procuração específica ao advogado do partido foi sanada pela ratificação pelo presidente do partido. Pelo princípio da boa-fé, aquele candidato acreditou que aquela carta de anuência dada pelo advogado do partido, dentro do partido e depois de conversas com os diligentes do partido, que bastaria. O próprio partido não só não pediu seu mandato como, em juízo, o presidente ratificou a carta, afastando qualquer alegação de invalidade ou fraude na referida carta. A seu modo de ver, seria afrontoso à soberania popular retirar quem teve mais votos para colocar alguém que teve menos voto.

O ministro Tarcísio, reafirmando seu voto, afirma que há a formação crescente do entendimento aqui do tribunal, de que, em muitos casos, essas cartas têm sido fornecidas graciosamente pelo partido e isso, de alguma forma, frustraria a vontade do eleitor que depositou o voto em uma candidatura específica de uma determinada agremiação.

Em seu voto, o ministro Fachin afirma que, no caso concreto, o que está em debate é a questão da validade ou da invalidade da carta de anuência.

Cita o artigo 662 do Código de Direito Civil, que estabelece que “os atos praticados por quem não tenha mandato, ou o tenha sem poderes suficientes, são ineficazes em relação àquele em cujo nome foram praticados, salvo se este os ratificar”. Portanto, nessa hipótese dos autos, na questão específica do valor jurídico da carta de anuência a partir de uma ratificação dos poderes que se operou, entende que, em relação à sua forma, devido à ratificação, a carta é válida.

O tribunal, por maioria, acompanha seu entendimento, dando provimento ao Recurso Especial interposto pelo vereador e revertendo a condenação imposta pelo tribunal regional.

Autores

Tags:

Encontrou um erro? Avise nossa equipe!