Drible no foro

Justiça Federal no PR vê ilegalidade em prova, mas mantém condenação

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11 de setembro de 2019, 8h00

A Justiça Federal no Paraná já reconheceu que parte das provas que basearam condenações ligadas à chamada operação "fidúcia" é de fonte ilegal. E já foi até aberto inquérito para apurar o cometimento de fraude. Mas a sentença condenatória foi mantida no primeiro grau e o Habeas Corpus negado pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região, pelo Superior Tribunal de Justiça e pela ministra Cámen Lúcia, do Supremo Tribunal Federal. Agora, a 2ª Turma do STF é quem irá dizer se a obtenção ilegal de provas anulará a condenação.

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Juíza Gabriela Hardt afirma que havia forte suspeita de fraude na obtenção das provas, mas não anulou sentença condenatóriaReprodução

O caso faz parte de operação deflagrada pela Polícia Federal para investigar fraudes em contratos públicos na área da saúde.

Segundo os advogados que atuam no caso, as condenações se baseiam em grampos no telefone de Fernando Guimarães, conselheiro do Tribunal de Contas do Paraná.

O ponto crítico do caso é que o conselheiro teria sido grampeado sem seu número estar na lista dos autorizados a terem as escutas fixadas. Interceptaram sem autorização, segundo os advogados, e fraudaram os dados do sistema de armazenamento pra ocultar a ilegalidade alterando nos registros o número do conselheiro pra o numero da esposa, que estava interceptado com autorização.

As autorizações de grampo foram concedidas pelo ex-juiz Sergio Moro, hoje ministro da Justiça, a pedido do ex-delegado da PF Márcio Anselmo, hoje chefe da Divisão de Crimes Financeiros do Ministério da Justiça (DFin).

O membro do TCE nem poderia ser grampeado com decisão de juiz de primeiro grau. Conselheiros de tribunais de contas locais têm prerrogativa de foro no STJ, e só lá podem ser investigados.

Nos áudios captados pela PF, foram inclusive registradas conversas entre conselheiros do TCE. 

Os réus foram condenados, segundo a denúncia, por integrar organização criminosa e corrupção. Nos embargos à sentença, o advogado Fábio Tofic Simantob, que representa uma das rés, apontou fortes indícios de que o conselheiro do TCE havia sido grampeado quando o verdadeiro alvo da interceptação era a mulher dela — sem prerrogativa de foro.

Ao julgar os embargos, a juíza Gabriela Hardt, substituta na 13ª Vara Federal de Curitiba, reconheceu que o grampo foi autorizado por autoridade incompetente e tocado por autoridade incompetente. E mandou a PF abrir inquérito para apurar se houve fraude.

"Há forte suspeita de que, no decorrer da medida de interceptação telefônica da operação fidúcia, [o conselheiro] foi interceptado sem autorização judicial, e suas conversas foram registradas no Sistema Guardião como se tivessem sido realizadas a partir do terminal telefônico de sua esposa", afirma Hardt. Ela, no entanto, não deu efeitos infringentes aos embargos e manteve as condenações.

Tofic já recorreu ao TRF-4, ao STJ e à ministra Cármen Lúcia, apenas para ver seus Habeas Corpus negados. Ele agora espera reverter o quadro na 2ª Turma, composta pelos ministros Celso de Mello, Gilmar Mendes, Ricardo Lewandowski e Luiz Edson Fachin, além de Cármen. 

Burla e crime 
No pedido de HC, Tofic afirma que a nota técnica utilizada para condenar sua cliente é um nó em uma cadeia de provas que tiveram boa parte de sua origem em um fato ilegal: o grampo sem autorização de uma autoridade pública. 

O advogado ressalta que a jurisprudência recomenda a anulação de sentença em casos no qual toda a cadeia de provas está contaminada. 

"A certeza do cometimento de fraude por parte dos investigadores que vigora neste momento coloca uma nuvem de suspeita sobre o todo o procedimento de interceptação telefônica, que deve, portanto, ser anulado", afirma o advogado.

Tofic lembra que a suspeita não é apenas uma questão de ilicitude da prova, mas de procedimento manipulado, mediante uso de fraude, para burlar e usurpar a competência do STJ. 

"Os dados e informações de que se dispõe até o momento –não desmentidos por ninguém!– mostram que a investigação e todas as medidas anteriores à denúncia –entre elas a própria interceptação telefônica- foram conduzidas por autoridade incompetente, mas não por mero engano ou negligência. Não! A usurpação ocorreu por meio de fraude, manipulação, adulteração, ou em uma só palavra, com a prática de crime!", afirma. 

Supressão de instância
Ao negar o HC, a ministra Cármen Lúcia afirma que a alegação de usurpação de competência do Superior Tribunal de Justiça foi negada pela própria corte. 

Quanto ao mérito, a ministra diz que o STF não pode julgar fatos que ainda não foram analisados pelas instâncias anteriores, pois isso pode gerar indevida supressão de instâncias. 

HC 174.751
Clique aqui para ler o pedido 

*Texto alterado às 10h38 do dia 11 de setembro de 2019 para correção 

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